Chamada submissão de artigos - V. 6, n. 17 - Jan/abril de 2021 – Dossiê A formação da biblioteca pessoal: efeitos refeitos
A Revista Brasileira de Pesquisa (Auto)Biográfica - RBPAB (ISSN 2525-426X), está recebendo textos para o Dossiê Temático para o ano de 2021, conforme cronograma abaixo:
V. 6, n. 17 - Jan/abril de 2021 – A formação da biblioteca pessoal: efeitos refeitos
Envio do Resumo: até 30 de junho de 2020 – para o e-mail ptr.amparo@gmail.com
Submissão de textos: até 15 de outubro de 2020 – através do Sistema da Revista
Coordenação: Patrícia Aparecida do Amparo (FEUSP) e Denice Barbara Catani (FEUSP)
Falemos da biblioteca. Quis dizer com isso que qualquer leitura é uma leitura comparativa, contato do livro com outros livros. Assim como existe dialogismo e intertextualidade, no sentido que Bakhtin dá ao termo, há dialogismo e intertextualidade da prática da própria leitura. Entretanto, não há nada aqui que seja mensurável. Estamos no campo das hipóteses e do provável. Ler será, portanto, fazer emergir a biblioteca vivida [...][1]
No cerne das atividades escolares, nas histórias de formação individual e coletiva, científica e profissional ou artística, habita a leitura. Que mais não precise ser mencionado aqui para dizer de sua relevância. Lembremo-nos apenas dos embates atuais entre os jovens estudantes (e os nem tão jovens) sobre o prazer ou o tédio que a atividade pode ocasionar. O território dos estudos sobre a leitura é vasto, muito já se falou, investigou e recomendou sobre a questão. Que, por excelência, interessa à maioria das ciências humanas e ocupa posição central para os trabalhos educacionais. Deixemos aos especialistas o domínio das peculiaridades da leitura. Interessa-nos investigar os efeitos da leitura na vida de cada pessoa. A questão não indica a necessidade de se produzirem instrumentos para medições, pois como afirma Jean-Marie Goulemot, não há nada aqui que seja mensurável. Talvez, por isso, o próprio leitor, por meio de suas apropriações, seja a principal referência para que se possa compreender o que resta após o ato da leitura. Esse é o caminho escolhido no Dossiê A formação da biblioteca pessoal: efeitos refeitos de modo a refletir acerca de uma atividade que se tornou central na construção de saberes sobre si e sobre o mundo, sendo estruturante de atividades e ofícios diversos.
Para tanto, recorremos à imagem da biblioteca vivida, ou seja, à dimensão pessoal da construção de bibliotecas. Ao longo da nossa vida de leitores, colecionamos aqueles títulos inesquecíveis, que nos fazem lembrar de situações vividas, processos formativos, entre outros. O importante, assim, será fazer emergir relações pessoais com os livros. Para Chartier[2], uma biblioteca também corresponde a gestos e pensamentos que organizam formas de relação com a cultura escrita. Nesse sentido, buscaremos evidenciar tais indícios e os critérios de seleção que separaram “[...] livros imprescindíveis de se possuir dos que podem (ou devem) ser negligenciados”[3]. Neste Dossiê, considera-se importante acompanhar os crivos que permitem aos sujeitos estabelecerem seus livros imprescindíveis, os conhecimentos a serem retidos e aqueles a serem negligenciados, bem como, interessa-nos perscrutar a natureza desse saber considerado importante, o que se faz ao acompanhar as escolhas, mais ou menos conscientes, que ordenam tal atividade.
Os gestos e os pensamentos que organizam os acervos, públicos e pessoais, dizem respeito à recolha, organização, coleção e hierarquização dos livros. Quando tomamos tais movimentos, consideramos que eles evidenciam as marcas do que caracteriza os sujeitos e, assim, a própria leitura, um exercício de interpretação, faz com que os títulos que compõem o todo da produção literária participem de um acervo privado, individual e, também, afetivo que testemunha uma forma de ver o mundo. Esse ato de interiorização ou de enraizamento dos livros na vida das pessoas, coloca-nos diante da possibilidade de pensarmos a leitura como elo entre a história pública e a história individual enquanto matéria para a constituição de identidades pessoais, profissionais e artísticas. Se, como afirma Antonio Candido[4], a literatura e, diríamos, os livros oferecem uma síntese da experiência humana e, por isso, podem ser compreendidos como uma forma de conhecimento, acompanhar a formação das bibliotecas vividas pode nos possibilitar compreender os gestos e pensamentos que organizam a impregnação dos livros nos sujeitos e destes nos livros.
Como foi assinalado, o território é vasto. Escolhemos, então, impor como limites para o Dossiê, o que pensamos poder interessar aos professores e aos que se preparam para o exercício docente. E nos limites assim definidos pretendemos expor reflexões – percorrendo itinerários diferentes – acerca de modos de pensar que foram se elaborando, no tempo, a propósito da leitura e permeados por leituras. As bibliotecas pessoais, em sentido amplo e livre, serão objeto de atenção e a partilha de referências a alguns clássicos individuais e obedecerá a vontade de mostrar sua potência. E no horizonte das nossas expectativas está a aposta em que as pessoas invistam em reflexões dessa natureza, que julgamos férteis para a educação.
Assim, o Dossiê buscará artigos que apresentem pontos de vista interessados nas posições de leitores e de professores, testemunhos de modos de ler, das ancoragens feitas na literatura (como modo de conhecimento e de constituição pessoal). Gostaríamos de reimaginar relações com o ler e seus objetos, a partir do diálogo com alguns teóricos, desde os momentos inaugurais do aprendizado da leitura até uma reflexão que pode se perguntar hoje sobre nossas bibliotecas vividas, constituídas pelas obras que nos marcaram, lidas em momentos especiais e que fazem frutificar nossos pensamentos e podem conduzir a nossa apreensão da realidade. Vale a pena pensar nos livros que não foram lidos, naqueles que são desejados, mas por qualquer razão são evitados, adiados ou explorados com exagerada timidez. Pensar nas obrigações escolares de leitura ou nos modos profissionais de ler. O que há de especial, por exemplo, nos modos pelos quais os professores universitários lidam com a questão no ensino e na formação de seus alunos? Além disso, destaca-se a configuração de acervos pessoais segundo as possibilidades de acesso aos diferentes títulos e autores que as trajetórias pessoais e profissionais ofereceram a cada um, fazendo surgir as práticas e configurações sociais bem como as formas da leitura que delas fazem parte. Certamente tais perguntas poderiam se multiplicar, se quiséssemos. Assim, esperamos que esse Dossiê nos permita ampliar em mais alguns itens nossa biblioteca de relações com os livros.
[1] GOULEMOT, Jean-Marie. Da leitura como produção de sentidos. IN: CHARTIER, Roger (dir.) Práticas de leitura. São Paulo: Estação Liberdade, 2009, p. 113.
[2] CHARTIER, Roger. A ordem dos livros: leitores, autores e bibliotecas na Europa entre os séculos XIV e XVIII. Brasília: Editora UnB, 1999.
[3] Ibidem, p. 70.
[4] CANDIDO, Antonio. O direito à literatura. IN:______. Vários escritos. São Paulo: Duas cidades; Rio de Janeiro: Ouro sobre azul, 2004.
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