Clovis Lisbôa dos Santos Junior e Lícia de Souza Leão Maia
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ATIVIDADE ORIENTADORA DE
ENSINO: uma proposta à produção de
signicados em Geometria
CLOVIS LISBÔA DOS SANTOS JUNIOR
Universidade do Estado da Bahia (UNEB). Doutor em Educação Matemática e Tecnológica
(UFPE). Professor Titular do Curso de Licenciatura em Matemática, Campus X/UNEB.
ORCID: 0000-0003-1693-4484. E-mail: prof.clovislisboa@gmail.com
LÍCIA DE SOUZA LEÃO MAIA
Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Doutora em Sciences de Leducation – Université
de Paris V (Sorbone). Professora do Programa de Pós-graduação em Educação e do Programa
de Pós-graduação em Educação Matemática e Tecnológica. ORCID: 0000-0002-9525-3777.
E-mail: liciaslm@hotmail.com
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Atividade orientadora de ensino: uma proposta à produção de signicados em Geometria
ATIVIDADE ORIENTADORA DE ENSINO: uma proposta à produção
de signicados em Geometria
No presente artigo são apresentados os resultados de uma Atividade de Ensino aplicada futuros professores
de Matemática com a nalidade de analisar a produção de signicados dos participantes acerca do estudo
de conceitos geométricos não euclidianos. A Teoria Histórico-Cultural, complementada pela Teoria da
Atividade e a Atividade Orientadora de Ensino são os aportes teóricos que subsidiaram a investigação
e as ações pedagógicas neste estudo. Assim, apoiamo-nos nos pressupostos teórico-metodológicos da
Atividade Orientadora de Ensino como um desdobramento da perspectiva Histórico-Cultural, segundo a
qual utilizamos como contexto para a negociação de signicados entre os participantes. As informações
foram captadas por meio da aplicação de uma proposta de intervenção envolvendo 15 licenciandos do
curso de Matemática da Universidade do Estado da Bahia. Para a construção dos dados obtidos nesse
estudo utilizamos os seguintes instrumentos: áudio gravações, Atividade de Ensino, diário de campo
e relatórios individuais. O processo de internalização dos conceitos geométricos foi apreendido e
analisado, utilizando-se como pressupostos duas categorias: o Conito da validade lógica à validade
empírica; e a Ruptura – do espaço euclidiano para outros espaços, constituídas por meio das interões
entre os participantes. Os participantes ao estudarem modelos geométricos não euclidianos atribuíram
signicados diferenciados para o conceito da soma de ângulos internos de um trngulo, ampliando assim,
a compreensão desse conceito quando constituídos no modelo geométrico euclidiano. Concluímos que o
estudo de diferentes modelos geométricos, na perspectiva da Atividade Orientadora de Ensino, promoveu
o desenvolvimento do pensamento teórico dos licenciandos investigados tornando-se um caminho para a
produção de signicados no processo de ensino e aprendizagem da Geometria.
Palavras-chave: Atividade Orientadora de Ensino. Formação de professores. Geometrias não Euclidianas.
TEACHING GUIDANCE ACTIVITY: a proposal for the production of meanings in Geometry
In the present article the results of a Teaching Activity applied to future Mathematics, teachers presented
in order to analyze the production of meanings of the participants about the study of non-Euclidean
Geometric concepts. The Historical-Cultural Theory, complemented by the Activity Theory and the
Teaching Guiding Activity are the theoretical contributions that supported the investigation and the
pedagogical actions in this study. Thus, we rely on the theoretical and methodological assumptions of
the Teaching Guidance Activity as an unfolding of the Historical-Cultural perspective, according to
which we use it as a context for the negotiation of meanings between the participants. The information
captured through the application of an intervention proposal involving 15 undergraduate students in the
Mathematics course at the University of the State of Bahia. For the construction of the data obtained
in this study, we used the following instruments: audio recordings, Teaching Activity, eld diary and
individual reports. The internalization process of geometric concepts captured and analyzed, using two
categories as assumptions: Conict - from logical validity to empirical validity; and the Rupture - from
the Euclidean space to other spaces, constituted through the interactions between the participants. When
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studying non-Euclidean geometric models, the participants attributed different meanings to the concept
of the sum of the internal angles of a triangle, thus expanding the understanding of this concept when
constituted in the Euclidean geometric model. We conclude that the study of different geometric models,
in the perspective of the Teaching Guidance Activity, promoted the development of the theoretical thinking
of the undergraduates investigated, becoming a path for the production of meanings in the teaching and
learning process of Geometry.
Keywords: Teaching Guiding Activity. Teacher training. Non-Euclidean geometries.
ACTIVIDAD DE ORIENTACIÓN DOCENTE: una propuesta para la producción
de signicados en Geometría
En el presente artículo, se presentan los resultados de una Actividad de enseñanza aplicada a futuros
maestros de Matemáticas para analizar la producción de signicados por los participantes sobre el
estudio de conceptos geométricos no euclidianos. La Teoría Histórico-Cultural, complementada por la
Teoría de la Actividad y la Actividad de Orientación Docente, son los aportes teóricos que subsidiaron la
investigación y las acciones pedagógicas en este estudio. Por lo tanto, conamos en los supuestos teóricos
y metodológicos de la actividad de orientación docente como un desarrollo de la perspectiva histórico-
cultural, según la cual lo usamos como contexto para la negociación de signicados entre los participantes.
