Plurais - Revista Multidisciplinar, Salvador, v. 8, n. 00, e023013, 2023. e-ISSN: 2177-5060
DOI: https://doi.org/10.29378/plurais.v8i00.15401 1
AS LUTAS SOCIAIS POPULARES PELO TERRITÓRIO QUILOMBOLA E A
QUESTÃO AGRÁRIA
LUCHAS SOCIALES POPULARES POR EL TERRITORIO QUILOMBOLA Y LA
CUESTIÓN AGROPECUARIA
POPULAR SOCIAL STRUGGLES FOR QUILOMBOLA TERRITORY AND THE
AGRICULTURAL ISSUE
Ramofly BICALHO1
e-mail: ramofly@gmail.com
Guilherme Goretti RODRIGUES2
e-mail: guilhermegoretti.geografia@gmail.com
Pedro Clei Sanches MACEDO3
e-mail: pedroclei@hotmail.com
Como referenciar este artigo:
BICALHO, R.; RODRIGUES, G. G.; MACEDO, P. C. S.
As lutas sociais populares pelo território quilombola e a
questão agrária. Plurais - Revista Multidisciplinar,
Salvador, v. 8, n. 00, e023013, 2023. e-ISSN: 2177-5060.
DOI: https://doi.org/10.29378/plurais.v8i00.15401
| Submetido em: 17/09/2023
| Revisões requeridas em: 15/10/2023
| Aprovado em: 11/11/2023
| Publicado em: 20/12/2023
Editoras:
Profa. Dra. Célia Tanajura Machado
Profa. Dra. Kathia Marise Borges Sales
Profa. Dra. Rosângela da Luz Matos
Editor Adjunto Executivo:
Prof. Dr. José Anderson Santos Cruz
1
Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), Rio de Janeiro RJ Brasil. Professor Associado do
Departamento de Educação, do Programa de Pós-Graduação em Educação Agrícola e no Programa de s-
graduação em Educação, contextos contemporâneos e demandas Populares.
2
Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), Rio de Janeiro RJ Brasil. Pesquisador e membro do
Grupo de Pesquisa: Educação do Campo, Movimentos Sociais e Pedagogia da Alternância (UFRRJ). Servidor
público da Prefeitura Municipal de Matias Barbosa, Minas Gerais MG.
3
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Amapá (IFAP), Amapá AP Brasil. Técnico em
assuntos educacionais pelo IFAP. Membro do Grupo de Pesquisa sobre Mundo do Trabalho e Educação
Profissional- GEMEP/IFAP.
As lutas sociais populares pelo território quilombola e a questão agrária
Plurais - Revista Multidisciplinar, Salvador, v. 8, n. 00, e023013, 2023. e-ISSN: 2177-5060
DOI: https://doi.org/10.29378/plurais.v8i00.15401 2
RESUMO: A Constituição Federal de 1988 foi um marco para os quilombos, no que se refere
ao reconhecimento enquanto sujeitos de direitos. Contudo, a realidade vivenciada pelos
quilombos continua dramática, tanto pela dificuldade nos processos de demarcação do
território, quanto nas situações de conflitos, desigualdades e injustiças da questão agrária
brasileira. Mesmo assim, emergem experiências de luta pelo território encaminhadas pelo
movimento quilombola, denunciando e buscando a efetivação de políticas públicas. Este artigo
tem por objetivo analisar os desafios da luta pelo território quilombola e o protagonismo
exercido pelos movimentos sociais, tendo como recorte histórico o processo de golpe jurídico-
parlamentar iniciado em 2015. Como metodologia, pauta-se no aspecto qualitativo e
quantitativo, por meio de referencial teórico e dados que analisam criticamente a questão agrária
brasileira e as comunidades quilombolas. Conclui-se com uma reflexão acerca dos desafios em
curso para o conjunto da classe trabalhadora, em que se inserem as comunidades quilombolas.
PALAVRAS-CHAVE: Questão agrária. Território Quilombola. Movimentos sociais. Políticas
sociais.
RESUMEN: La Constitución Federal de 1988 marcó un hito para los quilombos, en términos
de reconocimiento como sujetos de derechos. Sin embargo, la realidad que viven los quilombos
sigue siendo dramática, tanto por la dificultad en los procesos de demarcación del território,
como por situaciones de conflictos, desigualdades e injusticias en la cuestión agraria
brasileña. Aun así, surgieron experiencias de lucha por el território, lideradas por el
movimiento quilombola, denunciando y buscando la implementación de políticas públicas. Este
artículo tiene como objetivo analizar los desafíos de la lucha por el território quilombola y el
protagonismo ejercido por los movimientos sociales, tomando como perspectiva histórica el
proceso de golpe jurídico-parlamentario iniciado en 2015. Como medología, se basa em el
aspecto cualitativo y cuantitativo, a través de marcos teóricos y datos que analizan criticamente
la cuestión agraria brasileña y las comunidades quilombolas. Concluye con una reflexión sobre
los desafíos actuales para la clase trabajadora en su conjunto, incluídas las comunidades
quilombolas.
PALABRAS CLAVE: Cuestión agraria. Territorio Quilombola. Movimientos sociales.
Políticas sociales.
ABSTRACT: The 1988 Federal Constitution was a milestone for quilombos, regarding
recognition as subjects of rights. However, the reality experienced by quilombos remains
dramatic, both due to the difficulty in the processes of demarcating the territory and in
situations of conflicts, inequalities, and injustices in the Brazilian agrarian issue. Even so,
experiences of struggle for territory emerged, led by the quilombola movement, denouncing
and seeking the implementation of public policies. This article aims to analyze the challenges
of the struggle for quilombola territory and the protagonism exercised by social movements,
taking the legal-parliamentary coup process initiated in 2015 as a historical perspective. It is
a methodology based on the qualitative and quantitative aspects through the theoretical
framework and data that critically analyze the Brazilian agrarian issue and quilombola
communities. It concludes with a reflection on the ongoing challenges for the working class as
a whole, which includes quilombola communities.
KEYWORDS: Agrarian question. Quilombola territory. Social movements. Social politics.
Ramofly BICALHO; Guilherme Goretti RODRIGUES e Pedro Clei Sanches MACEDO
Plurais - Revista Multidisciplinar, Salvador, v. 8, n. 00, e023013, 2023. e-ISSN: 2177-5060
DOI: https://doi.org/10.29378/plurais.v8i00.15401 3
Introdução
A existência dos quilombos se faz no interior do processo de formação social, política e
econômica do Brasil. Durante séculos, nos mais variados contextos e realidades
sociogeográficas, houve a resistência e existência do povo negro, como forma de contestar tanto
a opressão do sistema colonial-escravocrata, quanto a situação de exclusão e vulnerabilidade
desses grupos no pós-abolição. Colocados como perigosos e subversores da ordem social,
política e econômica estabelecida, muitos quilombos foram reprimidos de forma violenta pelo
Estado e pela elite econômica. Além disso, criou-se no imaginário da sociedade brasileira a
concepção de que as comunidades quilombolas são algo do passado e, mesmo admitindo sua
existência no presente, os condenam sob o estereótipo de grupos atrasados.
Os quilombos contribuíram de forma fundamental para o processo civilizatório
brasileiro, deixando-nos um importante acervo e legado que articulam as dimensões
patrimoniais (materiais e imateriais), culturais, religiosas, artísticas, além de valores,
oralidades, memórias, saberes, fazeres e concepções de mundo com base no trabalho coletivo,
na troca, no mutirão e no uso comum da terra. Concordando com Gusmão (1995, p. 124), o
território quilombola torna-se “sinônimo de um conjunto de relações vividas, é trabalho
concreto, é trabalho de uma memória que se fabrica conjunturalmente; é experiência pessoal e
coletiva, relação cotidiana, organização e resistência”. Isso confere uma identidade própria, em
constante construção e articulação entre passado e presente. Apesar de cada comunidade
quilombola possuir uma especificidade do ponto de vista da organização social, política e
econômica, são elementos materiais e simbólicos comuns que as unem e identificam.
Como adverte Almeida (2002), é preciso que nos libertemos da definição arqueológica
de quilombo, que reproduz estereótipos, preconceitos e desumanização dos sujeitos
quilombolas, por ligar quilombo à ideia de passado, de sujeitos atrasados ou isolados
geograficamente. Por isso, Almeida (2002) reforça a importância de compreender as
comunidades quilombolas ao longo do processo histórico e, especialmente, como elas se
afirmam na atualidade, com novas dinâmicas sociais e culturais, como forma de existência e
resistência étnica e social no presente.
De acordo com Gomes (2015, p. 120), por diversas regiões, “os vários quilombos – que
eram verdadeiras micro comunidades camponesas continuaram a se reproduzindo,
migrando, desaparecendo, emergindo e se dissolvendo no emaranhado das formas camponesas
do Brasil de norte a sul”, ou seja, constituem-se como parte específica da totalidade das formas
As lutas sociais populares pelo território quilombola e a questão agrária
Plurais - Revista Multidisciplinar, Salvador, v. 8, n. 00, e023013, 2023. e-ISSN: 2177-5060
DOI: https://doi.org/10.29378/plurais.v8i00.15401 4
camponesas no Brasil, acumulando experiências, construindo suas identidades, partilhando as
memórias coletivas e conhecimentos passados de geração a geração.
Portanto, a questão quilombola é tão contemporânea e complexa que merece a
compreensão para uma realidade sensível, principalmente nos desafios que se articulam nas
dimensões materiais, tais como a luta por terra e território, assim como simbólica, por meio da
valorização étnico-racial e cultural, que caminhe para a superação dos estigmas, preconceitos e
do racismo, enraizado em nossa sociedade como herança colonial-escravocrata.
Assim, este artigo é fruto dos desdobramentos das pesquisas desenvolvidas no grupo de
pesquisa Educação do Campo, Movimentos Sociais e Pedagogia da Alternância da
Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ). Parte de uma abordagem tanto teórica,
dialogando com autores que tratam sobre a questão agrária e quilombola, quanto quantitativa,
referenciando-a na problematização dos conflitos agrários, tomando como recorte histórico o
período de 2015 a 2018. Esse período é crucial para a história brasileira, pois trouxe profundas
alterações na realidade social, política e econômica, tais como o impeachment da ex-presidente
Dilma Rousseff e a ascensão do governo de extrema-direita e fascista de Bolsonaro.
Desse modo, este trabalho apresenta três aspectos centrais que serão debatidos ao longo
do texto. Primeiro, busca analisar a questão agrária brasileira, que revela, historicamente, a
dramática situação em que vivem as comunidades quilombolas e outros povos tradicionais. A
violência e o massacre no campo, cometidos pela classe ruralista, violando a Constituição
Federal e os Direitos Humanos em prol de projetos que privilegiam o agronegócio, a mineração
e o extrativismo predatório vêm nos mostrando a insustentabilidade do modelo de
desenvolvimento capitalista para o campo, que é excludente e desigual.
O segundo ponto a ser abordado consiste na apresentação específica do panorama das
comunidades quilombolas em face da atual realidade e contexto agrário. Este exame terá como
base a conjuntura política, econômica e social vigente, destacando-se o período pós-golpe
parlamentar, jurídico e midiático deflagrado em 2015. Esse evento, percebido como um
indicativo de retrocessos sociais, culminou na ascensão de um candidato à presidência da
República durante as eleições de 2018 no Brasil.
