As cotas raciais sob o signo da igualdade (des)racializada: trajetórias do discurso liberal no Brasil
DOI:
https://doi.org/10.35499/tl.v0i3.148Palavras-chave:
Cotas raciais, Discurso jurídico-liberal, Discurso racialista,Resumo
Este artigo apresenta uma reflexão sobre o papel central que o legado liberal de um discurso “de todos e para todos” enunciado por um sujeito-de-direito ocupa na história de constituição dos discursos públicos brasileiros. A investigação das filiações históricas constitutivas deste sujeito deu-se sob a perspectiva teórica da Análise de Discurso, em sua linha peuchetiana. A fim de verificar as relações discursivas entre textos contemporâneos e outros, produzidos no século XIX, o corpus se constituiu por meio do cotejo entre o discurso jurídico-liberal presente em textos atuais sobre as cotas raciais escritos por professores universitários e em trechos de um parecer sobre a emancipação dos escravos escrito por Rui Barbosa. A análise feita evidencia que a construção do discurso republicano acerca da identidade nacional se deu, por um lado, em torno da afirmação do discurso jurídico liberal e, por outro lado, da recusa do discurso do racismo científico. Assim, o posicionamento dos intelectuais brasileiros de adesão ao discurso jurídico indicou, sobremaneira, o comprometimento desse grupo social com a consolidação do projeto republicano e, em consequência, a opção pela igualdade desracializada, cuja regulamentação deveria caber exclusivamente ao Estado. Hoje, quando o sujeito professor universitário se alicerça no silenciamento deste racialismo pseudocientífico para posicionar-se contrário às cotas raciais, ele está fomentando, discursivamente, a continuidade dessa tradição liberalista do discurso acadêmico brasileiro. A (re)afirmação do juridismo e do liberalismo estatal empreendida por esse sujeito indica quão atual e desafiador é o debate sobre a (des)racialização da identidade nacional e suas devidas implicações, afinal, o discurso do racismo científico foi suprimido apenas do espaço acadêmico brasileiro, continuando a fazer efeitos no cotidiano das relações sociais, inclusive no que diz respeito às hierarquias raciais, visto que raça, no âmbito sociológico, é tomada como categoria analítica fundamental para a compreensão da desigualdade social brasileira.
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