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Denise Alves Lucena e Doriele Silva Andrade Costa Duvernoy
IMPACTOS EDUCACIONAIS E
SOCIOCULTURAIS NA EDUCAÇÃO
BÁSICA: estudo de caso sobre a
implantação de uma Comissão Própria
de Avaliação
DENISE ALVES LUCENA
Mestre em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Educação PPGE-UPE (2019).
Especialista em Gestão Pública (IFPE, 2013) e em Língua Portuguesa (FAINTVISA, 2009).
Graduada em Letras (UPE, 2007). Professora de Língua Portuguesa da Secretaria Estadual de
Educação de Pernambuco desde 2010. Membro do Grupo de Estudos e Pesquisa em Políticas
Educacionais, Sujeitos, Docência e Currículo (POSDOC) da Universidade de Pernambuco.
Gestora da Escola Estadual Antônio Inácio desde 2014. ORCID: 0000-0002-3354-8633.
E-mail: denisealvesdelucena@gmail.com
DORIELE SILVA ANDRADE COSTA DUVERNOY
Universidade de Pernambuco (UPE). Doutora em Educação (Université Lumière Lyon 2 –
França, 2012) com período sanduíche no PPGE-UFPE. Mestrado em Educação (Université
Lumière Lyon 2, 2008). Graduada em Pedagogia (UFPE, 2005). Professora Adjunta da
Universidade de Pernambuco - UPE. Líder do Grupo de Estudos e Pesquisa em Políticas
Educacionais, Sujeitos, Docência e Currículo (POSDOC). Coordenadora do Programa de Pós-
graduação - Mestrado Prossional em Educação- PPGE-UPE. ORCID: 0000-0002-6984-4012.
E-mail: doriele.andrade@upe.br
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IMPACTOS EDUCACIONAIS E SOCIOCULTURAIS NA EDUCAÇÃO BÁSICA: estudo de caso sobre a
implantação de uma Comissão Própria de Avaliação
IMPACTOS EDUCACIONAIS E SOCIOCULTURAIS NA EDUCAÇÃO BÁSICA: estudo de caso
sobre a implantação de uma Comissão Própria de Avaliação
Este artigo traz uma discussão sobre a qualidade da educação básica, especialmente, dos termos
dimensões, pametros e indicadores, articulados entre si, a partir dos quais se materializam políticas
públicas educacionais para avaliar e monitorar a qualidade da educação escolar. De abordagem qualitativa,
articulando os aspectos teórico-metodológicos da pesquisa ação e de estudo de caso, esta pesquisa teve
como objetivo investigar, a partir da implantação e implementação de uma comissão própria de avaliação
(CPA), os indicadores alternativos propostos pela comunidade escolar para monitorar e avaliar a qualidade
da educação em uma escola da rede estadual de ensino, situada em Feira Nova, através da construção de
quarenta indicadores alternativos e seus respectivos pametros, subdivididos em dez dimensões. Esta
pesquisa não substitui ou desconsidera as avaliações em larga escala, mas possibilita a articulação dos
indicadores próprios de avaliações externas a indicadores alternativos criados pela CPA, para avaliar
a qualidade da educação ofertada pela instituição de ensino em questão. Como resultados obtidos, foi
possível elencar os impactos educacionais e socioculturais oriundos da implantação e implementação
desta CPA.
Palavras-chave: Qualidade da Educação. Avaliação da Educação Básica. Gestão Escolar. Autoavaliação
Institucional. Comissão Própria de Avaliação.
IMPACTOS EDUCATIVOS Y SOCIOCULTURALES EN LA EDUCACIÓN BÁSICA: un estudio
de caso sobre la implementación de un Comité de Evaluación
Este artículo analiza la calidad de la educación básica, especialmente los términos dimensiones, pametros
e indicadores, articulados entre sí, a partir de los cuales se materializan las políticas educativas públicas
para evaluar y monitorear la calidad de la educación escolar. Con un enfoque cualitativo, articulando los
aspectos teóricos y metodológicos de la investigación de acción y el estudio de caso, esta investigación
tuvo como objetivo investigar, desde la implementación y la implementación de un comité de evaluación
propio (CPA), los indicadores alternativos propuestos por la comunidad escolar supervisar y evaluar
la calidad de la educación en una escuela estatal, ubicada en Feira Nova, mediante la construcción de
cuarenta indicadores alternativos y sus respectivos pametros, subdivididos en diez dimensiones.
Esta investigación no reemplaza ni hace caso omiso de las evaluaciones a gran escala, pero permite la
articulación de los indicadores de evaluaciones externas a indicadores alternativos creados por el CPA,
para evaluar la calidad de la educación ofrecida por la institución educativa en cuestión. A medida que se
obtuvieron los resultados, fue posible enumerar los impactos educativos y socioculturales derivados de la
implementación y la implementación de este CPA.
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Denise Alves Lucena e Doriele Silva Andrade Costa Duvernoy
Palabras-clave: Calidad de la educación. Evaluación de educación básica. Gestión escolar. Autoevaluación
institucional. Comité de evaluación propio.
EDUCATIONAL AND SOCIOCULTURAL IMPACTS ON BASIC EDUCATION: a case study on
the implementation of an own Evaluation Committeen
This article discusses the quality of basic education, especially the terms dimensions, parameters and
indicators, articulated among themselves, from which public educational policies materialize to assess
and monitor the quality of school education. With a qualitative approach, articulating the theoretical and
methodological aspects of action research and case study, this research aimed to investigate, from the
implementation and implementation of an own evaluation committee (CPA), the alternative indicators
proposed by the school community for monitor and evaluate the quality of education in a state school,
located in Feira Nova, through the construction of forty alternative indicators and their respective
parameters, subdivided into ten dimensions. This research does not replace or disregard the large-scale
assessments, but it does allow the articulation of the indicators from external assessments to alternative
indicators created by the CPA, to assess the quality of education offered by the educational institution in
question. As results obtained, it was possible to list the educational and socio-cultural impacts arising
from the implementation and implementation of this CPA.