O referido candidato manifestou uma forte afinidade com ideias de cunho fascista,
evidenciando-se por meio da adoção de discursos que promovem a eliminação de diversidades,
perseguição a minorias, incitação à violência e ódio, bem como a oposição à pluralidade de
ideias e à liberdade de pensamento. Essa postura, notadamente, se contrapõe às correntes
marxistas, que têm sido particularmente alvo de críticas e repressão no contexto atual.
Ramofly BICALHO; Guilherme Goretti RODRIGUES e Pedro Clei Sanches MACEDO
Plurais - Revista Multidisciplinar, Salvador, v. 8, n. 00, e023013, 2023. e-ISSN: 2177-5060
DOI: https://doi.org/10.29378/plurais.v8i00.15401 5
Por último, trata-se de defender a importância de fortalecer os movimentos sociais,
construídos por homens e mulheres nas mais variadas situações de conflitos sociais, políticos e
ambientais. Desvelar essas experiências e o fazer educativo e formativo desses movimentos são
condições fundamentais para o fortalecimento das lutas populares, na medida em que elas
contribuem para a elevação da consciência crítica dos sujeitos, dos subalternos e oprimidos, e
propõem um projeto de sociedade efetivamente popular e democrático.
Lutas sociais e a questão agrária
Do ponto de vista histórico, a Constituição Federal de 1988 representou um importante
marco para as comunidades quilombolas, especialmente pelo reconhecimento enquanto sujeitos
de direitos por parte do Estado, tanto na obrigatoriedade de titulação dos territórios, expressos
no artigo 68° do ato das disposições constitucionais transitórias (ADCT), quanto na proteção
do patrimônio cultural material e imaterial desses grupos por meio dos artigos 215 e 216. Essas
conquistas demarcaram um novo lugar político e social para os quilombos, fazendo-se visíveis
para o Estado e para a sociedade civil, seja na luta por políticas públicas ou no enfrentamento
do debate e denúncia acerca da situação de vulnerabilidade e violência sofrida historicamente
pelos quilombos, marcada por uma estrutura brasileira de profundas desigualdades sociais,
políticas e econômicas.
Fruto desse processo de mobilização, foi a posterior conquista do Decreto n.º 4.887, de
20 de novembro de 2003, em que se estabeleceu o critério de autoatribuição de cada
comunidade quilombola, isto é, quem define o que é quilombo não é o Estado, e sim as próprias
comunidades, a partir dos laços identitários, culturais, patrimoniais, inclusive, na indicação do
território ancestral a ser demarcado e titulado, assim como outras políticas públicas.
O Programa Brasil Quilombola, criado em 2004, mais tarde incorporado por meio do
Decreto n.º 6.261, dispõe sobre a gestão integrada para o desenvolvimento da agenda social
quilombola, permitindo ações para consolidar o acesso à terra, a infraestrutura e qualidade de
vida, a inclusão produtiva e desenvolvimento local, aos direitos e cidadania. O Decreto n.º
5.051, de 19 de abril de 2004, promulga a convenção 169 da Organização Internacional do
Trabalho (OIT) acerca da proteção e respeito aos direitos de povos indígenas e tribais. O
Decreto n.º 6.040, de 7 de fevereiro de 2007, institui a política nacional de desenvolvimento
sustentável dos povos e comunidades tradicionais. Por fim, a Resolução n.º 8, de 20 de
novembro de 2012, define as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Escolar
As lutas sociais populares pelo território quilombola e a questão agrária
Plurais - Revista Multidisciplinar, Salvador, v. 8, n. 00, e023013, 2023. e-ISSN: 2177-5060
DOI: https://doi.org/10.29378/plurais.v8i00.15401 6
Quilombola na educação básica, fundamentais para que se valorize e respeite a rica contribuição
dos quilombos para o processo civilizatório nacional, assim como se avance na luta antirracista.
Na sua contribuição sobre a questão agrária brasileira, Stédile (2011, p. 15) a define
como um conjunto de interpretações e análises da realidade agrária, que procura explicar como
se organiza a posse, a propriedade, o uso e a utilização das terras na sociedade brasileira”. Do
ponto de vista histórico, pode-se afirmar que o que marca a realidade agrária brasileira é a
concentração de terras e formação do latifúndio, muitas vezes obtida por meio de mecanismos
ilegais (invasão, coerção e grilagem), articulada por políticas instituídas no governo que
favorece a classe dominante agrária.
A respeito da concentração de terras e formação do latifúndio, é importante lembrar, por
exemplo, da Lei de Sesmarias (criada em Portugal no ano de 1375 e depois enquanto política
agrária no Brasil colônia), com a distribuição de grandes porções de terras a um donatário,
sendo base para a formação do latifúndio no período colonial. a Lei de Terras de 1850, previa
a aquisição de terras por meio de um contrato de compra e venda, além de regularizar as posses
consolidadas, o que manteve a exclusão das camadas mais pobres para o acesso à terra, tendo
em vista os elevados preços para a sua aquisição (Panini, 1990).
Tais políticas possibilitaram a constituição de propriedades monoculturais destinadas a
suprir o mercado europeu, mediante a adoção de um modelo agrícola que favorecia a prática
predatória. A utilização da mão de obra escrava tornou-se objeto de mercadoria e essencial para
a manutenção desse sistema (Panini, 1990).
Ao longo do desenvolvimento histórico, durante as transições do Brasil de Colônia para
Império e, subsequentemente, para o Período Republicano, os vínculos políticos e econômicos
permaneceram inalterados, direcionados à preservação do latifúndio e à promoção dos
interesses da elite agrária brasileira. Isso reitera a persistência das injustiças sociais. Panini
(1990) faz a relação de que a marginalização das camadas mais pobres, destituídas de qualquer
prestígio social, serviram para a organização e mobilização camponesa no Brasil, caso de
Canudos (1896), Contestado (1912), Cangaço (1870), dentre outros. Nessa mesma direção,
compreende-se a formação crítica e emancipadora dos quilombos como resistência e
contestação ao modelo político-econômico e social.
Essa realidade desigual acerca da questão agrária brasileira permeia e atravessa diversos
tempos históricos. O elemento fundamental é compreender a estrutura agrária como resultante
do modo de produção e dos arranjos políticos, econômicos e sociais estabelecidos em cada
conjuntura. No Brasil, a gênese da violência, do latifúndio e do favorecimento à oligarquia
Ramofly BICALHO; Guilherme Goretti RODRIGUES e Pedro Clei Sanches MACEDO
Plurais - Revista Multidisciplinar, Salvador, v. 8, n. 00, e023013, 2023. e-ISSN: 2177-5060
DOI: https://doi.org/10.29378/plurais.v8i00.15401 7
agrária permanece no modelo colonial-escravocrata e, posteriormente, no capitalismo. Como
afirma Oliveira (2005, p. 468):
No campo, o processo de desenvolvimento capitalista está igualmente
marcado pela industrialização da agricultura, ou seja, o desenvolvimento da
agricultura tipicamente capitalista abriu aos proprietários de terras e aos
capitalistas/proprietários de terra a possibilidade histórica da apropriação da
renda capitalista da terra, provocando uma intensificação na concentração da
estrutura fundiária brasileira.
Mesmo com o surgimento de uma burguesia industrial nas cidades, ao longo das
primeiras décadas republicanas, com a composição dos primeiros núcleos proletários, não se
rompeu com a estrutura agrária e tampouco com o modelo agrícola dependente (destinado à
exportação), permanecendo o latifúndio. Concomitante, a classe ruralista passa a instituir no
Estado as políticas públicas em prol dos seus interesses
4
. Essa intensificação na concentração
da estrutura fundiária brasileira a que se refere Oliveira (2005), se verifica em tempos mais
recentes, tanto no período da Ditadura Civil-militar (1964-1985)
5
, quanto na etapa do
neoliberalismo, ao longo dos anos 1990 até a atualidade.
A perpetuação de um modelo agrário-exportador, situando o Brasil numa condição de
economia dependente, juntamente com a industrialização na agricultura, caracterizada pela
intensificação da mecanização no campo e pelo uso de agrotóxicos, a abertura de novas
fronteiras agrícolas, implicando riscos aos biomas, à flora e à fauna, e as facilidades concedidas
às empresas estrangeiras por meio de políticas de abertura econômica, têm exacerbado as
contradições e conflitos sociais, ambientais e políticos no âmbito rural.
O agronegócio, junto com a mineração e outros grandes projetos territoriais (como as
hidrelétricas), deixa evidente o projeto de desenvolvimento adotado pelo Estado e amplamente
defendido pela classe ruralista. É relevante ressaltar que, ao mencionar os ruralistas, destaca-se
a existência de organizações, entidades, homens e mulheres concretos que elaboram políticas
com base em seus interesses e as inserem no âmbito estatal. A Associação Brasileira do
Agronegócio (ABAG), a Sociedade Nacional de Agricultura (SNA), o Instituto Brasileiro de
Mineração (IBRAM), deputados (as), senadores (as) ligados (as) ao setor do agronegócio,
4
Caso, por exemplo, da criação do Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio (MAIC), em 1909. Para essa
discussão, ver o trabalho de Mendonça (1997), essencial para entender as tramas e disputas das classes e frações
da classe ruralista para manutenção de seus interesses político-econômicos.
5
Martins (1985) debate como o Estatuto da Terra, de 1964, tratou-se de uma reforma que não causou rupturas com
o direito à propriedade, pelo contrário, evitou-se confrontar com o latifúndio e reprimir qualquer manifestação,
organização e resistência popular que questionasse esse modelo.
As lutas sociais populares pelo território quilombola e a questão agrária
Plurais - Revista Multidisciplinar, Salvador, v. 8, n. 00, e023013, 2023. e-ISSN: 2177-5060
DOI: https://doi.org/10.29378/plurais.v8i00.15401 8
agroquímico, mineração etc., são exemplos de organizações ou pessoas que respondem e
atendem aos interesses da classe ruralista.
Nesse contexto, utiliza-se como referência o período de 2015 a 2018, que assinala o
golpe parlamentar, jurídico e midiático resultando na destituição da então Presidenta Dilma
Rousseff e na posse de Michel Temer, que implementou ações e medidas impopulares e
antidemocráticas. Da mesma forma, observa-se o fortalecimento do espectro conservador e
fascista durante as eleições de 2018 no Brasil, representando uma ameaça aos povos e
comunidades tradicionais.
Em um caráter mais geral, a partir de 2015, algumas políticas foram aprovadas para
favorecer, sobretudo, setores ligados aos ruralistas, ressaltando sua elevada composição no
Congresso Nacional. Serão citadas algumas delas para mostrar tanto a desfaçatez com que a
classe ruralista se apropria do Estado para aprovar medidas que as favoreça, quanto para revelar
que é preciso estar atento para as políticas que ainda estão em curso: a Lei n.º 13.465 de 2017,
favorece a expansão agrícola, a especulação e a grilagem de terras; o PL n.º 4.059 de 2012, se
refere à aquisição de terras por empresas estrangeiras; o Decreto n.º 9.406, de junho de 2018,
regulamenta a mineração no Brasil (reivindicação das empresas de mineração); o Decreto n.º
9.142 de 2017, extinguiu a Reserva Nacional de Cobre nos Estados do Pará e Amapá (RENCA),
mas foi revogado pelo Decreto n.º 9.159; e a Portaria 1.129, revogada, mas que pulverizava a
fiscalização das condições análogas ao trabalho escravo.
