O lugar da identidade, da ancestralidade e da mulher negra: tessituras temáticas no conto “Olhos d’água”, de Conceição Evaristo
Palavras-chave:
Conceição Evaristo, Conto, Olhos d’água, Identidade negra, Mulher negra.Resumo
Neste ensaio proponho breves reflexões sobre o lugar da identidade negra, da ancestralidade e da mulher negra que subjazem da produção literária de Conceição Evaristo, especificamente no Conto “Olhos d’água”, da obra homônima desta autora. O conto é um convite a perscrutar tanto a identidade negra quanto a ancestralidade, naquilo que alguns críticos literários chamam de desenraizamento cultural. Contudo, tais reflexões são atravessadas, a todo momento, por considerações acerca do que é ser intelectual, por acreditar que é urgente o engajamento de mais mulheres negras na luta contra o racismo e sexismo que assombram cada vez mais os nossos dias. Assim, pautada em leituras que perpassam por Bell Hooks (2005), Cornel West (1999), Michel Foucault (1979), Nilma Lino Gomes (2010), Patrícia Hill Collins (2016), Stuart Hall (2015), dentre outros, tento problematizar o lugar social da mulher negra no que tange as configurações identitárias negras que a constitui não só no conto em análise, mas também no que constitui a autora enquanto intelectual negra brasileira, uma vez que, por meio da noção de escrevivência, jogo vocabular que traz à cena as noções de escrever, viver e ser, como afirma a autora, fica claro que essa escrita é interpelada por um lugar de mulher negra, uma vez que tanto a condição de gênero quanto a de raça potencializam a escrita dessa intelectual, por se tratar de um lócus, e de uma autoria que carrega tanto as marcas da subjetividade desses lugares de fala, como a especificidade que permeiam tais condições. Assim, o conto aborda de forma literária a dor poética da pobreza, o lirismo transgeracional de mulheres negras, memórias afetivas de infância, e o mistério da cor dos olhos da mãe da protagonista, que precisa se (re)descobrir por meio do retorno às suas origens, a fim de enxergar a si mesma, a sua história, a história da sua filha e assim resgatar sua identidade. Neste ensaio, objetivo fazer um apelo poético a outras mulheres, que como eu, se descobriu negra, tardiamente, e que precisa reinventar novas formas de existir.
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