Keywords: Quality of Education. Basic Education Assessment. School management. Institutional Self-
Assessment. Own Evaluation Committee
.
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IMPACTOS EDUCACIONAIS E SOCIOCULTURAIS NA EDUCAÇÃO BÁSICA: estudo de caso sobre a
implantação de uma Comissão Própria de Avaliação
IMPACTOS EDUCACIONAIS E SOCIOCULTURAIS NA
EDUCAÇÃO BÁSICA: estudo de caso sobre a implantação de uma
Comissão Própria de Avaliação
Introdução
Com a implantação e implementação de uma Comissão Própria de Avaliação (CPA) em
uma escola da rede estadual de ensino, pretende-se que a noção de qualidade da educação, desta
instituição de ensino, passe a ter uma ressignicação que vá além dos muros da escola e da mera
transmissão de conteúdo.
Essa ressignicação deve propiciar que a escola seja vista como um espaço de aprendizagem
sintonizado com a comunidade escolar, com o meio em que os sujeitos, que dela fazem parte, pos-
sam construir com autonomia e, em cooperação, com seus conhecimentos e sua própria história.
A nossa atuação na gestão de uma escola da rede estadual de ensino, localizada no muni-
cípio de Feira Nova - PE foi determinante para a escolha do tema e da escola que é o lócus desta
pesquisa, pois nela, compartilhamos os desaos cotidianos de professores, alunos e comunidade
escolar, bem como a possibilidade de sensibilizar e apoiar estes sujeitos a buscarem soluções para
esses desaos que constituem problemas na escola.
Diante disso, acreditamos que a qualidade da educação de uma instituição de ensino está
atrelada aos resultados de avaliações internas e externas, mas que há, também, outros indicadores
educacionais que não são considerados pelas avaliações externas e que podem ser importantes para
melhorar a qualidade da educação ofertada na escola.
Por isso, surge a necessidade de se pensar, junto à comunidade escolar, novos indicadores
educacionais, a m de que os sujeitos deste lócus de pesquisa modiquem a sua realidade a partir
da reexão e ação, comprometidos com a qualidade da educação ofertada à sociedade.
Partindo dessa perspectiva, este texto visa a apresentar a nossa pesquisa, de abordagem
qualitativa e com base na pesquisa-ação cujo objetivo foi investigar, a partir da implantação e
implementação de uma comissão própria de avaliação, os indicadores alternativos propostos pela
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comunidade escolar para monitorar e avaliar a qualidade da educação em uma escola da rede
estadual de ensino, situada em Feira Nova - PE.
Mais especicamente, buscamos discutir sobre o Índice de Desenvolvimento da Educação
Básica de Pernambuco - IDEPE como parâmetro de rendimento dos estudantes em relação aos
resultados desejados e obtidos nas escolas da rede estadual de Pernambuco, sobre as concepções e
os parâmetros da qualidade total, da qualidade social e qualidade negociada da educação; conhecer
a percepção dos sujeitos da pesquisa sobre a avaliação externa, acompanhamento e avaliação da
qualidade da educação realizada pela escola; criar uma CPA que debata e aponte estratégias para
a elaboração de uma proposta alternativa de monitoramento de qualidade em educação na escola;
vericar as articulações possíveis entre os resultados obtidos pelos indicadores do IDEPE e pelos
indicadores próprios, fomentados pela CPA para acompanhamento do desempenho da escola.
No decorrer da pesquisa, levantamos discussões acerca da qualidade total da educação, a
qual visa à eciência (custo-benefício) e à ecácia (resultado), em contrapartida, relacionamos
este tipo à qualidade social e à qualidade negociada. A primeira se caracteriza por ter uma aborda-
gem mais democrática e popular, pois busca a formação humana, o direito à cidadania, ou seja, a
formação integral do ser. A segunda visa ao apoio a processos de mudanças complexas dentro da
escola. Ambas se assemelham ao pressuporem mais um princípio: a efetividade, o qual além de
unir os princípios da eciência e da ecácia, aponta o impacto que as ações de melhoria podem
exercer para transformar a situação existente no âmbito escolar. (MEZOMO, 1997; ZITKOSKI,
1997; HERÉDIA, 1997; DOURADO, 2007; FREITAS, 2005; BONDIOLI, 2005; PERONI, 2006;
MARCHART, 2007; BRASIL, 2010).
Essa discussão nos permite constatar a magnitude do termo qualidade da educação por ser
mais complexo que compreender o sentido de qualidade isoladamente. É por isso que a qualidade
da educação não dever ser vista sob apenas uma perspectiva, ela deve estar relacionada a valores,
tradições, conhecimentos cientícos, contexto histórico, social e econômico, bem como à missão
de cada instituição. Assim, a qualidade da educação deve atrelar, além de resultados de avaliações
externas, a autoavaliação escolar, as vivências intra e extraescolares. Só assim a qualidade da
educação atinge a totalidade do seu signicado.
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IMPACTOS EDUCACIONAIS E SOCIOCULTURAIS NA EDUCAÇÃO BÁSICA: estudo de caso sobre a
implantação de uma Comissão Própria de Avaliação
Logo, esse enfoque faz emergir a qualidade como uma política educacional, já que desenhar
uma política pública que garanta uma educação de qualidade a todos os cidadãos é considerar os
anseios e necessidades dos sujeitos envolvidos no processo educativo.