A aprovação destas políticas, conjuntamente com outras medidas como a reforma
trabalhista, a reforma da previdência, a limitação dos gastos públicos em saúde e educação e a
reforma administrativa (em curso), tem contribuído para o aumento dos índices de violência e
conflitos no campo, conforme indicado pelo levantamento da Comissão Pastoral da Terra
(CPT)
6
. Isso é evidenciado tanto nos conflitos de terra em termos de número de ocorrências
(ver Tabela 1), quanto no número de assassinatos (ver Tabela 2) no período de 2008 a 2017.
6
Ver em: https://www.cptnacional.org.br/. Anualmente, a Comissão Pastoral da Terra (CPT) divulga o relatório
sobre os conflitos no campo no Brasil. Trata-se de um importante documento de consulta e reflexão, por meio da
disponibilização de dados acerca dos conflitos agrários, como também de artigos e textos de pesquisadores
dedicados ao tema.
Ramofly BICALHO; Guilherme Goretti RODRIGUES e Pedro Clei Sanches MACEDO
Plurais - Revista Multidisciplinar, Salvador, v. 8, n. 00, e023013, 2023. e-ISSN: 2177-5060
DOI: https://doi.org/10.29378/plurais.v8i00.15401 9
Tabela 1 Conflitos por terra (número de ocorrências)
Fonte: Comissão Pastoral da Terra (CPT)
Tabela 2 Total de assassinatos no campo (por ano)
Fonte: Comissão Pastoral da Terra (CPT)
Esse aumento nas taxas de conflitos e assassinatos no campo, sem contar os conflitos
por água e trabalho, revela que a institucionalização dos retrocessos sociais, com alto custo para
o conjunto da classe trabalhadora, aliado ao discurso conservador e fascista, que ganha força a
partir de 2015, trouxeram seus reflexos para o campo brasileiro. A intolerância, a impunidade
e o respaldo legalista dado à classe ruralista anunciam um futuro extremamente difícil para os
movimentos sociais de luta pela terra.
Entretanto, qual é o lugar dos quilombolas, camponeses e indígenas nesse processo? Até
este ponto, foi traçado um breve panorama e contexto histórico que revelam uma estrutura
As lutas sociais populares pelo território quilombola e a questão agrária
Plurais - Revista Multidisciplinar, Salvador, v. 8, n. 00, e023013, 2023. e-ISSN: 2177-5060
DOI: https://doi.org/10.29378/plurais.v8i00.15401 10
agrária perversa e desigual. Quais são as organizações e mobilizações populares, construídas
por homens e mulheres, que se destacam por sua existência e resistência?
Ao contrário do que apontam algumas literaturas
7
, o capitalismo, em virtude de sua
natureza desigual e contraditória, não logrou incorporar, na perspectiva do trabalho assalariado
e da demarcação entre proletariado e burguesia, nem eliminar os quilombolas, camponeses ou
indígenas. Pelo contrário, observa-se um acentuamento crescente das lutas sociais no campo,
onde se confrontam projetos de sociedade, fortalecem-se identidades, diferenças e movimentos
coletivos em prol da terra e do território. Segundo Oliveira (2004, p. 35):
A compreensão do papel e lugar dos camponeses na sociedade capitalista e no
Brasil, em particular, é fundamental. Ou entende-se a questão no interior do
processo de desenvolvimento do capitalismo no campo, ou então continuar-
se-á a ver muitos autores afirmarem que os camponeses estão desaparecendo,
mas, entretanto, eles continuam lutando para conquistar o acesso às terras em
muitas partes do Brasil.
Por mais que a estrutura agrária brasileira revele os bastidores da perversidade, é preciso
desvelar os movimentos sociais populares que emergem nessa realidade e se colocam de
maneira decisiva no jogo e na arena política, como espaço de disputa por terra (reforma agrária),
assim como trabalho, educação etc. Esse é o caso das experiências de luta do MST, CONAQ,
MAB, Via Campesina e tantos outros movimentos que se articulam em diversas escalas, com
potencialidades e intervenções locais, regionais ou nacionais. Valorizar essas ações e condensá-
las significa avançar em um projeto de sociedade efetivamente popular e democrático, com
respeito às diferenças, diversidades, justiça social e ambiental.
Nesse contexto, busca-se contribuir para o diálogo, focando nas lutas enfrentadas pelas
comunidades quilombolas no que diz respeito ao reconhecimento, demarcação e titulação de
seus territórios. Analisam-se os desafios presentes na conjuntura atual.
7
Sobre essa questão, ver Oliveira (2004).
Ramofly BICALHO; Guilherme Goretti RODRIGUES e Pedro Clei Sanches MACEDO
Plurais - Revista Multidisciplinar, Salvador, v. 8, n. 00, e023013, 2023. e-ISSN: 2177-5060
DOI: https://doi.org/10.29378/plurais.v8i00.15401 11
A luta pelo território quilombola: políticas em curso
A questão quilombola carrega suas especificidades em termos de sua trajetória cultural,
material, simbólica, religiosa, identitária, assim como de qualquer outro povo ou comunidade
tradicional. Não se pretende traçar uma linha histórica do processo de formação do quilombo,
considerando as consolidadas e difundidas contribuições de autores como Almeida (2002),
Arruti (2009) e O’Dwyer (2002). Em vez disso, busca-se compreender como o quilombo se
constrói e organiza no presente, bem como identificar os conflitos e desafios presentes na luta
pelo território.
Desde já, nota-se a relevância que a categoria “território” assume, não apenas
compreendida como uma delimitação jurídico-política, mas também abarcando dimensões
simbólicas e de pertencimento que os grupos sociais estabelecem em relação ao lugar em que
residem. Essas dimensões incluem os laços de solidariedade e reciprocidade formados, bem
como o uso coletivo da terra. Em última análise, o território é construído e reconstruído por
sujeitos individuais e coletivos, sendo essencial para a reprodução da vida material e simbólica
das comunidades.
Defender o território, como direito legítimo das comunidades quilombolas, significa
combater um passado e um presente de opressão e subalternidade nas dimensões de raça, classe
e gênero. Aponta-nos para a superação das representações inferiorizantes e estigmas criados
historicamente e ainda presentes no imaginário social brasileiro (com reflexos, inclusive, na
educação escolar). Defender o território trata-se, portanto, de respeitar os valores civilizatórios
das comunidades quilombolas e a sua rica contribuição para a formação social, cultural, política
e econômica do Brasil, além de avançar significativamente no combate às injustiças sociais
presentes em nossa estrutura agrária.
Por esse aspecto, uma discussão fundamental acerca dos movimentos sociais está na
perspectiva de analisar os movimentos quilombolas como uma das dimensões do Movimento
Negro. Como nos aponta Gomes (2017, p. 23):
Não queremos nos prender a uma vasta discussão conceitual sobre o que é e o
que não deve ser considerado como Movimento Negro. Importa-nos
compreender a potência desse movimento social e destacar as dimensões mais
reveladoras do seu caráter emancipatório, reivindicativo e afirmativo, que o
caracterizam como um importante ator político e como um educador de
pessoas, coletivos e instituições sociais ao longo da história e percorrendo as
mais diversas gerações.
As lutas sociais populares pelo território quilombola e a questão agrária
Plurais - Revista Multidisciplinar, Salvador, v. 8, n. 00, e023013, 2023. e-ISSN: 2177-5060
DOI: https://doi.org/10.29378/plurais.v8i00.15401 12
Os quilombos, por meio de seus espaços políticos, pautam e não dissociam as dimensões
de raça e classe. Primeiro, nas ações de combate ao racismo, encaminham demandas
centralizadas na questão da educação, desde as discussões que atravessam as escolas localizadas
nas comunidades (por meio da Educação Quilombola, enquanto diretriz curricular nacional
8
)
até a ocupação nas universidades, fortalecendo e defendendo a política de cotas e formando
profissionais em diversas áreas do saber e conhecimento. Nesse caminho, os sujeitos vão
formando a consciência crítica da necessidade de superar o racismo na sociedade brasileira.
Segundo, ao lutarem pelo território, conflitam e denunciam os latifúndios, a mineração,
o agronegócio, os quais, historicamente, subtraem e expropriam as terras dos povos e
comunidades tradicionais. Do mesmo modo, lutam contra a alienação e a exploração do
trabalho capitalista, na medida em que buscam autonomia e soberania na produção material e
simbólica de suas existências. Assim, se inserem e travam a luta de classes, que acontece
quando, segundo Thompson (1987, p. 10), alguns homens, como resultado de experiências
comuns (herdadas ou partilhadas), sentem e articulam a identidade de seus interesses entre si,
e contra outros homens cujos interesses diferem (e geralmente se opõem) dos seus”.
Foram necessários séculos para o Estado reconhecer o direito territorial das
comunidades quilombolas. Isso ocorreu no processo de redemocratização do Brasil, no
conjunto das formulações e discussões da Constituição de 1988, em que diversas organizações
da sociedade civil pautaram e encaminharam suas reivindicações após duas décadas de
repressão militar.
De acordo com Arruti (2009), a introdução na Constituição Federal do direito dos
quilombos ao território teve como articulador o Movimento Negro Unificado (criado em 1978)
e estudos antropológicos dentro do movimento sobre as comunidades negras rurais. O
resultado, ainda que não satisfatório
9
, foi a incorporação do Art. 68º do ato das disposições
constitucionais transitórias (ADCT), formulando que “aos remanescentes das comunidades dos
quilombos que estejam ocupando suas terras é reconhecida a propriedade definitiva, devendo o
Estado emitir-lhes os títulos respectivos”.
Essa redação ainda não deixava claro quais os critérios e etapas para demarcação e
titulação de um território quilombola, tampouco o que o Estado estava conceituando como
remanescente de quilombo. Somente no Decreto 4.887, de 20 de novembro de 2003, que se
8
Nos referimos a Resolução 8, de 20 de novembro de 2012, que define as Diretrizes Curriculares Nacionais
para a Educação Escolar Quilombola na Educação Básica.
9
Sobre essa questão, ver O’dwyer (2002).
Ramofly BICALHO; Guilherme Goretti RODRIGUES e Pedro Clei Sanches MACEDO
Plurais - Revista Multidisciplinar, Salvador, v. 8, n. 00, e023013, 2023. e-ISSN: 2177-5060
DOI: https://doi.org/10.29378/plurais.v8i00.15401 13
consideram remanescentes das comunidades dos quilombolas os “grupos étnico-raciais,
segundo critérios de autoatribuição, com trajetória histórica própria, dotados de relações
territoriais específicas, com presunção de ancestralidade negra relacionada com a resistência à
opressão histórica sofrida”
10
. Regulamentaram-se também os procedimentos para identificação,
reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas pelos quilombos.
O que se coloca a partir desse Decreto é tanto o critério de autoatribuição, isto é, a
comunidade define, com base em seus elementos sociais e culturais, se deseja ou não ser
reconhecida como remanescente quilombola, quanto à demarcação de seu território, respaldada
nos critérios de territorialidade, que envolve o pertencimento afetivo e o vínculo ancestral ao
território ou, conforme Arruti (2009, p. 119), “todos os espaços que fazem parte de seus usos,
costumes e tradições e/ou que possuem os recursos ambientais necessários à sua manutenção e
às reminiscências históricas que permitam perpetuar sua memória”. Ou seja, possibilita às
comunidades recuperarem os seus territórios perdidos ao longo do processo histórico,
ocasionados pela invasão de fazendeiros, empresários, práticas de grilagem, etc.