La información fue capturada mediante la aplicación de una propuesta de intervención que involucró a
15 estudiantes de pregrado en el curso de Matemáticas de la Universidad del Estado de Bahía. Para la
construcción de los datos obtenidos en este estudio, utilizamos los siguientes instrumentos: grabaciones
de audio, actividad docente, diario de campo e informes individuales. El proceso de internalización de
conceptos geométricos fue arrestado y analizado, utilizando dos categorías como supuestos: Conicto: de
la validez lógica a la validez empírica; y la ruptura - del espacio euclidiano a otros espacios, constituido
a través de las interacciones entre los participantes. Al estudiar modelos geométricos no euclidianos, los
participantes atribuyeron diferentes signicados al concepto de la suma de los ángulos internos de un
triángulo, expandiendo así la comprensión de este concepto cuando se constituyó en el modelo geométrico
euclidiano. Concluimos que el estudio de diferentes modelos geométricos, en la perspectiva de la Actividad
de Orientación Docente, promovió el desarrollo del pensamiento teórico de los estudiantes universitarios
investigados, convirtiéndose en un camino para la producción de signicados en el proceso de enseñanza
y aprendizaje de la Geometría.
Palabras clave: Actividad de Orientación Docente. Formación de profesores. Geometrías no Euclidianas.
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Atividade orientadora de ensino: uma proposta à produção de signicados em Geometria
ATIVIDADE ORIENTADORA DE ENSINO: uma proposta à
produção de signicados em Geometria
Introdução
A escola é o principal mecanismo social responsável por aproximar os indivíduos com os
objetos do mundo através da relação entre indivíduos, ou seja, o papel da escola é oportunizar, por
meio da comunicação entre os indivíduos, a apropriação dos conhecimentos produzidos pelo homem.
No campo educacional, a apropriação dos conhecimentos cientícos surge como um desao
para os prossionais envolvidos no processo de escolarização. Nessa perspectiva, Vygotsky (1987,
p. 101) ressalta a importância da mediação para o processo de escolarização dos indivíduos ao
colocar que “[...] o aprendizado adequadamente organizado resulta em desenvolvimento mental e
põe em movimento vários processos de desenvolvimento que, de outra forma, seriam impossíveis
de acontecer”.
Ao pensarmos num processo de aprendizagem adequadamente organizado, é inevitável a
associação do professor como agente principal do processo de escolarização, pois a sua atividade
essencial está diretamente interligada à dos estudantes, que consiste na organização do ensino.
Em outros termos, a função primordial do professor é organizar o ensino tendo em vista que os
estudantes se apropriem dos conhecimentos produzidos historicamente pela humanidade.
Assim, o presente trabalho busca tecer reexões acerca dos desaos relacionados ao desen-
volvimento do conhecimento geométrico a partir da análise de signicados produzidos por futuros
professores de Matemática sobre o estudo de Geometrias não Euclidianas. Para tanto, apoiamo-nos
nos pressupostos teórico-metodológicos da Atividade Orientadora de Ensino proposta por Moura
(1996) como um desdobramento da perspectiva Histórico-Cultural (Vygotsky, 1987), segundo a
qual utilizamos para organizar as ações pedagógicas durante a aplicação de uma proposta de in-
tervenção almejando a negociação de signicados entre os participantes da pesquisa.
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Alguns Pressupostos Teóricos
Este subtítulo tem como propósito apresentar os aportes teóricos da Teoria Histórico-
-Cultural (THC), Teoria da Atividade (TA) e dos pressupostos teórico-metodológicos da Ati-
vidade Orientadora de Ensino (AOE), para a elaboração da proposta de intervenção em que,
sinteticamente, o planejamento das estratégias foram desenvolvidas considerando mediações
pedagógicas em que sua orientação–execução–controle fossem base para a formação de concei-
tos sobre diferentes modelos geométricos. Assim, buscamos auxiliar os futuros professores de
Matemática a procurarem uma consonância entre os seus motivos e necessidades em relação a
apropriação do objeto em estudo. Para tanto, escolhemos alguns aspectos a serem desenvolvidos
durante a proposta de intervenção:
Caracterização dos futuros professores de Matemática em relação ao conhecimento da
pluralidade de modelos geométricos (questionário diagnóstico);
Elaboração de instrumentos pedagógicos para formação de conceitos geométricos (Ati-
vidade de Ensino e material manipulativo);
• Elaboração de atividades em grupo e individual;
• Utilização de signos e instrumentos variados nas orientações escritas e orais;
• Mediação entre professor-formador e participantes e entre os participantes;
Elaboração de atividades com foco na generalização do conhecimento geométrico em
estudo (níveis de aprofundamento).
A intenção ao desenvolver essas estratégias foi de buscar transformar a realidade dos par-
ticipantes envolvidos neste processo de formação, a partir de instrumentos pedagógicos que lhes
possibilitem a apropriação de diferentes modelos geométricos, por meio de interações promovidas
pelo diálogo, com o intuito de ampliar a compreensão de conceitos geométricos euclidianos e
não euclidianos. Portanto, a ação age como mola propulsora da prática, que por sua vez constrói
conhecimento e alcança seu ápice na transformação do saber dos participantes no processo.
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Atividade orientadora de ensino: uma proposta à produção de signicados em Geometria
A organização do ensino do ponto de vista da AOE coloca a aprendizagem em uma posição
de destaque na atividade – ensino, pois tanto o professor, quanto os estudantes estarão mobilizados
para a apropriação de conhecimentos. A AOE torna-se a unidade de formação entre professor e
alunos, pois o professor ao organizar o processo de ensinar, também, qualica seus conhecimentos,
produzindo novos sentidos e signicados para o desenvolvimento de práticas pedagógicas dife-
renciadas, que podem gerar e promover a atividade do estudante: estudar e aprender teoricamente
sobre a realidade (MOURA ET AL, 2010).
Assim, para que a AOE se torne uma unidade de formação entre professor e alunos, se faz
necessário estabelecer uma correspondência de modo que os motivos, intenções, objetivos, ações
e condições possam se relacionar de maneira processual na realização da atividade pedagógica.