Com as reformas educacionais na década de 1990, houve um enfoque voltado à melhoria da
qualidade da educação brasileira, visto que muito se discutiu acerca dos problemas de desigualdade
no acesso à escolarização, das elevadas taxas de reprovação, de evasão escolar e, no decorrer dos
anos, essas discussões sobre a qualidade da educação enveredaram por diversos prismas.
Em contraponto à qualidade total, a qualidade social e a qualidade negociada implicam na
negociação entre os sujeitos envolvidos no processo educativo, quando coloca a possibilidade de
participação como direito dos sujeitos para que possam melhorar a própria vida e a do meio onde
vivem.
Assim, considerando o impacto que a centralidade do IDEPE, enquanto diretriz da política
educacional voltada à melhoria da qualidade da educação da rede estadual de ensino do Estado
de Pernambuco, como também a implantação e implementação de uma CPA em uma escola desta
rede de ensino, interrogamo-nos: quais os indicadores alternativos de avaliação e monitoramento
da qualidade da educação emergem a partir da criação de uma CPA na escola? Quais os impactos
poderiam ser observados na escola se os próprios sujeitos da escola elaborassem seus parâmetros
de qualidade para compor uma avaliação própria? Quais as possíveis articulações entre o índice
de desenvolvimento implementado nesta pesquisa-ação e os resultados obtidos no IDEPE?
Essas questões norteadoras oportunizam a construção de indicadores alternativos para ava-
liar e monitorar a qualidade da educação nas escolas, pautada numa perspectiva crítico-reexiva,
através do processo que permitiu a CPA elaborar indicadores de qualidade em educação a partir
de dez dimensões.
Do ponto de vista metodológico, este trabalho seguiu orientação de cunho qualitativo com
base nas orientações de Minayo (2001), Goldenberg (1997) e Duarte (1998), seguindo os princípios
da pesquisa-ação a partir de Fonseca (2002), Thiollent (2011) e Chisté (2016). A investigação foi
realizada por meio de estudo de caso e conduzida pelas concepções de Doley (2002), Latorre et
al. (2003), Yin (2005) e Yacuzzi (2005). A principal técnica de coleta de dados ocorreu através de
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grupo focal (GOMES E BARBOSA, 1999; FLICK, 2002; GONDIM, 2002; GASKELL, 2002).
Como instrumentos complementares à coleta de dados, utilizamos as técnicas de observação
participante e a entrevista semiestruturada (FLICK, 2004) durante os encontros do grupo focal.
Devido ao cotidiano escolar estar intrínseco ao objeto de estudo desta pesquisa, os sujeitos
participantes do grupo focal foram selecionados de forma a representar os segmentos da comuni-
dade escolar, tais como “alunos, professoras (...) tantos outros que “vivem” as escolas”, a m de
“escutar os sujeitos das escolas para, a partir dessa escuta e com eles, fortalecer processos contra
hegemônicos de políticas educacionais cotidianas” (FERRAÇO, 2007, p.03).
Ao propor escutar os sujeitos da escola, para, assim, fortalecer processos contra hegemô-
nicos de políticas educacionais, além da escolha de sujeitos pertencentes à comunidade escolar,
das técnicas utilizadas nas reuniões do grupo focal, emergiram, durante as reuniões, as seguintes
subtemáticas para discussão: qualidade da educação e função social da escola, tipo de resultados
esperados pela escola, pontos positivos e problemas enfrentados na/pela escola e a construção de
novas dimensões para autoavaliação da qualidade da educação.
Os subtemas tornaram-se categorias de análise que, por sua vez, puderam contribuir na
concepção de conceitos pontuais, discutidos ao longo da pesquisa, bem como de dados empíricos
que puderam auxiliar na composição de dimensões, parâmetros e indicadores alternativos.
O Sistema Educacional Brasileiro e a Qualidade da Educação
Antonio Chizzotti (2020), em pesquisa realizada sobre as nalidades dos sistemas de edu-
cação brasileira, analisa a educação escolar através de três nalidades denidas pela Constituição
Brasileira (1988): o pleno desenvolvimento da pessoa, o preparo para o exercício da cidadania
e a qualicação para o trabalho. Na pesquisa, ele discorre sobre o impacto social da educação e
seus efeitos sociais, tanto para a vida do indivíduo-cidadão, quanto para o conjunto da sociedade.
Sob este ponto de vista, a nalidade da escola adentrou ao discurso local e atualizou os
acordos e as divergências sobre os objetivos e as possibilidades atuais da educação nos estados
democráticos em todo o mundo.
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O Estado democrático pressupõe uma escola democrática: uma escola que deve dar a todos
as capacidades intelectuais e éticas necessárias para se formar, como pessoa-cidadã e participar
da vida pública (CHIZZOTTI, 2020, p.10).
Para ele, os sistemas de educação foram profundamente convulsionados pelas novas exigên-
cias sociais e culturais e, por este motivo, tornaram-se objetos de críticas e proposições sobre as
muitas orientações e atividades da escola, que revelam a sobreposição de projetos governamentais,
uma difusão de objetivos e a ausência de consensos sobre as nalidades atuais da educação escolar.
As considerações de Chizzotti (2020) pressupõem que as nalidades do sistema educacional,
na prática, não contemplam as necessidades do estudante, não corroboram com a Constituição
Federal e, por este motivo, a qualidade da educação ca comprometida.
A escola, para Chizzotti (2020, p.10),
(...) não está isenta, nem imune ao seu contexto social. Ela depende das
condições econômicas e políticas do Estado no qual está inserida. Essas
condições são determinantes para alcançar ou limitar o alcance das nalidades,
constitucionalmente expressas do sistema de educação.