Destacam-se dois órgãos fundamentais para a titulação das comunidades quilombolas:
a Fundação Cultural Palmares (FCP), a quem compete o processo de certificação dos
quilombos, atuando como aporte prévio para o Instituto Nacional de Colonização e Reforma
Agrária (INCRA), a quem compete as etapas de identificação, reconhecimento, delimitação,
demarcação e titulação dos territórios quilombolas. Ou seja, para um quilombo ter a titulação
de suas terras, é preciso que se tenha primeiro o certificado emitido pela FCP para,
posteriormente, dar sequência ao processo no INCRA.
Entretanto, o direito conquistado historicamente pelo Movimento Negro e quilombola
sofre com ameaças e retrocessos ainda maiores a partir de 2015, significando uma política de
violência material e simbólica para as comunidades quilombolas. Além das políticas que
citamos anteriormente, o presidente não eleito Michel Temer sancionou o Decreto n.º 8.865 de
2016, que extingue o Ministério de Desenvolvimento Agrário (MDA), passando a atuar como
Secretaria de Agricultura familiar e do Desenvolvimento agrário, vinculado à Casa Civil da
Presidência da República. O INCRA, que se vinculava ao MDA, passou também ser
competência da Casa Civil. Em suma, o fim de uma pasta ministerial significa perda de
importantes recursos públicos destinados às políticas de reforma agrária, colocando em risco a
titulação de novos territórios quilombolas e até mesmo na resolução de conflitos agrários (por
exemplo, entre fazendeiros e assentados).
10
Ver em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto/2003/D4887.htm. Acesso em: 17 nov. 2018.
As lutas sociais populares pelo território quilombola e a questão agrária
Plurais - Revista Multidisciplinar, Salvador, v. 8, n. 00, e023013, 2023. e-ISSN: 2177-5060
DOI: https://doi.org/10.29378/plurais.v8i00.15401 14
Para se ter uma ideia do que isso vem representando, até o ano de 2015, existiam 2.607
comunidades certificadas pela Fundação Cultural Palmares (fora aquelas que ainda estão em
processo de certificação). De acordo com o INCRA, foram tituladas 116 comunidades no
período de 2005 a 2017
11
. Ou seja, quando o assunto envolve a titulação e, portanto,
desapropriação de fazendas, latifúndios etc., o processo demora ainda mais, tanto pelas
interpelações e contestações por parte dos ruralistas, quanto pela própria ameaça sofrida pelas
comunidades quilombolas. São corriqueiros os relatos de ameaça de morte a grupos, sujeitos
ou lideranças que decidem pautar e encaminhar a titulação do território.
Adicionalmente à ausência de investimentos, em fevereiro de 2018, ocorreu uma
decisão significativa do Supremo Tribunal Federal (STF). Este tribunal julgou inconstitucional
a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 3.239, que foi proposta pelo então Partido da
Frente Liberal (PFL), atual Democratas (DEM). Tal ação buscava derrubar o importante
Decreto n.º 4.887/03 que, como mostrado anteriormente, é fundamental para a demarcação e
titulação das terras quilombolas. Na mesma esteira, em curso o Projeto de Emenda
Constitucional (PEC) 215/2000, que tenta transferir a ratificação de territórios indígenas e
quilombolas do executivo para o legislativo. Observando a composição do legislativo
(Congresso Nacional), torna-se evidente que tal projeto desperta interesse tanto da bancada
ruralista quanto do bloco político-partidário conservador.
Ao delinear este panorama do cenário político atual, surge a preocupação com o que se
anuncia nos próximos anos. Essa nova fase do neoliberalismo, caracterizada por reformas no
Estado visando a recuperação dos lucros das grandes empresas diante das crises inevitáveis no
modo de produção capitalista, tem gerado insegurança e prejuízos para a totalidade da classe
trabalhadora, especialmente devido à perda de direitos historicamente conquistados. No âmbito
agrário, a expansão contínua do agronegócio, a abertura de novas fronteiras agrícolas e a
incessante aprovação de fertilizantes ou agrotóxicos têm colocado em risco a biodiversidade e
a sustentabilidade de povos e comunidades tradicionais.
Entretanto, se a realidade anuncia tempos sombrios, cabem àqueles que sofrem
diariamente com as mazelas sociais, com as opressões e preconceitos traçarem suas estratégias
de ação e combate, que passa pelo fortalecimento das inúmeras experiências de lutas sociais
populares, inseridas nos mais diversos contextos e escalas geográficas. Dessa forma, serão
11
Esses dados podem ser consultados nos links: http://www.incra.gov.br/sites/default/files/uploads/estrutura
fundiaria/quilombolas/comunidades-certificadas/comunidades_certificadas_08-06-15.pdf e
http://www.incra.gov.br/sites/default/files/incra-andamentoprocessos-quilombolas_quadrogeral.pdf. Acesso em:
17 nov. 2018.
Ramofly BICALHO; Guilherme Goretti RODRIGUES e Pedro Clei Sanches MACEDO
Plurais - Revista Multidisciplinar, Salvador, v. 8, n. 00, e023013, 2023. e-ISSN: 2177-5060
DOI: https://doi.org/10.29378/plurais.v8i00.15401 15
apresentadas a seguir algumas reflexões que não encerram, mas que delineiam possíveis
trajetórias de esperança, visando a construção de um projeto de sociedade e nação
verdadeiramente emancipado, popular e democrático.
Considerações finais: tecendo e construindo resistências
Nos encontramos atualmente em um momento crucial da história, no qual a ascensão do
ultraconservadorismo e das ideias fascistas globalmente se manifesta em sociedades cada vez
mais intolerantes e governos cada vez mais impopulares e antidemocráticos. Nessa análise, é
imperativo considerar o modo de produção capitalista, que, permeado por suas crises e
contradições, tem sido o eixo propulsor de toda a barbárie e violência. Todavia, o
aprofundamento da desigualdade social e a notória precarização das condições objetivas e
subjetivas de vida não impede que haja a reação e mobilização popular como meio de
contestação e revolta contra o modelo social e político-econômico do capitalismo.
As mobilizações e organizações populares em constante movimento nos revelam
algumas questões centrais. Primeiro, mostra as contradições e profundas desigualdades geradas
pelo capitalismo, que sufoca os trabalhadores e trabalhadoras da cidade e do campo, explorando
ao máximo o trabalho pela mais-valia e privando o acesso à terra, a moradia e tantos outros
direitos essenciais para a dignidade humana. Segundo, em um modo de produção injusto e em
uma sociedade de classes, não cabe conformar ou acreditar que existe conciliação de classes ou
que pelo capitalismo é possível manter os direitos sociais, como muitos movimentos
acreditaram nesses últimos anos no Brasil.
Recuperar o projeto de emancipação humana requer olhar para a realidade como
totalidade, isto é, como o capitalismo estrutura o mundo, reconhecendo, contudo, as
experiências que se constroem no cotidiano, no chão dos que vivem diretamente com as mazelas
e injustiças.
Os movimentos sociais populares, ao longo de sua história de organização e atuação,
emergidos em diversos contextos, possuem uma origem em comum: partilham das experiências
de homens e mulheres sobre determinada situação, refletindo sobre a realidade em que estão
inseridos e tomando consciência da necessidade de transformá-la. Por isso, defende-se que o
movimento social, construído por sujeitos, individuais e coletivos, assume a natureza educativa
e política. Assim, contribui para a elevação da consciência crítica dos sujeitos ao desvelar aquilo
que estrutura a sociedade e o capitalismo.
As lutas sociais populares pelo território quilombola e a questão agrária
Plurais - Revista Multidisciplinar, Salvador, v. 8, n. 00, e023013, 2023. e-ISSN: 2177-5060
DOI: https://doi.org/10.29378/plurais.v8i00.15401 16
No que diz respeito às comunidades quilombolas, objeto deste trabalho, torna-se
evidente a existência de resistências que demandam reconhecimento e fortalecimento. Mesmo
que com retrocessos nos direitos sociais, surgem nos diversos contextos socioespaciais e escalas
geográficas os espaços de contestação e subversão. Essas reivindicações se articulam na
organização coletiva de homens e mulheres, por meio da criação de associações, movimentos,
coletivos, ou seja, locais em que há diálogos e encaminhamentos das demandas populares.
Portanto, refletir sobre os desafios do atual tempo histórico requer estar constantemente
vigilantes e atento para as tramas e decisões políticas no âmbito do Estado, como também
observar as experiências e lutas que o construídas e articuladas no cotidiano e em diversos
espaços. Afinal, o que vem nos ensinando os movimentos sociais populares e como estamos
tomando partido desse processo?
Estar atento e valorizar a formação das massas populares, fortalecendo a direção e o
projeto popular, disputando espaços e territórios são essenciais para construção de um caminho
e horizonte com capacidade histórica de superação das injustiças e desigualdades sociais,
políticas, econômicas e ambientais.
Como adverte Konder (1985, p. 78) “se a história está sendo feita, em medida
inaceitável, pelos outros, então o problema está em passarmos a fazê-la mais decisivamente nós
mesmos”, isto é, tomarmos a posição enquanto sujeitos históricos e termos compromisso com
a práxis. Por isso, torna-se necessário estarmos atentos para os sujeitos, homens e mulheres,
que estão em luta, acumulando e partilhando de experiências em múltiplos contextos e escalas
sociais. Seja nas pesquisas acadêmicas ou na prática política e militante, visibilizar a questão
quilombola é estar comprometido e sensível com uma possibilidade histórico-concreta de
transformação.
Ramofly BICALHO; Guilherme Goretti RODRIGUES e Pedro Clei Sanches MACEDO
Plurais - Revista Multidisciplinar, Salvador, v. 8, n. 00, e023013, 2023. e-ISSN: 2177-5060
DOI: https://doi.org/10.29378/plurais.v8i00.15401 17
REFERÊNCIAS
ALMEIDA, Alfredo Wagner Berno de. Os quilombos e as novas etnias. In: O‟DWYER,
Eliane Cantarino. Quilombos: Identidade étnica e territorialidade. Rio de Janeiro: Editora
FGV, 2002.
ARRUTI, José Maurício. Quilombos. Revista Jangwa Pana, Santa Marta, v. 8, n.1, p.102-
121, 2009. DOI: 10.21676. Disponível em:
https://revistas.unimagdalena.edu.co/index.php/jangwapana/article/view/48/44. Acesso em:
24 set. 2023.
BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
Brasília, DF: Presidência da República, 2016. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccovil_03/Constituicao/Constituicao.htm. Acesso em: 1 jan. 2022.
BRASIL. Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial da
União: seção 1, Brasília, DF, ano 139, n. 8, p. 1-74, 11 jan. 2002. PL 634/1975.
BRASIL. Decreto n. 4.887, de 20 de novembro de 2003. Regulamenta o procedimento para
identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas por
remanescentes das comunidades dos quilombos de que trata o art. 68 do Ato das Disposições
Constitucionais Transitórias. Brasília, DF: Presidência da República, 2003. Disponível em:
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2003/D4887.htm. Acesso em: 24 set. 2023.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal (2. Turma). Recurso Extraordinário 313060/SP. Leis
10.927/91 e 11.262 do município de São Paulo. Seguro obrigatório contra furto e roubo de
automóveis. Shopping centers, lojas de departamento, supermercados e empresas com
estacionamento para mais de cinquenta veículos. Inconstitucionalidade. Recorrente: Banco do
Estado de São Paulo S/A BANESPA. Recorrido: Município de São Paulo. Relatora: Min.
Ellen Gracie, 29 de novembro de 2005. Lex: jurisprudência do Supremo Tribunal Federal,
São Paulo, v. 28, n. 327, p. 226-230, 2006.
