Ricardo Ducatti Colpas, Eliane Medeiros Borges e Galdino Rodrigues de Souza
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EM DEFESA DAS TECNOLOGIAS DE
INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO
NA EDUCAÇÃO BÁSICA: diálogos em
tempos de pandemia
GALDINO RODRIGUES DE SOUSA
Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Mestre em Educação pela Universidade
Federal de Juiz de Fora (UFJF); Doutorando em Educação Física pela Universidade
Federal do Espírito Santo (UFES); Professor da Faculdade de Educação da
UFJF; Pesquisador vinculado aos grupos EDUCCO; LaboMídia e GEFLIC.
ORCID: 0000-0002-1097-738X. E-mail: galdinorodrigues@yahoo.com.br
ELIANE MEDEIROS BORGES
Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Doutora em Educação pela Universidade
Estadual de Campinas (Unicamp); professora do programa de Pós-graduação em Educação
(UFJF); Coordenadora do Programa de Pós-graduação em Gestão e Avaliação da Educação
Pública e da UAB (UFJF); Líder do grupo EDUCCO. ORCID: 0000-0003-0703-3991.
E-mail: mborges.eliane@gmail.com
RICARDO DUCATTI COLPAS
Universidade Federal de São João Del-Rei (UFSJ). Doutor em Desenvolvimento
Humano e Tecnologias pela Universidade Estadual Paulista (UNESP); Professor do
Departamento de Ciências da Educação Física e Saúde UFSJ; Líder do grupo de Pesquisa
Interdisciplinar e Práticas Pedagógicas em Educação Física. ORCID: 0000-0001-7116-4481.
E-mail: ricardo@ufsj.edu.br
Em defesa das tecnologias de informação e comunicação na educação básica: diálogos em tempos de pandemia
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EM DEFESA DAS TECNOLOGIAS DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO NA EDUCAÇÃO
BÁSICA: diálogos em tempos de pandemia
Este artigo objetiva problematizar algumas medidas emergenciais adotadas na educação básica durante a
crise global do COVID-19. Dizem respeito ao uso das Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC),
excepcionalmente, como ferramentas que possibilitam o ensino a disncia e visam minimizar os impactos
imediatos do fechamento das escolas. Compreende a integração das TIC, como televisão, mídia impressa
e mídia digital, oportuna e pertinente para o momento incerto, visando garantir acesso à educação ao
maior número de estudantes. Essas medidas favorecem, principalmente, aqueles alunos que não possuem
internet em suas residências. Em continuidade, apresenta a metodologia dos Episódios de Aprendizagem
Situados como possível contribuição relevante aos esforços de desenvolvimento de uma “revolução digital
inclusiva” pós-pandemia nas escolas. Essa metodologia aparece como potencialmente capaz de propiciar
processos educativos relacionais entre ambientes formais e informais, com foco na interação, no diálogo e
na pesquisa, por meio da utilização crítica das TIC no ensino e aprendizagem.
Palavras-chave: Educação. TIC. Pandemia.
IN DEFENSE OF INFORMATION AND COMMUNICATION TECHNOLOGIES IN BASIC
EDUCATION: dialogues in times of pandemics
This article aims to discuss and problematize some emergency measures adopted in basic education during
the global crisis of COVID-19. They relate to the use of Information and Communication Technologies
(ICT), exceptionally, as tools that enable distance learning and aim to minimize the immediate impacts
of school closures. It includes the integration of ICT, such as television, print and digital media, which
are timely and relevant to the uncertain moment, aiming to guarantee access to education for the largest
number of students. These measures favor, mainly, those students who do not have access to the internet
in their homes. In continuity, it presents the methodology of Situated Learning Episodes as a possible
relevant contribution to the efforts to develop a post-pandemic “inclusive digital revolution” in schools.
This methodology appears as potentially capable of providing relational educational processes between
formal and informal environments, with a focus on interaction, dialogue and research, through the critical
use of ICT in teaching and learning.
Keywords: Education. ICT. Pandemic.
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EN DEFENSA DE LAS TECNOLOGÍAS DE LA INFORMACIÓN Y LA COMUNICACIÓN EN
LA EDUCACIÓN BÁSICA: diálogos en tiempos de pandemia
Este artículo tiene como objetivo problematizar algunas medidas de emergencia adoptadas en la educación
básica durante la crisis global de COVID-19. Se relacionan con el uso de las Tecnologías de la Información
y la Comunicación (TIC), excepcionalmente, como herramientas que permitan el aprendizaje a distancia
y apuntan a minimizar los impactos inmediatos del cierre de escuelas. Incluye la integración de las TIC,
como la televisión, los medios impresos y digitales, que considera oportuno y relevante para el momento
incierto, con el objetivo de garantizar el acceso a la educación para un mayor número de estudiantes.