Pensar a escola por esse prisma nos leva a considerar que a discussão sobre a nalidade do
sistema educacional é indissociável das discussões sobre a qualidade da educação.
Neste sentido, o sistema educacional brasileiro legitimou-se com a aplicação de avaliações
em larga escala em todo o território nacional, para que houvesse um parâmetro para a qualidade
da educação.
A questão da qualidade da educação está presente na atual Constituição Federal (CF), pela
garantia do padrão de qualidade (Art. 205), indicando a avaliação de qualidade pelo poder públi-
co como condição ao ensino livre à inciativa privada (Art. 209), e pela melhoria da qualidade do
ensino (art. 214). Isso é uma importante conquista, já que a Constituição Federal de 1967, embora
reconhecesse o papel da educação enquanto direito (Art. 168), delimitasse a competência da união
em estabelecer planos nacionais de educação e de saúde, assim como as diretrizes e bases da edu-
cação nacional; (Art. 8°); e que cada ente federativo assegurassem condições de eciência escolar
(art.169), não explicitava o debate sobre qualidade da educação.
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Com a LDB de 1996, a avaliação nacional é atribuída como papel da União, que deve “coletar,
analisar e disseminar informações sobre a educação” e assegurar o processo “[...] em colaboração
com os sistemas de ensino, objetivando a denição de prioridades e a melhoria da qualidade do
ensino” (Art. 9º, V, VI, respectivamente). (COSTA, 2019)
Dessa maneira, as implicações desses sistemas não se limitam a gestão escolar e educacional,
mas alargam as possibilidades do uso dos indicadores tanto para aferir a qualidade da educação
como para responsabilizar quem faz educação.
Dourado (2007), ao utilizar o termo qualidade da educação, elucida que este termo “não
pode ser reduzido à rendimento escolar, nem tomado como referência para o estabelecimento de
mero ranking entre as instituições de ensino.”
Pensar em qualidade da educação meramente como rendimento escolar ou ranqueamento
de instituições de ensino, leva-nos a discutir acerca de três conceitos de qualidade da educação.
Mezomo (1997), a partir das discussões de Crosby (1990), Juran (1990), Deming (1990) e
Donabedian (1991), percebem a qualidade total da educação como um ponto de referência para
os sistemas de avaliações em larga escala por trazer características como esforço, renovação e
inovação; ao passo que Zitkoski (1997) discute a qualidade total da educação como tecnicação
do conhecimento, burocratização do sistema e atroamento da capacidade crítica do ser humano.
Contrapondo a ideia de qualidade total, a qualidade social da educação, discutida por Peroni
(2006) e Dourado (2007), caracteriza-se por ser democrática e popular ao assegurar um processo
pedagógico que vise à melhoria das condições de aprendizagem do educando articulada a melho-
res condições de vida e formação da população. A qualidade social da educação assemelha-se à
qualidade negociada (FREITAS, 2005) por criar compromissos ancorados na comunidade escolar.
Assim, em contraponto à qualidade total, a qualidade social e a negociada implicam na ne-
gociação entre os sujeitos envolvidos no processo educativo, conforme corrobora Dourado (2007)
ao tratar a qualidade social da educação como:
(...) um conjunto de fatores intra e extraescolares que se referem às condições
de vida dos alunos e de suas famílias, ao seu contexto social, cultural e
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IMPACTOS EDUCACIONAIS E SOCIOCULTURAIS NA EDUCAÇÃO BÁSICA: estudo de caso sobre a
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econômico e à própria escola – professores, diretores, projeto pedagógico,
recursos, instalações, estrutura organizacional, ambiente escolar e relações
intersubjetivas no cotidiano escolar. (DOURADO, 2007, p. 941)
Os fatores intra e extraescolares, descritos por Dourado (2007) para garantir uma quali-
dade social da educação, estão intrínsecos às nalidades dos sistemas de educação, descritos na
Constituição Federal (1988) acerca dos sistemas de educação brasileira.
A educação escolar continua sendo um campo de contradições permanentes entre projetos
políticos e projetos de vida. Esse contraste se reete quando notamos que os projetos políticos prio-
rizam os resultados numéricos, já que nas avaliações externas e nos índices educacionais é cobrada
a excelência, enquanto que o projeto de vida, por sua vez, requer, além de resultados de excelência,
o impacto social da educação escolar na vida do estudante. Isso aponta que há predominância da
qualidade total da educação nos projetos políticos e da qualidade social nos projetos de vida.
Logo, é possível pressupor que quando os sistemas de educação obtêm êxito, nem sempre a
qualidade social da educação acontece. Por isso, a necessidade de assegurar uma qualidade social
da educação.
Assim, para assegurar discussões sobre a qualidade da educação na escola, lócus da pes-
quisa, foi necessária a implantação e implementação de uma CPA para que houvesse reexões,
planejamentos, ações e avaliações com vistas a garantir o processo de escuta dos sujeitos envolvidos
na pesquisa. E, em decorrência desse processo, emergem a qualidade negociada e qualidade social
da educação durante o processo de elaboração de uma autoavaliação da unidade escolar com a
nalidade de avaliar a qualidade da educação.
Comissão Própria de Avaliação: um subgrupo do Conselho Escolar de uma
escola da rede estadual de ensino
Em meio aos diversos sistemas de avaliação que existem, atualmente, para todos os níveis e
modalidades de ensino e levando em conta toda a complexidade envolvida no processo de avalia-
ção de uma escola, especialmente, no contexto do IDEB e IDEPE, surge a necessidade da criação
e do desenvolvimento de dispositivos de autoavaliação como proposta para melhorar/garantir a
qualidade da educação das escolas.