COMISSÃO PASTORAL DA TERRA. Conflitos no Campo Brasil 2017. CPT Nacional:
Brasil, 2017.
GOHN, Maria da Glória. Movimentos sociais e educação. 8. ed. São Paulo: Cortez, 2012.
GOMES, Nilma Lino. O Movimento Negro educador: saberes construídos na luta por
emancipação. Petrópolis, RJ: Vozes, 2017.
GUSMÃO, Neusa Maria Mendes de. Terra de uso comum: oralidade e escrita em confronto.
Revista Afro-Ásia, Salvador, n.16, p.116-132, 1995. DOI: 10.9771. Disponível em:
https://periodicos.ufba.br/index.php/afroasia/article/view/20850/13450. Acesso em: 24 set.
2023.
KONDER, Leandro. O que é dialética. São Paulo: Abril Cultura, Brasiliense, 1985.
MARTINS, José de Souza. A militarização da questão agrária no Brasil: Terra e poder: o
problema da terra na crise política. 2. ed. Petrópolis: Vozes, 1985.
As lutas sociais populares pelo território quilombola e a questão agrária
Plurais - Revista Multidisciplinar, Salvador, v. 8, n. 00, e023013, 2023. e-ISSN: 2177-5060
DOI: https://doi.org/10.29378/plurais.v8i00.15401 18
MENDONÇA, Sônia Regina. O Ruralismo Brasileiro (1888-1931). São Paulo: Editora
Hucitec, 1997.
O'DWYER, Eliane Cantarino. Quilombos: Identidade étnica e territorialidades. Rio de
Janeiro: FGV, 2022.
OLIVEIRA, Ariovaldo Umbelino de. Agricultura brasileira: transformações recentes. In:
ROSS, Jurandyr L. Sanches (org.). Geografia do Brasil. 5. ed. São Paulo: EDUSP, 2005
OLIVEIRA; Ariovaldo Umbelino de. Geografia Agrária: perspectivas no início do século
XXI. In: OLIVEIRA, A. U; MARQUES, M. I. M. (org.). O campo no século XXI: Território
de vida, de luta e de construção da justiça social. São Paulo: Ed. Casa Amarela e Ed. Paz e
Terra, 2004.
PANINI, Carmela. Reforma agrária dentro e fora da lei: 500 anos de história inacabada.
São Paulo: Paulinas, 1990.
STEDILE, João Pedro. A questão agrária no Brasil: o debate tradicional 1500-1960. 2.
ed. São Paulo: Expressão Popular, 2011.
THOMPSON, Edward Palmer. A formação da classe operária inglesa. 1. ed. Rio de
Janeiro: Paz e Terra, 1987.
Ramofly BICALHO; Guilherme Goretti RODRIGUES e Pedro Clei Sanches MACEDO
Plurais - Revista Multidisciplinar, Salvador, v. 8, n. 00, e023013, 2023. e-ISSN: 2177-5060
DOI: https://doi.org/10.29378/plurais.v8i00.15401 19
CRediT Author Statement
Reconhecimentos: Não aplicável.
Financiamento: Não aplicável.
Conflitos de interesse: Não há conflitos de interesse.
Aprovação ética: Não foi necessário submeter o trabalho ao comitê de ética.
Disponibilidade de dados e material: Sim.
Contribuições dos autores: O trabalho foi feito de forma coletiva pelos autores, no âmbito
do grupo de pesquisa Educação do Campo, Movimentos Sociais e Pedagogia da Alternância
da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ).
Processamento e editoração: Editora Ibero-Americana de Educação.
Revisão, formatação, normalização e tradução.
Plurais - Revista Multidisciplinar, Salvador, v. 8, n. 00, e023013, 2023. e-ISSN: 2177-5060
DOI: https://doi.org/10.29378/plurais.v8i00.15401 1
POPULAR SOCIAL STRUGGLES FOR QUILOMBOLA TERRITORY AND THE
AGRICULTURAL ISSUE
AS LUTAS SOCIAIS POPULARES PELO TERRITÓRIO QUILOMBOLA E A
QUESTÃO AGRÁRIA
LUCHAS SOCIALES POPULARES POR EL TERRITORIO QUILOMBOLA Y LA
CUESTIÓN AGROPECUARIA
Ramofly BICALHO1
e-mail: ramofly@gmail.com
Guilherme Goretti RODRIGUES2
e-mail: guilhermegoretti.geografia@gmail.com
Pedro Clei Sanches MACEDO3
e-mail: pedroclei@hotmail.com
How to reference this paper:
BICALHO, R.; RODRIGUES, G. G.; MACEDO, P. C. S.
Popular social struggles for quilombola territory and the
agricultural issue. Plurais - Revista Multidisciplinar,
Salvador, v. 8, n. 00, e023013, 2023. e-ISSN: 2177-5060.
DOI: https://doi.org/10.29378/plurais.v8i00.15401
| Submitted: 17/09/2023
| Revisions required: 15/10/2023
| Approved: 11/11/2023
| Published: 20/12/2023
Editors:
Prof. Dr. Célia Tanajura Machado
Prof. Dr. Kathia Marise Borges Sales
Prof. Dr. Rosângela da Luz Matos
Deputy Executive Editor:
Prof. Dr. José Anderson Santos Cruz
1
Federal Rural University of Rio de Janeiro (UFRRJ), Rio de Janeiro RJ Brazil. Associate Professor in the
Department of Education, in the Postgraduate Program in Agricultural Education, and the Postgraduate Program
in Education, Contemporary Contexts, and Popular Demands.
2
Federal Rural University of Rio de Janeiro (UFRRJ), Rio de Janeiro RJ Brazil. Researcher and member of
the Research Group: Rural Education, Social Movements, and Alternation Pedagogy (UFRRJ). Public servant of
the Municipal Government of Matias Barbosa, Minas Gerais MG.
3
Federal Institute of Education, Science, and Technology of Amapá (IFAP), Amapá AP Brazil. Educational
Affairs Technician at IFAP. Member of the Research Group on the World of Work and Professional Education -
GEMEP/IFAP.
Popular social struggles for quilombola territory and the agricultural issue
Plurais - Revista Multidisciplinar, Salvador, v. 8, n. 00, e023013, 2023. e-ISSN: 2177-5060
DOI: https://doi.org/10.29378/plurais.v8i00.15401 2
ABSTRACT: The 1988 Federal Constitution was a milestone for quilombos, regarding
recognition as subjects of rights. However, the reality experienced by quilombos remains
dramatic, both due to the difficulty in the processes of demarcating the territory and in situations
of conflicts, inequalities, and injustices in the Brazilian agrarian issue. Even so, experiences of
struggle for territory emerged, led by the quilombola movement, denouncing and seeking the
implementation of public policies. This article aims to analyze the challenges of the struggle
for quilombola territory and the protagonism exercised by social movements, taking the legal-
parliamentary coup process initiated in 2015 as a historical perspective. It is a methodology
based on the qualitative and quantitative aspects through the theoretical framework and data
that critically analyze the Brazilian agrarian issue and quilombola communities. It concludes
with a reflection on the ongoing challenges for the working class as a whole, which includes
quilombola communities.
KEYWORDS: Agrarian question. Quilombola territory. Social movements. Social politics.
RESUMO: A Constituição Federal de 1988 foi um marco para os quilombos, no que se refere
ao reconhecimento enquanto sujeitos de direitos. Contudo, a realidade vivenciada pelos
quilombos continua dramática, tanto pela dificuldade nos processos de demarcação do
território, quanto nas situações de conflitos, desigualdades e injustiças da questão agrária
brasileira. Mesmo assim, emergem experiências de luta pelo território encaminhadas pelo
movimento quilombola, denunciando e buscando a efetivação de políticas públicas. Este artigo
tem por objetivo analisar os desafios da luta pelo território quilombola e o protagonismo
exercido pelos movimentos sociais, tendo como recorte histórico o processo de golpe jurídico-
parlamentar iniciado em 2015. Como metodologia, pauta-se no aspecto qualitativo e
quantitativo, por meio de referencial teórico e dados que analisam criticamente a questão
agrária brasileira e as comunidades quilombolas. Conclui-se com uma reflexão acerca dos
desafios em curso para o conjunto da classe trabalhadora, em que se inserem as comunidades
quilombolas.
PALAVRAS-CHAVE: Questão agrária. Território Quilombola. Movimentos sociais. Políticas
sociais.
RESUMEN: La Constitución Federal de 1988 marcó un hito para los quilombos, en términos
de reconocimiento como sujetos de derechos. Sin embargo, la realidad que viven los quilombos
sigue siendo dramática, tanto por la dificultad en los procesos de demarcación del território,
como por situaciones de conflictos, desigualdades e injusticias en la cuestión agraria
brasileña. Aun así, surgieron experiencias de lucha por el território, lideradas por el
movimiento quilombola, denunciando y buscando la implementación de políticas públicas. Este
artículo tiene como objetivo analizar los desafíos de la lucha por el território quilombola y el
protagonismo ejercido por los movimientos sociales, tomando como perspectiva histórica el
proceso de golpe jurídico-parlamentario iniciado en 2015. Como medología, se basa em el
aspecto cualitativo y cuantitativo, a través de marcos teóricos y datos que analizan criticamente
la cuestión agraria brasileña y las comunidades quilombolas. Concluye con una reflexión sobre
los desafíos actuales para la clase trabajadora en su conjunto, incluídas las comunidades
quilombolas.
PALABRAS CLAVE: Cuestión agraria. Territorio Quilombola. Movimientos sociales.
Políticas sociales.
Ramofly BICALHO; Guilherme Goretti RODRIGUES and Pedro Clei Sanches MACEDO
Plurais - Revista Multidisciplinar, Salvador, v. 8, n. 00, e023013, 2023. e-ISSN: 2177-5060
DOI: https://doi.org/10.29378/plurais.v8i00.15401 3
Introduction
Quilombos are embedded within the framework of Brazil's social, political, and
economic formation. For centuries, across diverse sociogeographical contexts and realities,
there has been the resistance and existence of the black population as a means of challenging
both the oppression of the colonial slave system and the post-abolition situation of exclusion
and vulnerability. Portrayed as dangerous and subversive to the established social, political, and
economic order, many quilombos faced violent repression by the State and economic elite.
Additionally, in the Brazilian societal imagination, the conception has been formed that
quilombola communities belong to the past, and even when acknowledging their present
existence, they are often condemned under the stereotype of backward groups.
Quilombos have played a fundamentally contributory role in the Brazilian civilizational
process, leaving behind a significant collection and legacy that intertwine material and
immaterial heritage, cultural, religious, and artistic dimensions, as well as values, oral
traditions, memories, knowledge, practices, and worldviews based on collective labor,
exchange, collective effort, and communal land use. Agreeing with Gusmão (1995, p. 124, our
translation), the quilombola territory becomes "synonymous with a set of lived relations,
concrete work, the work of a memory that is conjecturally fabricated; it is a personal and
collective experience, daily relationship, organization, and resistance." This confers a unique
identity, constantly constructed and articulated between past and present. Although each
quilombola community possesses specificity in terms of social, political, and economic
organization, shared material and symbolic elements unite and identify them.
As cautioned by Almeida (2002), it is essential for us to liberate ourselves from the
archaeological definition of quilombo, which perpetuates stereotypes, prejudices, and
dehumanization of quilombola subjects by associating quilombo with the idea of the past,
backwardness, or geographical isolation. Therefore, Almeida (2002) emphasizes the
importance of understanding quilombola communities throughout the historical process and,
particularly, how they assert themselves in the present with new social and cultural dynamics
as a form of ethnic and social existence and resistance.