Estas medidas favorecen, principalmente, a aquellos estudiantes que no tienen acceso a internet en sus
hogares. En continuidad, presenta la metodología de los episodios de aprendizaje situado como una
posible contribución relevante a los esfuerzos para desarrollar una “revolución digital inclusiva” post-
pandémica en las escuelas. Esta metodología parece potencialmente capaz de proporcionar procesos
educativos relacionales entre entornos formales e informales, con un enfoque en la interacción, el diálogo
y la investigación, a través del uso crítico de las TIC en la enseñanza y el aprendizaje.
Palabras clave: Educación. TIC. Pandemia.
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EM DEFESA DAS TECNOLOGIAS DE INFORMAÇÃO
E COMUNICAÇÃO NA EDUCAÇÃO BÁSICA:
diálogos em tempos de pandemia
Introdução
Com base na mídia-educação, Miranda e Fantin (2018) nos ensinam que os usos das tecno-
logias de informação e comunicação (TIC) nas e pelas escolas devem ser entendidos como pos-
sibilidades de expressão, compreensão do mundo e, igualmente, oportunidade de interação. Para
além da modernização do ensino ou atualização das aulas, essa relação necessariamente envolve
outro tipo de atuação de professores e alunos, em síntese, um entendimento do processo ensino-
-aprendizagem para além da simples transmissão de conteúdo.
Pensamos, nesse processo, a importância do diálogo prévio, apresentando a proposta e suas
potencialidades, inclusive à família, bem como sua importância. Pensamos, também, a impor-
tância de valorização do presencial na educação básica, por mais que as TIC e as competências
tecnológicas sejam importantes no atravessamento desse cenário. Não se trata das TIC superarem
o professor ou o ensino presencial, mas delas potencializarem o papel do professor e o ensino
presencial, bem como o inverso!
O ano de 2020 nos apresentou desaos educativos e sociais que, no nosso entendimento,
devem ser amplamente considerados no que diz respeito aos estudos das TIC e das competências
midiáticas nas escolas. Esses desaos emergem do alastramento do COVID 19 (coronavírus),
que provocou morte, medo e mudanças de hábitos no mundo. No Brasil e na maioria dos países a
quarentena foi adotada como principal medida de combate a esse novo vírus, descoberto no último
dia do ano de 2019 supostamente na China.
1
No nosso país, decretos de calamidade pública foram emitidos ainda no início do ano de
2020 especicando o que permaneceria aberto e o que seria suspenso durante a necessidade de iso-
lamento social. Inicialmente, puderam funcionar apenas estabelecimentos considerados essenciais,
como farmácias e mercados. Posteriormente, houve certa exibilidade, permitindo a reabertura
1 Segundo a Organização Mundial da Saúde a origem do vírus ainda não está denida.
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parcial de atividades comerciais. Para isso foram estipuladas algumas normas de segurança, como
a proibição de aglomerações.
Foram criados canais de denúncia de aglomerações em diversas localidades. Na Paraíba,
além dos números 190 e 193, a população fez uso do aplicativo “SOS cidadão”, que enviava
diretamente às denúncias as forças de segurança locais (APLICATIVO SOS CIDADÃO, 2020).
No município de Viana, no Espírito Santo, e na cidade do Rio de Janeiro as prefeituras criaram
canais de atendimento chamados “disk-aglomeração” via WhatsApp (CORONAVÍRUS, 2020;
PREFEITURA, 2020).
De todos os cenários, o da educação repercute como um dos mais preocupantes e de
difícil solução, uma vez que, majoritariamente, se constrói por aglomerações. Escolas e
universidades foram as primeiras instituições a cancelar suas atividades. A estimativa da
UNESCO (HOW, 2020) para a Educação, datada do nal de abril de 2020, era a de que
o fechamento de instituições de ensino já atingia um total de 1,5 bilhão de estudantes em
191 países.
Frente a esse cenário inesperado, esforços tecnológicos foram adotados no sentido de
transição do aprendizado presencial para o aprendizado on-line de maneira emergencial.
Essas medidas geraram inúmeras repercussões. Uma delas diz respeito às disparidades
econômicas que, por vezes, negam o acesso às novas TIC a uma parcela das camadas
mais pobres. Outra, quanto à diculdade operacional dos professores com as tecnologias.
O objetivo deste artigo é o de problematizar algumas medidas adotadas no sentido
de tentar minimizar os impactos referentes a essa crise global de ensino e aprendizagem
na educação básica via TIC. Alguns governos integraram mídias tradicionais (impressa
e televisão) às mídias digitais (acesso a internet
via celulares e computadores) no sentido
de facilitar e democratizar a continuidade da Educação, principalmente a das comunidades mais
vulneráveis e desfavorecidas.