Nessa perspectiva, o participante ao se apropriar do conhecimento teórico sobre os diferentes
modelos geométricos passa a ter condição de atribuir novos signicados para os conceitos geo-
métricos internalizados sobre a realidade em que vive, ampliando e modicando os seus modos
de interagir com a realidade que lhe é sensível, o que “[...] permite a ele transformar a forma e o
conteúdo do seu pensamento” (ROSA ET AL., 2010, p. 67).
Lopes e Vaz (2014), apontam que a relação estabelecida entre AOE e o conceito de atividade
proposto por Leontiev (1978), está alicerçada na natureza da atividade humana como fonte geral
do desenvolvimento das funções psicológicas superiores. Assim, a tríade defendida pela Teoria
Histórico-Cultural está presente nessa relação, na qual “[...] temos um sujeito histórico (aluno),
um objeto social (determinado conhecimento/conceito/conteúdo) e uma mediação cultural – o
professor, seus saberes, produção cultural, a organização do ensino” (ARAÚJO, 2003, p. 28).
Para Daniels (2003) o objetivo dos teóricos da atividade é analisar os impactos
psicológicos da atividade organizada, considerando as condições e sistemas gerados em
e por tal atividade. Assim, a atividade social prática se torna unidade de análise para o
desenvolvimento da consciência.
Dessa maneira, Leontiev (1988, p. 68) no contexto da TA dene a atividade da
seguinte forma:
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[...] aqueles processos que, realizando as relações do homem com o mundo,
satisfazem uma necessidade especial correspondente a ele [...]. Por atividade,
designamos os processos psicologicamente caracterizados por aquilo a que o
processo, como um todo, se dirige (seu objeto), coincidindo sempre com o
objeto que estimula o sujeito a executar esta atividade, isto é, o motivo.
Moura et alli. (2010) coloca que a TA pode fundamentar o trabalho do professor na organi-
zação do ensino, ao passo que se trata de uma ação que deve estar voltada intencionalmente para
a apropriação de conhecimentos produzidos historicamente, concretizando, assim, os objetivos
sociais do currículo escolar. A organização do ensino é considerada como atividade na concepção
dos autores por implicar que o professor deve denir ações (que considerem as condições objetivas
da escola), eleger instrumentos (processos de mediação dos sujeitos com os objetos), avaliar o pro-
cesso de ensino e aprendizagem (objetivos relacionados ao ensinar e aprender) e por m, constatar
a apropriação dos conhecimentos historicamente acumulados pelos discentes (necessidade/motivo).
Com base nos pressupostos da TA, Moura (2010) desvela que a atividade ensino do pro-
fessor deve produzir e promover a atividade do estudante. O envolvimento do professor com sua
atividade ensino pode auxiliá-lo a tomar consciência de seu próprio trabalho e de seu objeto de
ensino, o produto do processo de construção do saber será transformado em objeto de aprendi-
zagem para os estudantes. Assim, na organização do ensino, o professor também exerce ações
que promovem os conhecimentos teóricos em jogo, tornando-os em objeto e necessidade de sua
atividade de aprendizagem, o que simultaneamente cria no estudante a necessidade de se apropriar
do conceito em questão.
Na conuência com as teorias apresentadas até aqui recorremos ao princípio histórico-cultural
da atividade como mecanismo teórico-metodológico para problematizar a prática pedagógica e,
consequentemente, atribuir signicados à atividade ensino, tendo como unidade de investigação
inicial a necessidade de organizar o trabalho pedagógico de “[...] maneira que os sujeitos interajam
entre si e com o objeto de conhecimento” (MOURA, 2002, p. 159).
Moura (2002) dene o ensino como uma atividade que deve envolver o aluno num processo
reexivo a partir da vivência de situações-problema que produzam a necessidade do desenvolvi-
mento de signicados próprios do conceito em jogo. Para o autor (2002, p. 155) uma AOE pode
ser denida como:
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Atividade orientadora de ensino: uma proposta à produção de signicados em Geometria
[...] aquela que se estrutura de modo a permitir que sujeitos interajam,
mediados por um conteúdo, negociando signicados, com o objetivo de
solucionar coletivamente uma situação-problema. É atividade orientadora
porque dene elementos essenciais da ação educativa e respeita a dinâmica
das interações que nem sempre chegam a resultados esperados pelo professor.
Este estabelece os objetivos, dene as ações e elege os instrumentos auxiliares
de ensino, porém não detém todo o processo, justamente porque aceita que os
sujeitos em interação partilhem signicados que se modicam diante do objeto
de conhecimento em discussão.
Logo, no coração da AOE encontra-se a situação problema como aspecto desencadeador da
necessidade que levou o homem à construção de determinado conceito, promovendo o comparti-
lhamento de signicados e experiências entre os estudantes, num ambiente que busca, de forma
coletiva, as soluções para a situação-problema, na qual possibilita a troca e a produção de conhe-
cimentos entre os envolvidos no dinâmico processo de ensino e aprendizagem. Assim, a AOE se
congura por meio da intencionalidade do educador ao articular instrumentos e estratégias que
permitirão a produção de signicados dos sujeitos com o objeto de conhecimento (MOURA, 1996).
Nessa perspectiva, Moura (1996; 2010) pontua três aspectos imprescindíveis para estrutura
da AOE: a síntese histórica do conceito que possibilita o professor apropriar-se do aspecto peda-
gógico da história do conceito; a situação-problema ou a situação desencadeadora de aprendiza-
gem que deve contemplar a gênese do conceito e pode ser materializada de maneiras diferentes,
na qual apresenta três recursos metodológicos: os jogos, as situações que emergem do cotidiano
e a história virtual do conceito; a síntese coletiva que é a solução “matematicamente correta” da
situação-problema desenvolvida pelos estudantes em coletividade.