According to Gomes (2015, p.120, our translation), across various regions, "the various
quilombos which were already true peasant micro-communities continued to reproduce,
migrate, disappear, emerge, and dissolve in the intricacies of peasant forms in Brazil from north
to south." In other words, they constitute a specific part of the totality of peasant forms in Brazil,
Popular social struggles for quilombola territory and the agricultural issue
Plurais - Revista Multidisciplinar, Salvador, v. 8, n. 00, e023013, 2023. e-ISSN: 2177-5060
DOI: https://doi.org/10.29378/plurais.v8i00.15401 4
accumulating experiences, constructing their identities, sharing collective memories, and
passing down knowledge from generation to generation.
Therefore, the quilombola issue is so contemporary and complex that it deserves
understanding in a sensitive reality, especially in the challenges that unfold in both material
dimensions, such as the struggle for land and territory, and symbolic dimensions, through
ethnic-racial and cultural valorization, aiming towards overcoming the stigmas, prejudices, and
racism rooted in our society as a legacy of the colonial-slave system.
Thus, this article results from the developments of research conducted in the research
group "Educação do Campo, Movimentos Sociais e Pedagogia da Alternância (Education in
the Countryside, Social Movements, and Alternation Pedagogy)" at the Federal Rural
University of Rio de Janeiro (UFRRJ). It adopts a theoretical approach, engaging with authors
addressing agrarian and quilombola issues and a quantitative approach, referencing it in the
problematization of agricultural conflicts, focusing on the historical period from 2015 to 2018.
This period is crucial in Brazilian history, marked by profound changes in social, political, and
economic realities, such as the impeachment of former President Dilma Rousseff and the rise
of the far-right and fascist government of Bolsonaro.
Thus, this work presents three central aspects that will be discussed throughout the text.
Firstly, it seeks to analyze the Brazilian agrarian issue, which historically reveals the dramatic
situation in which quilombola communities and other traditional peoples live. The violence and
massacre in rural areas, committed by the ruralist class, violating the Federal Constitution and
Human Rights in favor of projects that prioritize agribusiness, mining, and predatory
extractivism, demonstrate the unsustainability of the capitalist development model for the
countryside, which is exclusionary and unequal.
The second point to be addressed consists of the specific presentation of the panorama
of quilombola communities in the current agrarian reality and context. This examination will
be based on the current political, economic, and social situation, highlighting the post-
parliamentary, legal, and media coup period initiated in 2015. This event, perceived as an
indication of social setbacks, culminated in the rise of a presidential candidate during the 2018
elections in Brazil.
The mentioned candidate expressed a strong affinity with fascist ideas, evident through
the adoption of discourses promoting the elimination of diversities, persecution of minorities,
incitement to violence and hatred, as well as opposition to the plurality of ideas and freedom of
Ramofly BICALHO; Guilherme Goretti RODRIGUES and Pedro Clei Sanches MACEDO
Plurais - Revista Multidisciplinar, Salvador, v. 8, n. 00, e023013, 2023. e-ISSN: 2177-5060
DOI: https://doi.org/10.29378/plurais.v8i00.15401 5
thought. This stance notably contradicts Marxist currents, which have been particularly subject
to criticism and repression in the current context.
Lastly, it is about advocating the importance of strengthening social movements built
by men and women in various situations of social, political, and environmental conflicts.
Unveiling these experiences and the educational and formative actions of these movements are
fundamental conditions for strengthening popular struggles, as they contribute to elevating
critical consciousness among subjects, the subaltern, and the oppressed and propose a project
for a genuinely popular and democratic society.
Social Struggles and the Agrarian Issue
From a historical perspective, the Federal Constitution of 1988 represented a significant
milestone for quilombola communities, especially through the recognition as rights-bearing
subjects by the State. This recognition is evident both in the mandatory titling of territories, as
expressed in Article 68 of the Transitional Constitutional Provisions Act (ADCT), and in the
protection of these groups' material and immaterial cultural heritage through Articles 215 and
216. These achievements marked a new political and social space for quilombos, becoming
visible to the State and civil society, whether in the advocacy for public policies or in addressing
the debate and denunciation of the historically vulnerable and violent situation faced by
quilombos. A Brazilian structure of profound social, political, and economic inequalities
characterizes this situation.
As a result of this mobilization process, Decree No. 4,887, dated November 20, 2003,
was subsequently achieved, which established the criterion of self-attribution for each
quilombola community. In other words, the definition of what constitutes a quilombo is not
determined by the State but by the communities themselves, based on their identity, cultural,
and heritage ties, including the indication of the ancestral territory to be demarcated and titled,
as well as other public policies.
The Brazil Quilombola Program, created in 2004 and later incorporated through Decree
No. 6,261, provides for integrated management for the development of the quilombola social
agenda. It allows actions to consolidate access to land, infrastructure, quality of life, productive
inclusion, local development, and rights and citizenship. Decree No. 5,051, dated April 19,
2004, promulgates Convention 169 of the International Labour Organization (ILO) concerning
the protection and respect for the rights of indigenous and tribal peoples. Decree No. 6,040,
Popular social struggles for quilombola territory and the agricultural issue
Plurais - Revista Multidisciplinar, Salvador, v. 8, n. 00, e023013, 2023. e-ISSN: 2177-5060
DOI: https://doi.org/10.29378/plurais.v8i00.15401 6
dated February 7, 2007, establishes the national policy for the sustainable development of
traditional peoples and communities. Finally, Resolution No. 8, dated November 20, 2012,
defines the National Curriculum Guidelines for Quilombola School Education in basic
education as essential for valuing and respecting the rich contribution of quilombos to the
national civilizational process and advancing the anti-racist struggle.
In his contribution to the Brazilian agrarian issue, Stédile (2011, p. 15, our translation)
defines it as "a set of interpretations and analyses of agrarian reality, seeking to explain how
land ownership, property, use, and utilization are organized in Brazilian society." From a
historical perspective, it can be asserted that what characterizes the Brazilian agrarian reality is
the concentration of land and the formation of land property, often obtained through illegal
mechanisms (invasion, coercion, and land grabbing) orchestrated by government policies that
favor the agrarian ruling class.
Regarding the concentration of land and the formation of land property, it is essential to
recall, for example, the Sesmarias Law (created in Portugal in 1375 and later adopted as an
agrarian policy in colonial Brazil), involving the distribution of large land portions to a grantee,
serving as the foundation for land property formation in the colonial period. On the other hand,
the Land Law of 1850 envisioned land acquisition through a purchase and sale contract, as well
as regularization of already consolidated holdings, maintaining the exclusion of the poorer
layers from land access due to the high prices for acquisition (Panini, 1990).
Such policies facilitated the establishment of monoculture properties intended to supply
the European market through the adoption of an agricultural model favoring predatory
practices. The use of slave labor became a commodity and was essential for the maintenance of
this system (Panini, 1990).
Throughout historical development, during the transitions from Colonial Brazil to the
Empire and subsequently to the Republican period, political and economic ties remained
unchanged, directed towards preserving land property and promoting the interests of the
Brazilian agrarian elite. This reaffirms the persistence of social injustices. Panini (1990)
correlates the marginalization of the poorer layers, devoid of any social prestige, to the
organization and peasant mobilization in Brazil, such as in Canudos (1896), Contestado (1912),
and Cangaço (1870), among others. Similarly, quilombos' critical and emancipatory formation
is understood as resistance and contestation to the political-economic and social model.
This unequal reality regarding the Brazilian agrarian issue permeates and spans various
historical periods. The fundamental element is to understand the agrarian structure as a result
Ramofly BICALHO; Guilherme Goretti RODRIGUES and Pedro Clei Sanches MACEDO
Plurais - Revista Multidisciplinar, Salvador, v. 8, n. 00, e023013, 2023. e-ISSN: 2177-5060
DOI: https://doi.org/10.29378/plurais.v8i00.15401 7
of the mode of production and the established political, economic, and social arrangements in
each situation. In Brazil, the genesis of violence, latifundia, and favoritism towards agrarian
oligarchy persists in the colonial slave model and later in capitalism. As Oliveira (2005, p. 468,
our translation):
In the countryside, the process of capitalist development is equally marked by
the industrialization of agriculture, i.e., the development of typically capitalist
agriculture opened up the historical possibility for landowners and
capitalists/landowners to appropriate capitalist land rent, causing an
intensification in the concentration of the Brazilian land structure.
Even with the emergence of an industrial bourgeoisie in the cities during the first
republican decades and the formation of the first proletarian nuclei, there was no break with the
agrarian structure, nor with the dependent agricultural model (oriented towards exports), with
land property persisting. Concurrently, the ruralist class starts to establish public policies in the
State in favor of its interests
4
. The intensification in the concentration of the Brazilian land
structure mentioned by Oliveira (2005) is evident more recently, both during the Civil-Military
Dictatorship period (1964-1985)
5
, and in the neoliberal stage from the 1990s to the present.
The perpetuation of an agrarian-export model, placing Brazil in a condition of
dependency, along with industrialization in agriculture characterized by increased
mechanization in the field and the use of pesticides, the opening of new agricultural frontiers
posing risks to biomes, flora, and fauna, and the facilitation granted to foreign companies
through economic opening policies, have exacerbated social, environmental, and political
contradictions and conflicts in rural areas.
Agribusiness, along with mining and other large territorial projects (such as
hydroelectric plants), clearly reflects the development agenda adopted by the State and widely
advocated by the ruralist class. It is relevant to emphasize that when referring to ruralists, the
existence of concrete organizations, entities, men and women who formulate policies based on
their interests and integrate them into the state sphere is highlighted. The Brazilian Agribusiness
Association (Associação Brasileira do Agronegócio, ABAG), the National Agriculture Society
4
Take, for example, the creation of the Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio (Ministry of Agriculture,
Industry, and Commerce, MAIC), in 1909. For this discussion, refer to the work of Mendonça (1997), which is
essential for understanding the plots and disputes among classes and factions of the ruralist class to maintain their
political-economic interests.
5
Martins (1985) discusses how the Land Statute of 1964 represented a reform that did not bring about ruptures
with the right to property; on the contrary, it avoided confronting the latifundium and suppressing any
manifestation, organization, and popular resistance that questioned this model.
Popular social struggles for quilombola territory and the agricultural issue
Plurais - Revista Multidisciplinar, Salvador, v. 8, n. 00, e023013, 2023. e-ISSN: 2177-5060
DOI: https://doi.org/10.29378/plurais.v8i00.15401 8
(Sociedade Nacional de Agricultura, SNA), the Brazilian Mining Institute (Instituto Brasileiro
de Mineração, IBRAM), and deputies and senators associated with the agribusiness,
agrochemical, mining sectors, etc., are examples of organizations or individuals who respond
to and serve the interests of the ruralist class.
In this context, the reference period is from 2015 to 2018, marking the parliamentary,
legal, and media coup resulting in the impeachment of then-President Dilma Rousseff and the
assumption of Michel Temer, who implemented unpopular and antidemocratic actions and
measures. Similarly, there is the strengthening of the conservative and fascist spectrum during
the 2018 elections in Brazil, representing a threat to traditional peoples and communities.