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A autoavaliação de uma instituição de ensino da educação básica não se reduz à atribuição
de notas, infraestrutura e atividades extracurriculares e, muito menos, à denição de um diagnós-
tico revelado por números. Uma unidade educacional desenvolve suas atividades norteadas por
uma losoa educacional exposta em sua missão e descritas no seu Projeto Político Pedagógico
(PPP), o qual resulta de um amplo processo de estudo e reexões que vincula e reete o entorno
social, a comunidade escolar.
No estado de Pernambuco, o Art. 2º da Lei nº 11.014 de 28 de dezembro de 1993 dispõe
sobre a criação dos Conselhos Escolares nas Escolas da Rede Estadual de Ensino e indica que
este órgão colegiado tem como nalidade zelar pela qualidade da educação escolar oferecida à
população (inciso II), garantir a articulação da escola com a comunidade (inciso III) e visa a ajustar
as diretrizes e metas estabelecidas pela Secretaria de Educação Cultura e Esportes à realidade da
Escola (inciso VII). (PERNAMBUCO, 1993).
Devido a essas nalidades, o Conselho Escolar é considerado uma instância propícia à cria-
ção de um subgrupo denominado de Comissão Própria de Avaliação (CPA) com a incumbência
de autoavaliar a qualidade da educação da escola com atribuições consultivas, propositivas e de
assessoria sobre matéria de natureza avaliativa.
Assim, a CPA foi composta por professores, estudantes e membros da equipe gestora (es-
colhidos através de eleição, após apresentação ao Conselho Escolar das dimensões criadas pelo
grupo focal, da aprovação da implantação da CPA na escola e da Resolução nº 001/2019), visando
a nortear as atividades da CPA.
Dessa forma, reiteramos que a CPA é um subgrupo subordinado ao Conselho Escolar com
a nalidade promover a reexão-ação por meio de subsídios propiciados pela autoavaliação de
cada dimensão construída, a m de contribuir para o aperfeiçoamento dos processos avaliativos
institucionais e tomada de decisões.
Logo, o objetivo da CPA é criar uma atmosfera para que a comunidade escolar forme, co-
letivamente, uma consciência sobre os indicadores que estão contribuindo para a construção do
presente e do futuro institucional e daqueles que não estão correspondendo ao pleno andamento
das atividades.
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A criação de uma CPA deve ser pautada numa perspectiva social, mas sem, no entanto,
excluir as avalições externas, pois, embora as avaliações externas estejam inseridas na qualidade
total da educação, que é estritamente técnica; a qualidade social se propõe a efetivar avaliações de
cunho técnico, mas também em caráter humano, político, social e de negociação.
É nesse sentido que, ao se propor a implantação e implementação de uma CPA, surge a
necessidade de tecer reexões sobre a qualidade da educação ofertada na escola, por isso, faz-se
necessária a compreensão e aprofundamento dos termos dimensão, indicadores e parâmetros os
quais servirão como subsídios para a composição de indicadores a serem propostos, auferidos e
analisados por membros da CPA e validados pela comunidade escolar.
Para uma melhor compreensão desses termos, iremos discuti-los, a partir do nosso estudo
de caso, sobre a implantação e implementação de uma CPA em uma escola da rede estadual de
ensino, na cidade de Feira Nova, Pernambuco.
Anteriormente à implantação da CPA, nossos sujeitos de pesquisa, participantes do grupo
focal, foram estudantes, professores e membros da equipe gestora, selecionados através de edital pelo
Conselho Escolar da escola. Tiveram como objetivo discutir os resultados das avaliações internas
e externas e suas implicações na qualidade da educação da escolar. Eles puderam reetir também
sobre pontos cruciais à garantia da qualidade da educação da escola da qual fazem parte. Essas
reexões permitiram que os membros da CPA repensassem o signicado dos termos dimensões,
indicadores e parâmetros, os quais ganharam novos contornos nesta pesquisa.
A construção de dimensões para autoavaliação da qualidade da educação pela
CPA de uma escola da rede pública de ensino
A educação como um processo abrangente deve ser observada a partir de várias congurações.
Estas compõem as dimensões do espaço escolar por haver multiplicidade de aspectos que elencam
a estrutura da organização, o planejamento escolar, os sujeitos e as práticas produzidas neste local.
Nesse sentido, a dimensão é uma construção de múltiplos aspectos que podem afetar a vida
dos sujeitos, gerando inclusões, exclusões, conformismos e/ou transformações no âmbito escolar.
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As dimensões, na concepção em que será abordada neste texto, são importantes elementos
da realidade escolar, sejam eles positivos ou negativos, os quais estão suscetíveis aos quatro pontos
do ciclo PDCA (do inglês: Plan + Do + Check + Act).
Para dar conta destes pontos, as dimensões são mensuradas por indicadores e padronizadas
por parâmetros.
Para entendimento da associação entre o ciclo PDCA e a construção de dimensões, indi-
cadores e parâmetros, elaborados tanto por grupos focais (dimensões) e da CPA (indicadores e
parâmetros). Em síntese, apresentamos a gura 1 para compreensão do ciclo DIP (Dimensões,
Indicadores e Parâmetros) que constrói e se reconstrói quando necessário no âmbito educacional.
Figura 1: Ciclo da construção das Dimensões, Indicadores e Parâmetros ou Ciclo DIP
Fonte: Autoras, 2019.
Essas etapas referem-se à construção de cada elemento que está sendo tecido para pôr em
prática a qualidade negociada na educação básica. Inicialmente, há um planejamento de ações, em
seguida, a implantação destas no locus da pesquisa, análises constantes para validação do plane-
jamento e execução das ações estabelecidas e avaliação das etapas anteriores para obtenção dos
resultados esperados. Contribuindo, assim, para que as etapas sejam cíclicas e passíveis de ações
corretivas, caso haja insucesso em alguma etapa.