No viés das concepções trazidas, o presente estudo centra-se na formação inicial de profes-
sores de Matemática, compreendendo a importância da problematização das ações pedagógicas
do professor, uma vez que busca por meio de situações de vivência e exploração de Atividades
de Ensino desenvolver as funções psíquicas dos estudantes, futuros professores de Matemática,
acerca do estudo de Geometrias não Euclidianas como uma maneira de ampliar os conhecimentos
no campo geométrico e, consequentemente, ressignicar o ensino de Geometria.
A seguir, iremos analisar os elementos estruturantes da AOE na perspectiva de compreen-
der melhor as suas peculiaridades, bem como, as suas possíveis contribuições para o processo de
formação de futuros professores de Matemática.
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Síntese histórica do conceito
Para compreender o lugar que ocupa o conhecimento histórico na AOE, recorremos aos
dizeres de Nascimento (2010) tendo-a como base teórica de pesquisa, por se apoiar nos pilares
teóricos da TA, isto é, ao pensar a organização do ensino enquanto atividade e, consequentemen-
te, como objeto de pesquisa. É considerada também, como base metodológica ao se constituir
como instrumento lógico-histórico para a organização dos conhecimentos no processo de ensino
e aprendizagem.
Para Moura et al. (2010), a situação-problema ou a situação desencadeadora de aprendizagem
deve ser constituída da essência do conhecimento em questão, relacionando-a ao modo “[...] como
foram aparecendo os problemas e as necessidades humanas em determinada atividade e como os
homens foram elaborando as soluções ou sínteses no seu movimento lógico-histórico” (MOURA
ET AL., 2010, p. 103-104).
Moretti (2007, p. 97) ressalta a importância do movimento lógico-histórico para a construção
teórica do conhecimento ao aduzir que:
[...] compreender a essência das necessidades que moveram a humanidade na
busca de soluções que possibilitaram a construção social dos conceitos é parte
do movimento de compreensão do próprio conceito. Assim, o aspecto histórico
associa-se ao aspecto lógico no processo de conhecimento de um determinado
objeto de estudo e é só nessa unidade dialética que o conhecimento desse
objeto é possível.
Desse modo, a história do conceito deve permear a organização das ações do professor,
principalmente o que ensina Matemática, de maneira que possa propor aos seus estudantes pro-
blemas desencadeadores que contenham em si a essência do conceito. Segundo Kopnin (1978,
p. 186) a unidade entre o lógico e o histórico do conceito para a compreensão do conceito faz-se
necessária uma vez que o “[...] lógico reete não só a história do próprio objeto como também a
história do seu conhecimento”.
Nesse entendimento, Moura (1996) compreende a importância do movimento lógico-his-
tórico para a formação de conceitos pelo indivíduo, inserindo essa perspectiva metodológica de
produção de sentidos e signicados acerca de determinado objeto como elemento inicial da AOE.
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Atividade orientadora de ensino: uma proposta à produção de signicados em Geometria
Então, na organização do ensino, o autor propõe que o movimento lógico-histórico se constitui na
perspectiva da AOE pela realização da síntese histórica do conceito, que possibilita o professor
apropriar-se do movimento lógico-histórico de constituição do conceito a ser trabalhado em sala
de aula e, consequentemente, ter uma visão dinâmica de sua construção, compreendendo também
as necessidades sociais de sua produção.
Para Moura (1996), esse elemento contribuirá para que o professor possa elaborar a situ-
ação desencadeadora de aprendizagem da AOE. É na compreensão da essência do conceito que
o professor encontrará a autonomia necessária para estabelecer relações sociais para a criação e
a solução de problemas. A síntese histórica do conceito, na perspectiva aqui apresentada, pode
corroborar para a prática docente ao criar condições para o professor assumir a posição de autoria
na construção do conhecimento, potencializando as suas ações ao planejar, executar e avaliar as
atividades de ensino.
Nessa perspectiva, assumimos a síntese histórica do conceito como um recurso indispensável
para a organização e desenvolvimento de ações metodológicas da AOE, que orientou, no caso deste
estudo, as nossas investigações acerca do estudo de Geometrias não Euclidianas na formação de
futuros professores de Matemática e suas implicações pedagógicas para a prática docente.
Situação desencadeadora de aprendizagem
Na perspectiva histórico-cultural, o problema surge no processo de ensino e aprendizagem
no sentido de provocar a elaboração de situações-problema de aprendizagem que embutam em si
a necessidade do conceito. Para Saviani (2000, p. 21), a constituição de um problema está intrin-
sicamente ligado a sua necessidade, assim
A essência do problema é a necessidade. [...] Assim, uma questão, em si, não
caracteriza o problema, nem mesmo aquela cuja resposta é desconhecida; mas
uma questão cuja resposta se desconhece e se necessita conhecer, eis aí um
problema. Algo que eu não sei não é problema; mas quando eu ignoro alguma
coisa que eu preciso saber eis-me, então, diante de um problema.
Moretti (2014) em consonância com as ideias de Saviani (2000) propõe que a situação-pro-
blema prediz uma primeira aproximação do estudante com o objeto de saber, na qual o problema
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designa processos que satisfazem a sua necessidade, criando condições para que o sujeito que aprende
se aproprie do conhecimento historicamente construído pelo homem, humanizando-se.
Pelo contextualizado, ao pensarmos na organização do ensino, o professor de Matemática
tem como desao propor problemas que coloquem para os estudantes situações desencadeadoras de
aprendizagem que ao serem resolvidas pelos mesmos provoquem a apropriação e a objetivação dos
elementos essenciais do conhecimento que se pretende ensinar.
Moura (1996) defende à necessidade de o professor realizar a síntese histórica do conceito
como um caminho para superar o desao imposto ao docente de propor problemas que realmente
se constituam em situações desencadeadoras de aprendizagem. Nesse sentido, o professor visando
uma aprendizagem signicativa dos conceitos que quer ensinar deve partir de situações-problemas
que sejam signicativas para o estudante, podendo ser materializadas por meio de diferentes recur-
sos metodológicos, dentre os quais se encontram os jogos, as situações emergentes do cotidiano e a
história virtual do conceito.