In a more general sense, starting in 2015, some policies were approved to favor mainly
sectors associated with ruralists, highlighting their significant representation in the National
Congress. Some of them will be mentioned to demonstrate both the audacity with which the
ruralist class appropriates the State to pass measures that benefit them and to reveal the need to
be vigilant about ongoing policies: Law No. 13,465 of 2017, favors agricultural expansion,
speculation, and land grabbing; Bill No. 4,059 of 2012 relates to land acquisition by foreign
companies; Decree No. 9,406, dated June 2018, regulates mining in Brazil (a demand from
mining companies); Decree No. 9,142 of 2017 extinguished the National Copper Reserve in the
states of Pará and Amapá (Reserva Nacional de Cobre nos Estados do Pará e Amapá, RENCA),
but was revoked by Decree No. 9,159; and Ordinance 1,129, revoked but that weakened the
inspection of conditions similar to slave labor.
The approval of these policies, along with other measures such as labor reform, pension
reform, limitations on public spending in health and education, and ongoing administrative
reform, has contributed to the increase in violence and conflicts in rural areas, as indicated by
the survey conducted by the Pastoral Land Commission (Comissão Pastoral da Terra, CPT)
6
.
This is evident in both land conflicts in terms of the number of incidents (see Table 1) and the
number of murders (see Table 2) from 2008 to 2017.
6
See: https://www.cptnacional.org.br/. Annually, the Pastoral Land Commission (CPT) releases a report on
conflicts in rural areas in Brazil. It is an essential reference document for consultation and reflection, providing
data on agrarian conflicts and articles and texts from researchers dedicated to the topic.
Ramofly BICALHO; Guilherme Goretti RODRIGUES and Pedro Clei Sanches MACEDO
Plurais - Revista Multidisciplinar, Salvador, v. 8, n. 00, e023013, 2023. e-ISSN: 2177-5060
DOI: https://doi.org/10.29378/plurais.v8i00.15401 9
Table 1 Land conflicts (number of incidents)
Source: Pastoral Land Commission (CPT)
Table 2 Total murders in rural areas (per year)
Source: Pastoral Land Commission (CPT)
This increase in conflict and murder rates in rural areas, not to mention conflicts over
water and labor, reveals that the institutionalization of social setbacks, with a high cost for the
entire working class, coupled with the conservative and fascist discourse gaining strength from
2015, has had its repercussions on the Brazilian countryside. Intolerance, impunity, and the
legal support given to the ruralist class foreshadow an extremely challenging future for social
movements fighting for land.
However, what is the role of quilombolas, peasants, and indigenous people in this
process? Up to this point, a brief overview and historical context have been outlined, revealing
Popular social struggles for quilombola territory and the agricultural issue
Plurais - Revista Multidisciplinar, Salvador, v. 8, n. 00, e023013, 2023. e-ISSN: 2177-5060
DOI: https://doi.org/10.29378/plurais.v8i00.15401 10
a perverse and unequal agrarian structure. What are the popular organizations and mobilizations
built by men and women that stand out for their existence and resistance?
Contrary to some literature's claims
7
, capitalism, due to its inherently unequal and
contradictory nature, has not succeeded in incorporating, from the perspective of wage labor
and the demarcation between proletariat and bourgeoisie, nor eliminating quilombolas,
peasants, or indigenous people. On the contrary, there is a growing intensification of social
struggles in rural areas, where projects for society are confronted, identities, differences, and
collective movements in favor of land and territory are strengthened. According to Oliveira
(2004, p. 35, our translation):
The understanding of the role and place of peasants in capitalist society and
Brazil, in particular, is fundamental. Either one understands the issue within
the process of capitalist development in the countryside, or one will continue
to see many authors asserting that peasants are disappearing, but, nevertheless,
they continue to fight to gain access to land in many parts of Brazil.
Despite the Brazilian agrarian structure revealing the backstage cruelty, it is necessary
to unveil the widespread social movements that emerge in this reality and decisively engage in
the political arena as a space of struggle for land (land reform), as well as labor, education, etc.
This is the case with the experiences of the MST, CONAQ, MAB, Via Campesina, and many
other movements that articulate, at various scales, with potentials and local, regional, or national
interventions. Valuing these actions and consolidating them means advancing toward a project
of society that is genuinely popular and democratic, with respect for differences, diversity, and
social and environmental justice.
In this context, the aim is to contribute to the dialogue, focusing on the struggles faced
by quilombola communities regarding the recognition, demarcation, and titling of their
territories. The challenges present in the current conjuncture are analyzed.
7
On this issue, see Oliveira (2004).
Ramofly BICALHO; Guilherme Goretti RODRIGUES and Pedro Clei Sanches MACEDO
Plurais - Revista Multidisciplinar, Salvador, v. 8, n. 00, e023013, 2023. e-ISSN: 2177-5060
DOI: https://doi.org/10.29378/plurais.v8i00.15401 11
The Struggle for Quilombola Territory: Ongoing Policies
The quilombola issue carries its specificities regarding cultural, material, symbolic,
religious, and identity-related aspects, just like any other traditional people or community.
There is no intention to trace a historical line of the quilombo formation process, considering
the already established and widely disseminated contributions of authors such as Almeida
(2002), Arruti (2009), and O'Dwyer (2002). Instead, the aim is to understand how the quilombo
is constructed and organized in the present, as well as to identify the conflicts and challenges
present in the struggle for territory.
From the outset, the importance of the "territory" category is not only understood as a
legal-political delineation but also encompasses symbolic and belonging dimensions that social
groups establish in relation to the place they reside. These dimensions include the bonds of
solidarity and reciprocity formed, as well as the collective use of the land. Ultimately, the
territory is built and rebuilt by individual and collective subjects, being essential for the
reproduction of the material and symbolic life of communities.
Defending the territory as a legitimate right of quilombola communities means fighting
against a past and present of oppression and subalternity in the dimensions of race, class, and
gender. It points us towards overcoming historically created inferiorizing representations and
stigmas that are still present in the Brazilian social imaginary (with reflections, even in school
education). Defending the territory, therefore, involves respecting the civilizational values of
quilombola communities and their rich contribution to Brazil's social, cultural, political, and
economic formation, as well as making significant progress in combating social injustices
present in our agrarian structure.
From this perspective, a fundamental discussion about social movements lies in
analyzing quilombola movements as one of the dimensions of the Black Movement. As Gomes
(2017, p. 23, our translation) points out:
We do not want to get stuck in a vast conceptual discussion about what should
or should not be considered the Black Movement. What matters is
understanding the power of this social movement and highlighting the most
revealing dimensions of its emancipatory, assertive, and demanding character,
which characterize it as an important political actor and educator of
individuals, collectives, and social institutions throughout history and across
diverse generations.
Through their political spaces, Quilombos address and do not dissociate the dimensions
of race and class. Firstly, in the fight against racism, they channel demands centered on the
Popular social struggles for quilombola territory and the agricultural issue
Plurais - Revista Multidisciplinar, Salvador, v. 8, n. 00, e023013, 2023. e-ISSN: 2177-5060
DOI: https://doi.org/10.29378/plurais.v8i00.15401 12
issue of education, from discussions within schools located in the communities (through
quilombola Education as a national curriculum guideline) to university occupations,
strengthening and defending quota policies, and educating professionals in various fields of
knowledge. Along this path, individuals develop a critical awareness of the need to overcome
racism in Brazilian society.
Secondly, they confront and denounce large estates, mining, and agribusiness in their
struggle for territory, which historically subtract and expropriate lands from traditional peoples
and communities. Similarly, they fight against the alienation and exploitation of capitalist labor,
seeking autonomy and sovereignty in their existence's material and symbolic production. Thus,
they engage in and wage the class struggle, which occurs when, according to Thompson (1987,
p. 10, our translation), "some men, as a result of common (inherited or shared) experiences, feel
and articulate the identity of their interests with each other, and against other men whose
interests differ (and usually oppose) theirs."
It took centuries for the State to recognize the territorial rights of quilombola
communities. This only happened in the process of Brazil's re-democratization, within the
formulations and discussions of the 1988 Constitution, where various civil society
organizations advocated and forwarded their claims after two decades of military repression.
According to Arruti (2009), the introduction of the right of quilombos to territory in the
Federal Constitution was orchestrated by the Unified Black Movement (created in 1978) and
anthropological studies within the movement about rural black communities. The
unsatisfactory
8
result was the incorporation of Article 68 of the Transitional Constitutional
Provisions Act (ADCT), formulating that "the remnants of the quilombo communities
occupying their lands are recognized as having definitive ownership, and the State must issue
them the respective titles."
This wording did not clarify the criteria and steps for the demarcation and titling of a
quilombola territory or what the State was conceptualizing as a quilombo remnant. Only in
Decree No. 4,887 of November 20, 2003, did it consider the remnants of quilombola
communities as "ethno-racial groups, according to self-attribution criteria, with their historical
trajectory, endowed with specific territorial relations, with a presumption of black ancestry
related to resistance to historical oppression"
9
. Procedures for identification, recognition,
delimitation, demarcation, and titling of lands occupied by quilombos were also regulated.
8
On this issue, see O'dwyer (2002).
9
See at: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto/2003/D4887.htm. Accessed in: 17 Nov. 2018.
Ramofly BICALHO; Guilherme Goretti RODRIGUES and Pedro Clei Sanches MACEDO
Plurais - Revista Multidisciplinar, Salvador, v. 8, n. 00, e023013, 2023. e-ISSN: 2177-5060
DOI: https://doi.org/10.29378/plurais.v8i00.15401 13
What arises from this Decree is both the criterion of self-attribution, i.e., the community
defines, based on its social and cultural elements, whether or not it wishes to be recognized as
a quilombo remnant, and the demarcation of its territory, supported by criteria of territoriality,
which involves emotional belonging and ancestral ties to the territory or, according to Arruti
(2009, p. 119, our translation), "all spaces that are part of their uses, customs, and traditions
and/or that have the environmental resources necessary for their maintenance and the historical
reminiscences that allow perpetuating their memory." In other words, it enables communities
to recover their lost territories throughout history caused by the invasion of landowners,
businessmen, land-grabbing practices, etc.
Two fundamental organs stand out for the titling of quilombola communities: the
Palmares Cultural Foundation (Fundação Cultural Palmares, FCP), responsible for the
certification process of quilombos, acting as a preliminary support for the National Institute of
Colonization and Agrarian Reform (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária,
INCRA), which is responsible for the stages of identification, recognition, delimitation,
demarcation, and titling of quilombola territories. For a quilombo to have the title to its lands,
it is necessary first to have the certificate issued by the FCP and then proceed with the process
at INCRA.
However, the historically acquired rights by the Black Movement and quilombola
communities faced even more significant threats and setbacks from 2015 onwards, signifying
a policy of material and symbolic violence against quilombo communities. In addition to the
policies mentioned earlier, the unelected President Michel Temer sanctioned Decree No. 8,865
in 2016, which extinguished the Ministry of Agrarian Development (Ministério de
Desenvolvimento Agrário, MDA), transforming it into the Secretariat of Family Agriculture
and Agrarian Development, linked to the Chief of Staff of the Presidency. INCRA, which was
linked to MDA, also became the responsibility of the Chief of Staff. In short, the end of a
ministerial department means the loss of significant public resources allocated to agrarian
reform policies, jeopardizing the titling of new quilombola territories and even the resolution
of agrarian conflicts (for example, between landowners and settlers).