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implantação de uma Comissão Própria de Avaliação
No grupo focal, que constituiu o nosso estudo de caso, essas dimensões foram apreendidas
tanto por seus aspectos estruturais de ensino-aprendizagem (avaliação interna), quanto a algumas
dimensões da gestão escolar elencadas por Lück (2008) - gestão democrática e participativa de
pessoas; pedagógica; administrativa; da cultura escolar; do cotidiano escolar e de resultados edu-
cacionais - e a enfoques de multiplicidade do itinerário formativo e das interações dos sujeitos,
bem como outros aspectos que podem surgir de acordo com a realidade de cada espaço escolar.
As dimensões possibilitam a organização dos indicadores alternativos construídos pela CPA
por agrupamentos de assuntos/conteúdos ans, mas que primam por um objetivo comum.
Indicadores: da compreensão à concepção
A concepção de indicadores deve ser antecedida de processos participativos que envolvam
a comunidade educacional – estudantes, professores, funcionários e familiares – com vistas a
compartilhar os saberes e as experiências daqueles que vivenciam os espaços, além de incorporar
a reexão sobre o perl pedagógico da instituição, lócus da pesquisa.
Para compor indicadores da educação é necessário basear-se na escuta, no diálogo e na
observação das necessidades e dos interesses expressos pelos sujeitos da comunidade escolar e
transformar esses itens em objetivos pedagógicos que são propícios a mensurar os anseios daquela
instituição de ensino.
Deponti et al. (2002, p. 46), armam que indicador “é um instrumento que permite mensurar
as modicações nas características de um sistema”, ou seja, permite mensurar um sistema a partir
de estabilidade, avanços ou insucessos. As características de um sistema referem-se às dimensões
que estão sendo mensuradas por indicadores.
Lück (2009, p. 58) arma que “o indicador vem a constituir-se no elemento mensurável que
permite concluir que ocorreu um determinado resultado”. O resultado pode ser obtido através da
variação do indicador quando comparado a resultados anteriores.
Logo, as concepções de Deponti et al. (2002) e Lück (2009) se assemelham ao compreende-
rem indicador como um elemento/instrumento mensurável com vistas a variações de um sistema
e/ou resultado.
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A exemplo da concepção defendida por Deponti et al (2002) e Lück (2009) acerca do que
compreendem por indicador, consta nos Parâmetros Nacionais de Qualidade da Educação Infantil
denição semelhante às apresentadas por eles, quando versa que “indicadores presumem a possibi-
lidade de quanticação, servindo, portanto, como instrumento para aferir o nível de aplicabilidade
do parâmetro” (BRASIL, 2006a, p.08)
Bondioli (2004, p.18) esclarece que indicadores são “sinalizações, linhas que indicam um
percurso possível de realização de objetivos compartilhados. (...) aquilo que os diferentes atores
sociais (...) se empenham em buscar”.
Freitas (2005, p.12) compreende que os indicadores:
(...) são importantes mais pela signicação compartilhada que possuem perante
os atores da escola que pelo valor numérico ou de análise que possam gerar. Os
indicadores têm de ser uma construção social que se legitima e se desenvolve
no interior da instituição escolar e têm seu lugar natural no curso da avaliação
institucional, induzida e acompanhada pelas políticas públicas [...] (FREITAS,
2005, p.12)
A concepção de indicadores vai além de ser um elemento/instrumento que mensura algo, o
que o torna tão importante é a forma como são desenvolvidos.
No chão da escola, a construção social e negociada de indicadores, através da partilha de
anseios por melhorias é o que legitima a necessidade de se mensurar o sistema, a política pública,
a instituição escolar.
Jannuzzi (2004, p.15) nos apresenta essa mesma percepção de forma mais elaborada, ao
discorrer que,
Indicador é a medida, em geral, quantitativa dotada de signicado social
substantivo, usado para substituir, quanticar ou operacionalizar um
conceito social abstrato, de interesse teórico (para a pesquisa acadêmica) ou
programático (para a formulação de políticas). É um recurso metodológico
empiricamente referido, que informa algo sobre um aspecto da realidade social
ou sobre mudanças que estão se processando na mesma (JANNUZZI, 2004,
p. 15).
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IMPACTOS EDUCACIONAIS E SOCIOCULTURAIS NA EDUCAÇÃO BÁSICA: estudo de caso sobre a
implantação de uma Comissão Própria de Avaliação
A ideia de mensurar o abstrato faz o indicador se tornar uma ferramenta capaz de modicar/
aprimorar o sistema educacional, quando acompanhado periodicamente, pois ele apresenta aspectos
da realidade e seus impactos. Observados os impactos e as realidades, notar-se-á em que medida
uma meta fora alcançada a partir do resultado do indicador.
Recomenda-se que a cada objetivo ou meta educacional dena o indicador, pelo qual se
vericará a sua realização, isto é, “o elemento observável que permitirá vericar em que medida
o objetivo ou meta foi realizado” (LÜCK, 2009).
Além disso, Freitas (2005, p.14) diz que “é importante frisar que a denição de indicado-
res, apesar das características locais que fortemente explicarão as diculdades ou facilidades de
realização, é estabelecida no conjunto das necessidades e dos compromissos do sistema público
de ensino”.
Para que as dimensões possam agrupar indicadores por anidades e os indicadores possam
ser auferidos é preciso que se tenham parâmetros para validar as ações propostas por cada indica-
dor para que possam ser avaliadas como válidas, insucientes ou inválidas. O parâmetro permite
identicar se o indicador cumpriu a meta estabelecida para determinada dimensão.