Para melhor compreender os recursos propostos por Moura (1996), nos apoiamos na sistema-
tização proposta por Vaz (2013, p. 39).
Figura 1 - Recursos da Atividade Prientadora de Ensino
Fonte: Vaz (2013).
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A nalidade principal das situações desencadeadoras de aprendizagem consiste em envolver
o estudante na busca da solução de um determinado problema, de modo a satisfazer uma determi-
nada necessidade, que pode justicar a sua produção em certo momento histórico da humanidade.
Síntese coletiva
A síntese coletiva se congura como a última ação proposta pela AOE, em que a solução
da situação-problema deve ser elaborada pelos estudantes coletivamente. Dessa maneira, pensan-
do na organização do ensino, cabe ao professor elaborar atividades de ensino que imbriquem os
estudantes num processo de busca coletiva da solução.
Segundo Moysés (1997) os estudos por meio de atividade compartilhada ou atividade grupal
se inserem, principalmente, em duas linhas de pesquisas:
[...] a dos que procuram saber de que maneira as formas coletivas de organização
das atividades de aprendizagem contribuem para o desenvolvimento das
funções mentais superiores, e a dos que, ao analisá-las, se preocupam mais em
saber de que forma elas favorecem à aquisição de conhecimento (MOYSÉS,
1997, p. 57).
O compartilhamento de ações e ideias entre os indivíduos se caracteriza no terceiro elemento
da AOE, na qual Moura (1996) denomina de síntese coletiva, que tem a nalidade de encontrar
a solução “matematicamente correta” da situação desencadeadora de aprendizagem elaborada em
coletividade pelos estudantes.
Pozebon et al. (2013, p. 5) reete na aplicabilidade auferida através da mediação do professor
pela síntese coletiva quando esta é desenvolvida pelos estudantes trazendo efetivas ponderações
acerca da mesma , perebendo que:
[...] a turma deverá chegar a uma resposta comum a todos e “matematicamente
correta” para o problema. Essa resposta deve estar relacionada e coincidir
com a construção histórica do conceito, por isso, a consideramos como
“matematicamente correta”. A ação do educador torna-se essencial neste
momento de compartilhamento de ações e ideias, em que todos devem chegar
a uma solução semelhante àquela historicamente vivenciada pelo homem.
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De maneira sucinta, Lopes e Vaz (2014, p. 1023) explanam que “[...] a síntese coletiva
refere-se à solução da situação problema na AOE que deve ser realizada na coletividade, a partir
de situações que exigem o compartilhamento de ações”.
Do ponto de vista da organização do ensino, a síntese da solução em coletividade se torna
um dos momentos mais delicados para o professor, pois os discentes vão expor as ideias elaboradas
como possível resposta para a situação-problema e por meio do conito entre as mesmas deve-se
encontrar uma solução em consenso.
O papel do docente neste momento é essencial, cabe a ele mediar a situação de modo a con-
duzir os estudantes para uma construção coletiva que visa encontrar a solução mais adequada do
problema proposto, sem propor a solução imediata, mas sim, levantar hipóteses e questionamentos
que possam fazer emergir reexões nos discentes a partir das ideias expostas, podendo modicá-las
e aprimorá-las, a ponto de formalizar os conceitos envolvidos e encontrar a melhor solução para
a situação desencadeadora em questão.
Descrição do experimento realizado com os futuros professores de Matemática
O trabalho foi desenvolvido com licenciandos em Matemática da Universidade do Estado
da Bahia - UNEB/Campus X, localizada na cidade de Teixeira de Freitas na Bahia. A priori, a
proposta foi de cunho teórico-prático e teve a nalidade de construir documentos para o estudo
que permitam analisar a produção de signicados de futuros professores de Matemática, a partir
da vivência e exploração de Atividades de Ensino sobre diferentes modelos geométricos.
Os dados foram coletados durante a aplicação de um projeto de intervenção que teve 7
encontros com a duração de 3 horas cada, em que foram utilizados os seguintes instrumentos de
coleta de dados: questionário diagnóstico, Atividades de Ensino, gravações áudiovisuais e o roteiro
de observação.
As Atividades de Ensino foram construídas a partir dos pressupostos teórico-metodológicos
da AEO e utilizadas como contexto para estimular a negociação de signicados de futuros profes-
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Os participantes foram divididos durante a participação na pesquisa em 4 grupos com 4
integrantes cada, e, se auto denominaram: Licenciandos do grupo Beta (LB 1, LB 2, LB 3, LB 4);
Licenciandos do grupo Delta (LD 1, LD 2, LD 3, LD 4); Licenciandos do grupo Geodésicos (LG
1, LG 2, LG 3, LG 4); Licenciandos do grupo Os Quatro Postulados (LO 1, LO 2, LO 3, LO 4).
Para identicar no processo de categorização a origem dos dados dessa pesquisa, denotamos
a seguinte codicação: L (acompanhado da letra do grupo e o número) Licenciando e o grupo
que pertence; AE (acompanhado do número) – Atividade de Ensino; PP – Professor Pesquisador;
RI (acompanhado do número) – relatório individual.
Neste artigo abordaremos a produção de signicados dos participantes que foram captadas a
partir da aplicação da Atividade de Ensino intitulada “A soma dos ângulos internos de um triângulo
qualquer é sempre 180º?”.
Atividade de Ensino: A soma dos ângulos internos de um triângulo qualquer é
sempre 180º?
