O intrincado jogo de rememoração e esquecimento no discurso de Euclides da Cunha sobre a campanha de Canudos
DOI :
https://doi.org/10.30620/pdi.v12n2.p79Mots-clés :
Euclides da Cunha, Os sertões, Campanha de Canudos, Esquecimento, RememoraçãoRésumé
Este ensaio pretende investigar como se processa o entrelaçamento entre rememoração e esquecimento no discurso de Euclides da Cunha sobre a Campanha de Canudos. A visibilidade do conflito na atualidade induz os leitores a acreditarem que o interesse pelo tema manteve-se inalterado desde o ano de 1897, quando as notícias sobre a guerra foram amplamente divulgadas no Brasil e em vários países do mundo. Porém, nos anos posteriores ao acontecimento, tornou-se tendência na imprensa o esforço para esquecer Canudos. Os sertões, lançado cinco anos após o término do conflito, também assume a inscrição de esquecimento. Na “Nota preliminar” ao livro, Euclides da Cunha se refere à Campanha de Canudos como um tema datado, sinalizando ao leitor que seria outro o tema norteador da obra. Porém, no próprio forjamento da escrita, à medida que se apresenta em substituição ao tema primeiro (a campanha nos sertões baianos), o tema segundo (uma discussão racial, completamente datada nos dias contemporâneos) protagoniza seu próprio esquecimento, e a intenção de esquecer o conflito de Canudos se converte numa outra forma de trazê-lo à lembrança. As noções de esquecimento e rememoração aparecem neste estudo conforme perspectiva de Paul Ricoeur, em A memória, a história, o esquecimento. Nesse contexto, também são utilizados como fundamentação teórica os ensaios “Luto e melancolia” e “Recordar, repetir e elaborar”, de Sigmund Freud. A concepção de discurso que orienta o ensaio transita entre as noções de “narrativas maiores” e “fundadores de discursividades” ou “instauradores de discursividade”, ambas de Michel Foucault, nos textos A ordem do discurso e O que é um autor?, respectivamente.
[Recebido em: 20 nov. 2022 – Aceito em: 15 dez. 2022]
Téléchargements
Références
CARRASCOSA, Denise. Pra viver no país das calças bege. Revista Outros Sertões, Salvador, UNEB, n. 4, p. 140-150, dez. 2010.
CUNHA, Euclides da. Correspondência de Euclides da Cunha (1890-1909). Walnice Nogueira Galvão e Oswaldo Galotti (Org.). São Paulo: EDUSP, 1997. 456p.
CUNHA, Euclides da. Os sertões: Campanha de Canudos. Edição, prefácio, cronologia, notas e índices de Leopoldo M. Bernucci. 2. ed. São Paulo: Ateliê Editorial, Imprensa Oficial do Estado, 2002a. 928p. (Clássicos Comentados, I).
CUNHA, Euclides da. Notas à segunda edição. Os sertões: Campanha de Canudos. Edição, prefácio, cronologia, notas e índices de Leopoldo M. Bernucci. 2. ed. São Paulo: Ateliê Editorial, Imprensa Oficial do Estado, 2002b. p. 783-92. (Clássicos Comentados, I).
CUNHA, Euclides da. Nota preliminar. Os sertões: Campanha de Canudos. Edição, prefácio, cronologia, notas e índices de Leopoldo M. Bernucci. 2. ed. São Paulo: Ateliê Editorial, Imprensa Oficial do Estado, 2002c. p. 65-67. (Clássicos Comentados, I).
DIAS, Léa Costa Santana. Euclides da Cunha em terras baianas e amazônicas: impressões de um viajante sobre sertões brasileiros e outros espaços. 2015. 289f. Tese (Doutorado em Literatura e Cultura) – Instituto de Letras / Programa de Pós-Graduação em Literatura e Cultura, Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2015.
FOUCAULT, Michel. A ordem do discurso. Aula inaugural no Collège de France, pronunciada em 2 de dezembro de 1970. Trad. Laura Fraga de Almeida Sampaio. 19. ed. São Paulo: Loyola, 2009a. 80p.
FOUCAULT, Michel. O que é um autor? Trad. António Fernando Cascais e Eduardo Cordeiro. 7. ed. Lisboa: Vega, 2009b. 164p.
FREUD, Sigmund. Luto e melancolia. Introdução ao narcisismo, ensaios de metapsicologia e outros textos. Trad. Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras, 2010a. p. 170-194. (Obras completas, 12).
FREUD, Sigmund. Recordar, repetir e elaborar. Observações psicanalíticas sobre um caso de paranoia relatado em autobiografia (“O caso Schreber”), artigos sobre técnica e outros textos. Trad. Paulo César de Souza. 2. reimp. São Paulo: Cia das Letras, 2010b. p. 193-209. (Obras completas, 10).
GALVÃO, Walnice Nogueira. De sertões e jagunços. Saco de gatos: ensaios críticos. São Paulo: Duas Cidades, Secretaria da Cultura, Ciência e Tecnologia do Estado de São Paulo, 1976. p. 65-85.
LEVINE, Robert M. O sertão prometido: o massacre de Canudos no Nordeste brasileiro. Trad. Monica Dantas. São Paulo: EDUSP, 1995. 400p.
PINHEIRO, Lidiane Santos de Lima. A construção do acontecimento histórico: o discurso do jornal O Estado de S. Paulo sobre a Guerra de Canudos e sobre as comemorações do seu centenário. 2012. 315f. Tese (Doutorado em Comunicação e Cultura Contemporâneas) – Faculdade de Comunicação, Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2012.
RICOEUR, Paul. A memória, a história, o esquecimento. Trad. Alain François. Campinas, São Paulo: UNICAMP, 2007. 536p.
SILVA, José Calasans Brandão da. Canudos não euclidiano. Cartografia de Canudos. Salvador: Secretaria da Cultura e Turismo, Conselho Estadual de Cultura, EGBA, 1997. p. 11-24. (Coleção Memória da Bahia, 5).
VILLA, Marco Antonio. Calasans, um depoimento para a história. Colaboração de José Carlos da Costa Pinheiro. Salvador: UNEB, 1998. 137p.
ZILLY, Berthold. Uma crítica precoce à “globalização” e uma epopéia da literatura universal: Os sertões de Euclides da Cunha, cem anos depois. In: NASCIMENTO, José Leonardo do (Org.). Os sertões de Euclides da Cunha: releituras e diálogos. São Paulo: UNESP, 2002. p. 63-72.
Téléchargements
Publié-e
Comment citer
Numéro
Rubrique
Licence
(c) Tous droits réservés Pontos de Interrogação – Revista de Crítica Cultural 2022
Cette œuvre est protégée sous licence Creative Commons Attribution - Partage dans les Mêmes Conditions 4.0 International.
Autores que publicam nesta revista concordam com o seguinte termo de compromisso:
Assumindo a criação original do texto proposto, declaro conceder à Pontos de Interrogação o direito de primeira publicação, licenciando-o sob a Creative Commons Attribution License, e permitindo sua reprodução em indexadores de conteúdo, bibliotecas virtuais e similares. Em contrapartida, disponho de autorização da revista para assumir contratos adicionais para distribuição não-exclusiva da versão do trabalho publicada, bem como permissão para publicar e distribuí-lo em repositórios ou páginas pessoais após o processo editorial, aumentando, com isso, seu impacto e citação.