Parâmetros de qualidade da educação básica: noção, classicação e formulação
Os indicadores, conforme vimos, servem para mensurar os parâmetros que, por sua vez,
podem ser denidos como a norma, o padrão, ou a variável capaz de modicar, regular, ajustar o
sistema. (HOUAISS e VILLAR, 2001).
Parâmetros podem ser denidos como referência, ponto de partida, ponto de chegada ou
linha de fronteira. Indicadores presumem a possibilidade de quanticação, servindo, portanto, como
instrumento para aferir o nível de aplicabilidade do parâmetro (BRASIL, 2006a).
Parâmetros são sinônimos de padrões de qualidade, enquanto indicadores mensuram a quali-
dade, desde respostas óbvias às mais complexas. Devido a essa complexidade, formular indicadores
e parâmetros que subsidiem a constatação da qualidade da educação ofertada no âmbito escolar só
se torna dedigna quando há a participação dos sujeitos da escola.
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Por reconhecer os atores da comunidade escolar como sujeitos do processo educacional
e como principais usuários do ambiente educacional, é necessário denir parâmetros essenciais
que ofereçam a reexão sobre as necessidades desses sujeitos que podem ter cunho psicológico,
social, intelectual ou ambiental, através da relação harmoniosa com o entorno e da adequação dos
ambientes internos e externos à escola.
Conforme Moreira (1996, p.11),
Os parâmetros constituem instrumento promotor da qualidade do ensino, já
que se pretende que orientem e aperfeiçoem o trabalho pedagógico nas escolas.
Consoante a tal intenção, propõem-se objetivos, conteúdos essenciais, critérios
de avaliação e orientações didáticas.
Logo, a CPA, “ao consolidar os parâmetros, tem como objetivo apontar metas de qualidade
que ajudem o estudante a enfrentar o mundo atual como cidadão participativo, reexivo e autôno-
mo, conhecedor de seus direitos e deveres” (BRASIL, 1997).
O ciclo DIP, apresentado na Figura 1, indicou os passos para a construção de dimensões,
indicadores e parâmetros que nos possibilitaram, durante todo o processo, vericar os impactos
oriundos desse percurso. Esses impactos serão apresentados através das impressões ocasionadas
desde a concepção do grupo focal à implantação e implementação da CPA.
Resultados e Análises: Impactos da implantação e implementação da CPA na
escola
Após a implantação da CPA, na escola, as reexões tecidas permitiram aos membros da
CPA validarem as dimensões criadas pelo grupo focal, ao mesmo tempo em que se vislumbrou a
necessidade de construir indicadores alternativos que abranjam as concepções de Deponti et al.
(2002), Freitas (2005), Bondioli (2004), Jannuzzi (2004) e Lück (2009) e parâmetros, conforme
concepção e objetivos traçados, respectivamente, por Moreira (1996) e BRASIL (1997), que
permitissem aos sujeitos da escola autoavaliar a qualidade da educação ofertada na escola, locus
da pesquisa, a m de garantir o padrão de qualidade da educação, conforme preconizam os art.
205, 209 e 214 da CF.
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IMPACTOS EDUCACIONAIS E SOCIOCULTURAIS NA EDUCAÇÃO BÁSICA: estudo de caso sobre a
implantação de uma Comissão Própria de Avaliação
A problematização da construção de indicadores e parâmetros permitiu respondermos ao
questionamento que norteou a construção desta pesquisa: quais indicadores alternativos de avaliação
e monitoramento da qualidade da educação emergem a partir da criação de uma CPA na escola?
Durante o processo de criação de dimensões, indicadores e parâmetros realizados pela CPA,
utilizamos o passo a passo do ciclo DIP (Figura 1). Isso permitiu aos membros da CPA elaborarem
as dimensões necessárias à autoavaliação da escola, a saber: 1) prática pedagógica e avaliação,
2) multiplicidade de experiência formativa, 3) interações, 4) acesso e permanência dos alunos na
escola, 5) promoção da saúde e integridade do ser, 6) gestão escolar democrática, 7) ambiente físico
escolar, 8) formação e condições de trabalho dos prossionais da escola, 9) ensino-aprendizagem e
10) ambiente educativo, as quais estão diretamente ligados ao IDEPE e, em certo ponto, contribuem
para a melhoria do resultado deste.
A exemplo, temos as dimensões 1, 5, 8 e 9, respectivamente: prática pedagógica e avalia-
ção impacta nos resultados da avaliação do SAEPE e, consequentemente, no resultado do IDEPE,
pois envolve planejamento, monitoramento e avaliação; abandono e permanência do estudante
na escola, essa dimensão traz indicadores essenciais à composição do IDEPE, uma vez que se
refere ao uxo escolar; formação e condições de trabalho prossionais da escola, trata da forma-
ção de professores e a suciência da equipe escolar, pontos cruciais para a denição do IDEPE e
ensino-aprendizagem que contribui signicativamente para a melhoria da prociência do SAEPE
e, consequentemente, do IDEPE.
Esses elementos nos permitem constatar que os quarenta indicadores alternativos de avalia-
ção e monitoramento da qualidade da educação, bem como dos seus respectivos parâmetros, que
emergiram a partir da criação de uma CPA na escola, foram oriundos da necessidade de um novo
olhar sob a qualidade da educação da escola, locus da pesquisa, enfatizando o caráter humano,
político, social da avaliação.