A Atividade de Ensino (AE) serviu como o condutor para a construção de um espaço de
negociação de signicados sobre diferentes modelos geométricos que se constituíram a partir das
discussões, diálogos e reexões produzidas pelos licenciandos e pelo professor-pesquisador. O
processo de construção dos conhecimentos geométricos foram investigados a partir da necessidade
de sua produção, analisando as limitações do modelo geométrico euclidiano para que emergisse
novas formas de perceber e compreender o espaço em que vivemos.
Segue abaixo a representação da AE.
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Figura 2: AE - A soma dos ângulos internos de um triângulo qualquer é sempre 180º?
Fonte: Autor (2018).
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Atividade orientadora de ensino: uma proposta à produção de signicados em Geometria
As AE foram pensadas a partir dos conhecimentos geométricos prévios dos
participantes, de maneira que a interação entre o licenciando e os conteúdos abordados
fossem se desenvolvendo por meio de um processo investigativo que articulou os conceitos
em níveis de aprofundamento, ou seja, todas as AE eram interligadas e a compreensão dos
conceitos de uma se tornava pré-requisito para a realização da outra. As AE focaram na
generalização do conhecimento geométrico em estudo.
Aspectos constitutivos da produção de signicados geométricos sobre o estudo
de diferentes Geometrias
A partir da leitura cuidadosa e aprofundada do material das observações, do registro escrito
produzido pelos participantes e das transcrições dos eventos ocorridos nos encontros, realizamos
o agrupamento das informações por meio de conteúdos semelhantes, complementares ou contra-
dição, de maneira a apreender a produção de signicados dos futuros professores de Matemática
sobre conceitos fundamentais das Geometrias Não Euclidianas. A triangulação dos dados zeram
emergir as seguintes categorias de análise: “Conito – da validade lógica à validade empírica” e
“Ruptura – do espaço euclidiano para outros espaços”.
A categoria “Conito da validade lógica à validade empírica” se manifesta primeiramente
no conhecimento prévio do participante, quando este assume a Geometria Euclidiana como um
sistema logicamente consistente, considerando-o como a única forma de interpretar e representar
o espaço físico real. E se completa quando o participante compreende que a validade empírica
do conhecimento geométrico euclidiano depende do contexto em que é utilizado. Já a categoria
“Ruptura – do espaço euclidiano para outros espaços” se manifesta quando há o rompimento do
paradigma de uma única Geometria, ou seja, na aceitação de modelos geométricos não euclidianos
e no movimento de construção de novos conhecimentos a partir dessa compreensão.
Apresentaremos a seguir em forma de episódio alguns momentos dos encontros formativos
cuja discussão coletiva sobre o estudo de GNE se fez presente.
Clovis Lisbôa dos Santos Junior e Lícia de Souza Leão Maia
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Análise da produção de signicados dos participantes no desenvolvimento da
atividade de ensino
Este episódio é um recorte do terceiro encontro da aplicação da proposta de intervenção
que aconteceu no dia 11 de maio de 2019. O episódio tem sua estrutura captada no momento
da plenária da AE e destacamos o movimento dos licenciandos na construção de triângulos
na superfície esférica.
No Episódio 4 observamos que a categoria “Ruptura” é a que se manifesta de predominante-
mente, uma vez que ca claro no movimento realizado pelos participantes ao desenvolverem a AE que
houve a aceitação por parte dos mesmos da existência de modelo geométrico não euclidiano e passam
a construir novos conceitos geométricos não somente considerando as limitações dos conhecimentos
geométricos euclidianos, como também relacionando seus conhecimentos geométricos diretamente
com a superfície em estudo. A aceitação do modelo geométrico esférico evidencia o rompimento com
a estrutura lógica da Geometria Euclidiana, exigindo dos participantes novas formas de pensar e agir
no processo de construção de conceitos geométricos.
Na Cena 1 apresentamos o movimento dos licenciandos ao vericarem que a soma dos ângulos
internos de um triângulo esférico é maior que 180º.
Cena 1: Discussão sobre a construção de triângulo esférico
PP – Considerando a situação vivenciada por Anselmo, explique o que pode estar ocorrendo com
conceitos de Euclides, sobre a soma dos ângulos internos do triângulo para que não funcione no
mundo de Anselmo.
LO 4 – A gente colocou que a demonstração de Euclides é feita no plano e Anselmo está fazendo na
Terra, né. Então vai dar diferença já que é uma esfera.
LB 3 O porquê a gente não conseguiu. Mas zemos um monte de triângulos (na bola de isopor) que a
soma dos ângulos deram duzentos e tantos graus. Que deu assim ... 80º num vértice, 80º no outro e 90º.
PP – O que o grupo LG respondeu?
LG 1 – Que a soma sempre está dando maior que 180º.
PP – Então, dar sempre maior que 180º é um furo na consequência do V postulado de Euclides, da
dedução do Postulado de Euclides que diz que a soma dos ângulos interno de um triângulo tem que
dar 180º.
Fonte: Dados da pesquisa – Episódio 4.
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Atividade orientadora de ensino: uma proposta à produção de signicados em Geometria
Na discussão o grupo LO coloca como perspectiva de análise inicial o tipo de superfície
que está em jogo argumentando que “A gente colocou que a demonstração de Euclides é feita no
plano e Anselmo está fazendo na Terra, né? Então vai dar diferença já que é uma esfera.” (LO
4, Episódio 4, 2019). Nesse momento compreendemos que os participantes não desenvolveram
argumentos a partir do questionamento da ideia de que a soma dos ângulos internos de um triângulo
qualquer na superfície plana é sempre igual a 180º como demonstrado por Euclides. A aceitação
do modelo geométrico esférico proporcionou aos licenciandos novas maneiras de pensar e agir
durante a construção do saber, uma vez que possibilitou a atribuição de signicados diferentes ao
concluírem que um triângulo esférico tem a soma dos seus ângulos internos maior do que 180º.