Feito isso, nos somamos a outra preocupação da UNESCO (STARTING, 2020) neste dramá-
tico momento. A organização tem se preocupado em desenvolver respostas universais e equitativas
no que diz respeito a uma “revolução digital inclusiva”. Tentando humildemente contribuir, temos
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também como objetivo apresentar uma metodologia desenvolvida pelo professor Pier Cesare Ri-
voltella (2013) que pode se somar aos esforços de desenvolvimento de competências midiáticas
autônomas pós-pandemia.
TIC, educação e pandemia
Diante do caótico cenário pandêmico, é fundamental nos posicionarmos desde já a favor do
ensino presencial na educação básica. Isso evita margens para o oportunismo de algumas propostas
empresariais, no caso brasileiro, via grupos educacionais que tem suas ações negociadas na bolsa,
como a “Kroton Educacional” (LEHER, 2020). Só a educação presencial pode, de fato, dar conta
de algumas necessidades educativas especícas, como, por exemplo, o atendimento especial para
os decientes, a garantia da merenda tão importante a inúmeras crianças, a proximidade, a interação
direta, o toque e as práticas corporais com os colegas nas aulas de Educação Física.
Embora tenham existidos diversos esforços visando garantir acesso à educação via TIC
durante a pandemia, agora está mais claro do que antes que o ensino e a aprendizagem não podem
se limitar ao “à distância”, tampouco aos meios on-line. Esse é também o entendimento da dire-
tora geral da UNESCO (STARTING, 2020) Stefania Gianini. Caso limitasse, além do acesso, a
própria diculdade no manuseio das mídias, tanto dos professores quanto de alguns alunos, seria
fator de exclusão.
Todavia, de maneira excepcional, diante da necessidade de isolamento social e da incer-
teza da duração da pandemia, tivemos nas TIC a oportunidade de mitigar o impacto imediato do
fechamento das escolas. Inspirados em Sousa Santos (2020) questionamos: quais os potenciais
medidas poderiam ser tomadas pela educação diante a pandemia do coronavirus na ausência das
TIC? Respondemos: o total abandono dos nossos alunos.
Para a maioria dos governos, pensar alternativas de possibilidades educativas diante da
pandemia foi, na medida do possível, uma das prioridades (COVID-19, 2020). Argentina, Croácia,
China, Chipre, Egito, França, Grécia, Itália, Japão, México, Portugal, República da Coréia, Ará-
bia Saudita, Emirados Árabes Unidos e Estados unidos compõem essa lista segundo a UNESCO
(HOW, 2020).
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A maioria dos países adotou ou ampliou as combinações tecnológicas nesse processo, por
meio principalmente de plataformas on-line, para garantir aprendizagem contínua.
Em quase todos os países, professores e administradores de escolas são
incentivados a usar aplicativos para apoiar a comunicação com alunos e pais,
bem como ministrar aulas ao vivo ou gravar aulas em estilo massivo aberto
on-line (MOOC). O conteúdo do aprendizado também é fornecido pela TV e
outras mídias (HOW, 2020, p. 01)
Assim como Nóvoa (2020) concordamos que a presença da escola se faz mais importante
nos momentos de crise. Nesse momento de isolamento social é fundamental que os professores,
pedagogos, coordenadores e diretores não abandonem seus alunos às suas respectivas sortes.
Caso contrário, podemos fazer uma analogia entre os lhos que crescem sem pai e os alunos que
nos momentos mais difíceis se veem sem o amparo dos educadores. O resultado é que no futuro
ambos, alunos e lhos sem pai, não conarão naqueles que, diante da diculdade, os deixaram.
Todavia, 43% do número total de alunos (cerca de 706 milhões) mantidos fora da sala de aula
pela pandemia do COVID-19 no mundo não têm acesso à internet em casa. Nos países mais pobres
as disparidades aumentam ainda mais, na África Subsaariana, 82% dos alunos não possuem acesso
á internet (STARTING, 2020). Isso torna o ensino a distância digital uma ferramenta que pode
contribuir com o processo de ensino e aprendizagem, contudo, não de maneira a gerar equidade.
Se, para grande parte das escolas privadas, não houve hesitação quanto à alternativa do
trabalho virtual, no que diz respeito às escolas públicas brasileiras, paira, neste momento, uma
grande discussão entre adotar ou não o uso das TIC em atividades remotas no processo educativo
durante o isolamento. Aqueles que são contra alegam, além da falta de preparo de professores e a
eventual exploração de seu trabalho pelo aumento de carga horária, que uma parcela dos alunos,
devido à pobreza, não possui acesso às tecnologias, principalmente àquelas que exigem acesso à
internet. Esses alunos estariam excluídos da possibilidade de acompanhar as atividades a distância
e, inclusive, de serem avaliados sobre as atividades. Há ainda a preocupação dos críticos apoiam a
essa possibilidade, de uma educação conteudista, como eles entendem que costuma ser a educação
a distância.
Por outro lado, os que a utilização das tecnologias, entendem ser essa uma solução plausível,
provisória e única diante o atual cenário de incertezas quanto ao momento de retorno à escola. Que,