Uma vez criados os indicadores alternativos pela CPA, buscamos vericar as articulações
possíveis entre os resultados obtidos pelos indicadores do IDEPE e pelos indicadores próprios,
fomentados pela CPA, para acompanhamento do desempenho da escola, o que nos permitiu
constatar que, embora os indicadores alternativos, oriundos das discussões da CPA, não estejam
diretamente ligados ao IDEPE, em certo ponto, contribuem para a melhoria do resultado deste.
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Sendo possível, inclusive, apontar os impactos na escola e para os próprios sujeitos envolvidos,
a partir da elaboração dos parâmetros de qualidade que compõem a autoavaliação proposta pela
CPA: a reexão sobre o cotidiano da escola, ampliação de espaços de diálogo e de atuação dos
estudantes, o empoderamento proporcionado tanto ao professor quanto ao estudante, à medida que
todos participavam, contribuíam e eram ouvidos respeitosamente.
A implantação e implementação de uma CPA na escola, permitiu a ressignicação da noção
de qualidade da educação desta instituição de ensino através da compreensão do Ciclo DIP. Na
medida em que as ações do ciclo eram executadas, os sujeitos se apropriavam das variantes do
termo qualidade da educação: qualidade total, qualidade negociada e qualidade social da educação,
segundo as concepções de Mezomo (1997), Zitkoski (1997), Herédia (1997), Dourado (2007),
Freitas (2005), Bondioli (2005), Peroni, (2006), Marchart (2007) e Brasil, (2010).
Esse processo permitiu a elaboração de dimensões, indicadores e parâmetros que resultou
na criação de uma cartilha elaborada pela CPA, com base nos estudos realizados acerca da qua-
lidade da educação, com ênfase na elaboração de indicadores próprios e alternativos para avaliar
a qualidade da educação ofertada pela unidade escolar, localizada no município de Feira Nova
A participação ativa destes sujeitos em atividades que envolvem a coletividade tem sido
o principal impacto social proporcionado por esta pesquisa, repensando, dessa forma, o lócus da
pesquisa como uma escola democrática, segundo pressupõe Chizzotti (2020).
No que concerne às implicações desta pesquisa no âmbito da gestão escolar, podemos
apontar as reexões acerca da qualidade da educação, as avaliações externas e autoavaliação que
podem ocorrer na escola sob diferentes prismas, segundo a concepção que a subsidia: qualidade
total, qualidade social e qualidade negociada.
Promover o desenvolvimento de um olhar mais atento às dinâmicas da escola e às suas
demandas formativas para a promoção de uma educação de qualidade permitiu aos sujeitos
envolvidos nessa pesquisa de se apropriarem de conhecimentos sobre a qualidade da educação,
função social da escola, resultados esperados da escola, dimensões, indicadores e parâmetros de
avaliação e autoavaliação da qualidade da educação, para, assim, subsidiar a criação da Comissão
Própria de Avaliação.
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implantação de uma Comissão Própria de Avaliação
Implantada em 2019, essa CPA continua em atividade e o acompanhamento de sua evolução
pode ainda nos oferecer ricos elementos de reexão.
Considerações Finais
Por ser um espaço dinâmico, a escola deve ser avaliada não apenas com indicadores pré-
-estabelecidos, mas também em situações polissêmicas e incertas. Devem-se levar em conta as
contradições, a pluralidade de pontos de vista, a diversidade dos sujeitos, e, segundo a sociologia,
os elementos estruturais e conjunturais.
Sob esse enfoque, essa discussão consistiu em uma quebra de paradigmas, por vários as-
pectos: inicialmente, porque discorre sobre a qualidade da educação, um tema complexo e com
inúmeras possibilidades de estudo e aplicações que rompem barreias; como também permeia algo
muito presente nas escolas da rede estadual de ensino, o IDEPE (que é tido como o indicador que
elevou o estado de Pernambuco ao patamar nacional de 1º colocado no IDEB) e algo ainda mais
desaador: propor aos sujeitos da escola elaborarem os próprios indicadores e seus respectivos
parâmetros. Isso implica uma abertura da gestão da escola e da Gerência Regional de Educação
(órgão ao qual a escola está jurisdicionada), para o exercício de uma visão de gestão democrática,
proporcionando adesão das ações dentro da escola e, principalmente, incentivar os sujeitos a se
envolverem em propostas inovadoras para promover a qualidade da educação na escola.
Logo, esta pesquisa não propõe substituir ou desconsiderar as avaliações em larga escala,
mas possibilitar a articulação dos indicadores próprios de avaliações externas a indicadores alter-
nativos criados pela CPA, a m de avaliar a qualidade da educação ofertada pela instituição de
ensino em questão.
Portanto, é imprescindível elencar os impactos oriundos da pesquisa durante sua execução:
impacto educacional, impacto propriamente social e o impacto cultural proporcionado por esta
pesquisa. (BOUFLEUER, 2012).
Como impacto educacional observa-se a mobilização da comunidade escolar para a compo-
sição da CPA da escola, percebendo nela a possibilidade de ampliar o espaço de expressão, escuta
e atuação de estudantes, professores e prossionais da educação dentro da escola.
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Como impactos sociais da pesquisa, podemos destacar a formação de recursos humanos ca-
pazes de construir dimensões, indicadores e parâmetros, utilizando a ciência a serviço da educação.
Os impactos culturais podem ser percebidos pela adoção de novas práticas de apropriação
e compartilhamento de signicados sobre avaliação da qualidade da educação, implicando em
práticas culturais que buscam melhorar o impacto da educação escolar na vida do estudante, a
sistematização de conhecimentos que possam contribuir para a melhoria de vida na escola e da
comunidade em seu entorno e a resolução de problemas cotidianos.
Por m, problematizar a função social e politica da escola, através dos mecanismos de ava-
liação, pode ser um valioso instrumento para o aprimoramento da gestão educacional.
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