“O porquê a gente não conseguiu. Mas zemos um monte de triângulos (na
bola de isopor) que a soma dos ângulos deram duzentos e tantos graus. Que
deu assim ... 80º num vértice, 80º no outro e 90º.” (LB 3, Episódio 4, 2019).
“Que a soma sempre está dando maior que 180º.” (LG 1, Episódio 4, 2019).
Na Figura 3 denotamos a construção - realizada pelo grupo LB - de triângulos esféricos na
bola de isopor e o processo de aferição dos ângulos nesses objetos.
Figura 3 – Construção de triângulos em superfície esférica.
Fonte: Dados da pesquisa (2019).
Clovis Lisbôa dos Santos Junior e Lícia de Souza Leão Maia
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Na Cena 2 abordamos o movimento dos participantes na primeira parte da ocina de cons-
trução de um triângulo qualquer em uma folha de papel A4. O objetivo da realização desse expe-
rimento foi o de articular a construção de triângulos na superfície plana como uma consequência
do paralelismo entre retas na Geometria Euclidiana.
Cena 2: Discussão sobre a construção de triângulos na superfície plana
PP Vocês realizaram dois experimentos. A primeira ocina vocês montaram um triângulo qual-
quer. Qual é a conclusão que vocês chegaram sobre a soma dos ângulos internos do triângulo
em uma folha de papel?
LB 1 – Que a soma dá um ângulo raso.
LO 4 – A soma dos ângulos internos vai dar sempre 180º.
LB 3 – Chegamos até na ideia de retas paralelas.
LO 4 – A gente percebeu que são duas paralelas (mostrando a construção do triângulo rea-
lizado pelo grupo na folha de papel). Colocamos assim: qualquer triângulo construído entre
duas paralelas a gente tem a soma dos ângulos internos igual a 180º. A gente tem isso como
consequência do V postulado de Euclides.
Fonte: Dados da pesquisa – Episódio 4.
Acreditamos que o primeiro experimento possibilitou que os licenciandos internalizassem
-por meio de uma situação prática- o conceito de paralelismo na Geometria Euclidiana e atribuí-
rem signicados para o conceito de paralelismo ao vericarem que a soma dos ângulos internos
de um triângulo qualquer é uma das consequências do Postulado das Paralelas. Esse processo é
constatado também através das falas dos participantes ao exporem que:
“A gente percebeu que são duas paralelas (mostrando a construção do
triângulo realizado pelo grupo na folha de papel). Colocamos assim: qualquer
triângulo construído entre duas paralelas a gente tem a soma dos ângulos
internos igual a 180º. A gente tem isso como consequência do V postulado de
Euclides”. (LO 4, Episódio 4, 2019).
Na Figura 4 apresentamos imagens dos licenciandos desenvolvendo o experimento durante
o encontro. Nesse dado momento eles buscaram demonstrar que a soma dos ângulos internos de
um triângulo na Geometria Euclidiana é igual a 180º.
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Atividade orientadora de ensino: uma proposta à produção de signicados em Geometria
Figura 4 - Vericação da soma dos ângulos internos de um triângulo qualquer na superfície plana
Fonte: Dados da pesquisa (2019).
Logo, os participantes compreenderam que as dobraduras realizadas a partir das medianas do
triângulo construído uniram os vértices na base do mesmo formando um ângulo raso e que a nova
gura formada representa um quadrilátero onde a base e a parte de cima da gura são paralelas.
Assim, os licenciandos conseguiram relacionar que a soma dos ângulos internos de um triângulo
na Geometria Euclidiana é uma consequência do paralelismo entre retas.
O segundo experimento consistiu na construção de triângulos em uma bola de isopor com o
uso de tas adesivas coloridas para descrever as geodésicas que forma os mesmos. A partir dessa
construção esperávamos que os participantes comparassem os triângulos esféricos com o triângu-
lo construído na folha de papel A4 e, por meio de suas diferenças, estabelecessem aspectos que
pudessem determinar o tipo de superfície em que Anselmo se encontra.
Para melhor compreensão da formação de ângulos internos de um triângulo esférico cons-
truímos, como parte do experimento II, um instrumento para medir ângulos em superfície esférica.
O transferidor esférico
1
é um instrumento que quando manuseado de maneira adequada auxilia na
aferição dos ângulos proporcionando maior conabilidade para os dados investigados.
1 As informações sobre o processo de construção e utilização de um transferidor esférico foram consultadas no livro
Atividades experimentais de matemática nos anos nais do ensino fundamental de autoria de Carlos Eduardo de Souza
Campos Granja e José Luiz Pastore Mello, publicado em São Paulo: Edições SM, 2012.
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A construção do transferidor esférico foi realizada pelos participantes da pesquisa durante
o encontro como podemos observar na Figura 5.
Figura 5 - Construção do transferidor esférico
Fonte: Dados da pesquisa (2019).
A construção de um instrumento especíco para a medição de ângulos na superfície esférica
contribuiu para o entendimento dos participantes acerca da formação de ângulos em uma superfície
esférica, uma vez que o manuseio do transferidor esférico proporcionou aos participantes certa
segurança para armar que a soma dos ângulos internos de um triângulo esférico é maior que 180º.
Em nossa análise, a ideia de um instrumento especíco para medir ângulos em superfície esférica
foi também mais um aspecto relevante para a aceitação da existência de um modelo geométrico
diferente do euclidiano.
Mediante aquilo que nossa compreensão abarcou temos que as ações realizadas pelos
participantes durante a construção do transferidor esférico proporcionou a troca de conhecimen-
tos geométricos entre os mesmos, à medida que foram desenvolvendo estratégias para recortar,
enumerar e colar, estes passaram a estabelecer as relações de uso do instrumento com a forma e
medidas da bola de isopor. Assim, consideramos que o participante também produziu signicados
sobre os conteúdos geométricos ao confeccionar o transferidor esférico, uma vez que a apropriação
de conceitos e de signicados ocorre da atividade coletiva para a individual (VYGOTSKI, 2001).