To give an idea of what this has been representing, until 2015, there were 2,607
communities certified by the Palmares Cultural Foundation (aside from those still in the
certification process). According to INCRA, 116 communities were titled from 2005 to 2017
Popular social struggles for quilombola territory and the agricultural issue
Plurais - Revista Multidisciplinar, Salvador, v. 8, n. 00, e023013, 2023. e-ISSN: 2177-5060
DOI: https://doi.org/10.29378/plurais.v8i00.15401 14
10
. In other words, when it comes to titling and, therefore, expropriation of farms, large estates,
etc., the process takes even longer due to challenges and objections from ruralists and the threat
faced by quilombola communities. Threats of death to groups, individuals, or leaders who
decide to advocate for and pursue territory titling are commonplace.
In addition to the lack of investments, a significant decision by the Supreme Federal
Court (Supremo Tribunal Federal, STF) occurred in February 2018. The court deemed
unconstitutional Direct Action of Unconstitutionality (Ação Direta de Inconstitucionalidade,
ADI) 3,239, which was proposed by the then Liberal Front Party (Partido da Frente Liberal,
PFL), currently Democrats (DEM). This action sought to overturn the essential Decree No.
4,887/03, which, as shown earlier, is crucial for the demarcation and titling of quilombola lands.
Along the same lines, there is an ongoing Constitutional Amendment Proposal (PEC) 215/2000,
which attempts to transfer the ratification of indigenous and quilombola territories from the
executive to the legislative branch. Observing the legislature's composition (National
Congress), it becomes evident that this project sparks interest from the ruralist and conservative
political-party bloc.
As we outline this overview of the current political landscape, concern arises regarding
what lies ahead in the coming years. This new phase of neoliberalism, characterized by state
reforms aimed at recovering the profits of large corporations in the face of inevitable crises in
the capitalist mode of production, has generated insecurity and losses for the entire working
class, mainly due to the loss of historically acquired rights. In the agrarian context, the
continuous expansion of agribusiness, the opening of new agricultural frontiers, and the
relentless approval of fertilizers or pesticides have endangered the biodiversity and
sustainability of traditional peoples and communities.
However, if reality portends dark times, those who endure daily social ills, oppression,
and prejudice must devise their own strategies of action and resistance. This involves
strengthening numerous experiences of popular social struggles embedded in various contexts
and geographical scales. Thus, the following reflections are presented not as conclusive but as
delineating possible paths of hope, aiming for the construction of a truly emancipated, popular,
and democratic societal and national project.
10
This data can be consulted at the following links: http://www.incra.gov.br/sites/default/files/uploads/estrutura
fundiaria/quilombolas/comunidades-certificadas/comunidades_certificadas_08-06-15.pdf e
http://www.incra.gov.br/sites/default/files/incra-andamentoprocessos-quilombolas_quadrogeral.pdf. Accessed in:
17 Nov. 2018.
Ramofly BICALHO; Guilherme Goretti RODRIGUES and Pedro Clei Sanches MACEDO
Plurais - Revista Multidisciplinar, Salvador, v. 8, n. 00, e023013, 2023. e-ISSN: 2177-5060
DOI: https://doi.org/10.29378/plurais.v8i00.15401 15
Final considerations: weaving and constructing resistances
We currently find ourselves at a crucial moment in history, where the rise of ultra-
conservatism and fascist ideas is manifesting globally in increasingly intolerant societies and
governments becoming more unpopular and anti-democratic. In this analysis, it is imperative
to consider the capitalist mode of production, which, permeated by its crises and contradictions,
has been the driving force behind all barbarism and violence. However, the deepening social
inequality and the notorious deterioration of objective and subjective living conditions do not
prevent a popular reaction and mobilization as a means of contestation and revolt against
capitalism's social and political-economic model.
The ongoing mobilizations and popular organizations reveal some central issues. First,
they expose the contradictions and profound inequalities generated by capitalism, which stifles
urban and rural workers, exploiting labor to the maximum for surplus value and depriving
access to land, housing, and many other essential rights for human dignity. Second, in an unjust
mode of production and a class-based society, it is not appropriate to conform or believe in
class conciliation or that capitalism can maintain social rights, as many movements have felt in
recent years in Brazil.
Recovering the project of human emancipation requires looking at reality as a whole,
that is, how capitalism structures the world, recognizing, however, the experiences that are built
in everyday life on the ground of those who live directly with hardships and injustices.
Popular social movements, throughout their history of organization and action,
emerging in various contexts, share a common origin: they draw from the experiences of men
and women in a particular situation, reflecting on the reality in which they find themselves and
becoming aware of the need to transform it. Therefore, it is argued that the social movement,
constructed by individual and collective subjects, assumes an educational and political nature.
Thus, it contributes to elevating critical consciousness by unveiling the structures of society and
capitalism.
Regarding quilombola communities, the subject of this work, the existence of
resistances demanding recognition and strengthening becomes evident. Even with setbacks in
social rights, spaces of contestation and subversion emerge in various socio-spatial contexts
and geographical scales. These claims are articulated through the collective organization of men
and women through the creation of associations, movements, and collectiveswhere dialogues
and resolutions of popular demands occur.
Popular social struggles for quilombola territory and the agricultural issue
Plurais - Revista Multidisciplinar, Salvador, v. 8, n. 00, e023013, 2023. e-ISSN: 2177-5060
DOI: https://doi.org/10.29378/plurais.v8i00.15401 16
Therefore, reflecting on the challenges of the current historical moment requires being
constantly vigilant and attentive to the political intricacies and decisions within the State and
observing the experiences and struggles that are constructed and articulated in everyday life
and various spaces. After all, what have popular social movements been teaching us, and how
are we engaging in this process?
Being attentive and valuing the formation of popular masses, strengthening the direction
and popular project, and contesting spaces and territories is essential for building a path and
horizon with the historical capacity to overcome social, political, economic, and environmental
injustices and inequalities.
As Konder (1985, p. 78, our translation) warns, "If history is being made, to an
unacceptable extent, by others, then the problem is in us starting to make it more decisively
ourselves," that is, taking a position as historical subjects and having a commitment to praxis.
Therefore, it is necessary to be attentive to the individuals, men, and women, who are struggling
to accumulate and share experiences in multiple contexts and social scales. Whether in
academic research or political and activist practice, bringing visibility to the quilombola issue
is to be committed and sensitive to a historically concrete possibility of transformation.
REFERENCES
ALMEIDA, Alfredo Wagner Berno de. Os quilombos e as novas etnias. In: O‟DWYER,
Eliane Cantarino. Quilombos: Identidade étnica e territorialidade. Rio de Janeiro: Editora
FGV, 2002.
ARRUTI, José Maurício. Quilombos. Revista Jangwa Pana, Santa Marta, v. 8, n. 1, p.102-
121, 2009. DOI: 10.21676. Available at:
https://revistas.unimagdalena.edu.co/index.php/jangwapana/article/view/48/44. Accessed in:
24 Sept. 2023.
BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
Brasília, DF: Presidência da República, 2016. Available at:
http://www.planalto.gov.br/ccovil_03/Constituicao/Constituicao.htm. Accessed in: 1 Jan.
2022.
BRASIL. Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial da
União: seção 1, Brasília, DF, ano 139, n. 8, p. 1-74, 11 jan. 2002. PL 634/1975.
BRASIL. Decreto n. 4.887, de 20 de novembro de 2003. Regulamenta o procedimento para
identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas por
remanescentes das comunidades dos quilombos de que trata o art. 68 do Ato das Disposições
Ramofly BICALHO; Guilherme Goretti RODRIGUES and Pedro Clei Sanches MACEDO
Plurais - Revista Multidisciplinar, Salvador, v. 8, n. 00, e023013, 2023. e-ISSN: 2177-5060
DOI: https://doi.org/10.29378/plurais.v8i00.15401 17
Constitucionais Transitórias. Brasília, DF: Presidência da República, 2003. Available at:
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2003/D4887.htm. Accessed in: 24 Sept. 2023.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal (2. Turma). Recurso Extraordinário 313060/SP. Leis
10.927/91 e 11.262 do município de São Paulo. Seguro obrigatório contra furto e roubo de
automóveis. Shopping centers, lojas de departamento, supermercados e empresas com
estacionamento para mais de cinquenta veículos. Inconstitucionalidade. Recorrente: Banco do
Estado de São Paulo S/A BANESPA. Recorrido: Município de São Paulo. Relatora: Min.
Ellen Gracie, 29 de novembro de 2005. Lex: jurisprudência do Supremo Tribunal Federal,
São Paulo, v. 28, n. 327, p. 226-230, 2006.
COMISSÃO PASTORAL DA TERRA. Conflitos no Campo Brasil 2017. CPT Nacional:
Brasil, 2017.
GOHN, Maria da Glória. Movimentos sociais e educação. 8. ed. São Paulo: Cortez, 2012.
GOMES, Nilma Lino. O Movimento Negro educador: saberes construídos na luta por
emancipação. Petrópolis, RJ: Vozes, 2017.
GUSMÃO, Neusa Maria Mendes de. Terra de uso comum: oralidade e escrita em confronto.
Revista Afro-Ásia, Salvador, n.16, p.116-132, 1995. DOI: 10.9771. Available at:
https://periodicos.ufba.br/index.php/afroasia/article/view/20850/13450. Accessed in: 24 Sept.
2023.
KONDER, Leandro. O que é dialética. São Paulo: Abril Cultura, Brasiliense, 1985.
MARTINS, José de Souza. A militarização da questão agrária no Brasil: Terra e poder: o
problema da terra na crise política. 2. ed. Petrópolis: Vozes, 1985.
MENDONÇA, Sônia Regina. O Ruralismo Brasileiro (1888-1931). São Paulo: Editora
Hucitec, 1997.
O'DWYER, Eliane Cantarino. Quilombos: Identidade étnica e territorialidades. Rio de
Janeiro: FGV, 2022.
OLIVEIRA, Ariovaldo Umbelino de. Agricultura brasileira: transformações recentes. In:
ROSS, Jurandyr L. Sanches (org.). Geografia do Brasil. 5. ed. São Paulo: EDUSP, 2005
OLIVEIRA; Ariovaldo Umbelino de. Geografia Agrária: perspectivas no início do século
XXI. In: OLIVEIRA, A. U; MARQUES, M. I. M. (org.). O campo no século XXI: Território
de vida, de luta e de construção da justiça social. São Paulo: Ed. Casa Amarela e Ed. Paz e
Terra, 2004.
PANINI, Carmela. Reforma agrária dentro e fora da lei: 500 anos de história inacabada.
São Paulo: Paulinas, 1990.
STEDILE, João Pedro. A questão agrária no Brasil: o debate tradicional 1500-1960. 2.
ed. São Paulo: Expressão Popular, 2011.
Popular social struggles for quilombola territory and the agricultural issue
Plurais - Revista Multidisciplinar, Salvador, v. 8, n. 00, e023013, 2023. e-ISSN: 2177-5060
DOI: https://doi.org/10.29378/plurais.v8i00.15401 18
THOMPSON, Edward Palmer. A formação da classe operária inglesa. 1. ed. Rio de
Janeiro: Paz e Terra, 1987.
CRediT Author Statement
Acknowledgements: Not applicable.
Funding: Not applicable.
Conflicts of interest: There are no conflicts of interest.
Ethical approval: It was not necessary to submit the work to the ethics committee.
Data and material availability: Yes.
Authors' contributions: The authors collectively did the work within the scope of the
research group "Education in Rural Areas, Social Movements, and Alternation Pedagogy
(Educação do Campo, Movimentos Sociais e Pedagogia da Alternância)" at the Federal
Rural University of Rio de Janeiro (UFRRJ).
Processing and editing: Editora Ibero-Americana de Educação.
Proofreading, formatting, normalization and translation.