Podemos observar, nos dizeres dos participantes, o quanto se tornou signicativo o processo
de construção do transferidor esférico:
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Atividade orientadora de ensino: uma proposta à produção de signicados em Geometria
“Foi nos dado materiais para construção de um transferidor esférico e nos
surpreendemos, pois nunca havíamos visto um e ainda mais construirmos. Foi
de grande experiência ter desenvolvido essa atividade com material concreto,
pôr em prática todos os conceitos teóricos e nos fez ampliar a aprendizagem e
vermos na prática como a geometria funciona”. (LD 3, RI 5, 2019).
Já no recorte apresentado na Cena 3 observamos que os licenciandos ao construírem os
triângulos esféricos na bola de isopor constataram que a medida em que os triângulos aumentam
as suas dimensões os ângulos internos também aumentam e, consequentemente, aumentam a área
dos mesmos.
Cena 3: Discussão sobre as características de um triângulo esférico
PP – Utilizando a bola de isopor construa três triângulos esféricos um dentro do outro. O
que vocês perceberam? A soma dos ângulos internos do triângulo foram iguais, menores ou
maiores de 180º?
Todos – Maiores.
PP – O que seria um triângulo esférico?
LB 3 – Três geodésicas que se interceptam.
PP – Na verdade elas sempre vão se interceptar. Então é a região formada por três geodésicas
distintas.
PP – O que podemos armar do mundo de Anselmo?
LB 3 – Que o mundo dele não é plano.
LO 4 – Que é esférico.
PP – Mesmo que ele não tenha a certeza que ele é esférico, ele tem a certeza que não é plano.
Eu queira perguntar para vocês... A medida que o triângulo vai crescendo na Geometria
esférica os ângulos vão ...
LO 4 – aumentando também.
PPA área dele aumenta também?
LO 4 – A área?
LO 1 – A área aumenta.
PP – Tem alguma relação com a Geometria plana?
Todos – Concordam que não.
PP – Esta pode ser uma das percepções de Anselmo que indica que não está no plano e sim
numa esfera.
Fonte: Dados da pesquisa – Episódio 4.
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Em nossa compreensão, os participantes ao analisar a área e os ângulos internos de um
triângulo esférico passaram a atribuir novos signicados para a relação entre eles ao constatarem
que à medida que a soma dos ângulos internos de um triângulo esférico aumenta sua área também
aumenta, conduzindo-os a concluírem que não semelhança de triângulos na Geometria Esférica.
“Analisarmos a área e os ângulos do triangulo esféricos percebemos que
quanto maior a área maior os ângulos, ao contrário do que acontece na
plana que os ângulos matem se os mesmo sendo assim não tem semelhanças
de triângulos na geometria esférica pois os ângulos mudam de acordo com
a sua área.” (LD 2, RI 4, 2019).
Nesse contexto, compreendemos que o movimento realizado pelos participantes no Episódio
4 foi caracterizado pela ruptura dos mesmos com a ideia de um único modelo geométrico, pois
ao internalizarem que a soma dos ângulos internos de um triângulo esférico é maior que 180º
foi possível compreender a partir da relação entre área e ângulos internos de um triângulo, que o
modelo geométrico mais adequado para representar o espaço físico em que vive o personagem
Anselmo é constituído pela Geometria Esférica.
Considerações Finais
As interações entre pesquisador-participante, participante-participante e participante-
-artefatos conguraram uma atividade de formação, na qual compreendemos que o processo de
aprendizagem e a construção de conhecimentos por parte dos envolvidos foram constituídos na
interação e comunicação entre os mesmos.
A Atividade Ensino criada por nós e apresentada nesse artigo foi pertinente para a produção
de signicados acerca do conhecimento geométrico não euclidiano, uma vez que as situações
vivenciadas pelos participantes potencializaram ações que os mesmos não conseguiam realizar
sozinhos.
As categorias de análises “Conito - da validade lógica à validade empírica” e “Ruptura
- do espaço euclidiano para outros espaços” nos permitiram acessar diversos signicados que
os licenciandos produziram para os conteúdos geométricos estudados, dando condições para
negociarmos novos signicados em uma perspectiva Histórico-Cultural na qual a construção
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Atividade orientadora de ensino: uma proposta à produção de signicados em Geometria
do conhecimento geométrico se manifestou como uma produção humana, resultado de uma ação
compartilhada entre licenciando/licenciando e licenciando/professor-pesquisador.
Desse modo, compreendemos que o movimento realizado pelos participantes foi
caracterizado pela ruptura dos mesmos com a ideia de um único modelo geométrico. Pois,
ao internalizarem que a soma dos ângulos internos de um triângulo esférico é maior que
180º, os estudantes tiveram a condição de armar que o modelo geométrico mais adequado
para representar o espaço físico em que vive o personagem Anselmo é constituído pela
Geometria Esférica. Além disso, os participantes ao analisar a área e os ângulos internos
de um triângulo esférico passaram a atribuir novos signicados para a relação entre eles,
ao constatarem que a medida que a soma dos ângulos internos de um triângulo esférico
aumenta sua área também aumenta, conduzindo-os a concluírem que não há semelhança
de triângulos na Geometria Esférica.
Por tudo que foi exposto, compreendemos que a intervenção pedagógica realizada com os
licenciandos foi constituída a partir dos princípios teórico-metodológicos da AOE, como um modo
de organização do ensino, em que o seu principal conteúdo foi estudar conceitos geométricos
não euclidianos. O objetivo foi aferir a constituição do pensamento teórico dos licenciandos no
movimento de apropriação de conceitos geométricos (euclidianos e não euclidianos) a partir da
vericação empírica dos mesmos em diferentes espaços geométricos.
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Recebido em: 20 de junho de 2020
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