AS ECOLOGIAS DO SEMIÁRIDO NA TELA DA TV PÚBLICA BRASILEIRA
Fabíola Moura Reis Santos1*; Ernani Machado de Freitas Lins-Neto2; Iluska Maria da Silva Coutinho 3
1Doutora em Ecologia Humana e Gestão Socioambiental, PPGEcoH, Uneb, campus III.
2 Doutor em Biotecnologia, Universidade Federal do Vale do São Francisco, Docente PPGEcoH/UNEB.
3Doutora em Comunicação Social. Universidade Federal de Juiz de Fora.
*Autora para Correspondência: E-mail: fmrsantos@uneb.br.
ORCID: https://orcid.org/0000-0003-3046-3666
Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/6276475685102074
Resumo: O trabalho “As ecologias do Semiárido na tela da TV pública brasileira” analisou a produção noticiosa da TV Caatinga, webtv da Universidade Federal do Vale do São Francisco, exibida na programação da TV Brasil, emissora pública nacional sediada em Brasília. No período analisado, de julho de 2014 a dezembro de 2020, as reportagens da editoria de meio ambiente predominaram nas escolhas feitas pelos editores para serem exibidas em seus telejornais e programas. A questão ambiental relacionada a outras editorias, como a de ecoturismo, também esteve presente nas matérias selecionadas. Os conteúdos que exibiram as ecologias do Semiárido fizeram associações com subtemas como o extrativismo sustentável e a convivência com esses territórios. São produções que não apenas pautam o clima como algo natural, mas também dão visibilidade às tecnologias de vivência no Semiárido de forma ecossustentável, considerando que cada região deve se desenvolver a partir da valorização de suas capacidades e especificidades locais e territoriais. Tais conteúdos elaborados pela TV Caatinga seguem a proposta do Jornalismo Contextualizado com o Semiárido Brasileiro, que exerce um olhar educativo mais amplo e próximo da realidade, sem estereótipos e distorções, considerando todas as especificidades desses territórios. Para avaliar e comparar o conteúdo veiculado na emissora em rede nacional com a versão original enviada, foram utilizados como métodos a análise da materialidade audiovisual e a etnopesquisa contrastiva. O objetivo foi investigar se o material exibido preservou ou não a proposta contextualizada com os territórios semiáridos da versão da TV universitária. Como principal resultado, observou-se que das 18 matérias veiculadas em rede nacional que discutiam o meio ambiente, duas foram parcialmente distorcidas pela TV Brasil e 16 (88,88%) reproduziram a proposta original de abordagem, promovendo uma representação mais próxima da realidade desses territórios, no que diz respeito também às suas ecologias.
Palavras-chave: Jornalismo Contextualizado com o Semiárido Brasileiro; Telejornalismo; Telejornalismo Educativo; Educação; Ecologia Humana.
SEMI-ARID ECOLOGIES ON BRAZILIAN PUBLIC TV SCREEN
Abstract: The work “The ecologies of the Semiarid on the screen of Brazilian public TV” analyzed the newscast production of TV Caatinga, webtv of the Federal University of Vale do São Francisco, shown in the programming of TV Brasil, a national public broadcaster based in Brasília. In the period analyzed, from July 2014 to December 2020, reports from the environment editorship predominated in the choices made by editors to be shown in their TV news and programs. The environmental issue related to other editorials, such as ecotourism, was also present in the selected articles. The contents that exhibited the ecologies of the semi-arid made associations with sub-themes such as sustainable extractivism and coexistence with these territories. These are productions that not only guide the climate as something natural, but also give visibility to the technologies of human experience in the semi-arid in an eco-sustainable way, considering that each region must develop based on the valorization of its capacities and local and territorial specificities. Such contents elaborated by TV Caatinga follow the proposal of Journalism Contextualized with the Brazilian Semiarid Region, which exercises a broader educational look closer to the reality, without stereotypes and distortions, considering all the specificities of these territories. To evaluate and compare the content broadcast on the network station with the original version sent, the analysis of audiovisual materiality and contrastive ethno-research were used as methods. The objective was to investigate whether the exhibited material preserved or not the proposal contextualized with the semi-arid territories of the university TV version. As a main result, it was observed that of the 18 articles aired on national television that discussed the environment, two were partially distorted by TV Brasil and 16 (88.88%) reproduced the original approach proposal, promoting a representation closer to reality of these territories, with regard also to their ecologies.
Keywords: Contextualized Journalism with the Brazilian Semiarid region: Telejournalism; Educational Telejournalism; Education, Human Ecology.
ECOLOGÍAS SEMIÁRIDAS EN LA PANTALLA DE LA TV PÚBLICA BRASILEÑA
Resumen: El trabajo “Las ecologías del Semiárido en la pantalla de la televisión pública brasileña” analizó la producción informativa de TV Caatinga, webtv de la Universidad Federal de Vale do São Francisco, transmitida en la programación de TV Brasil, emisora pública nacional con sede en Brasilia. En el período analizado, de julio de 2014 a diciembre de 2020, los reportajes editoriales ambientales predominaron en las elecciones de los editores para ser mostrados en sus informativos y programas. La cuestión ambiental relacionada con otros ámbitos, como el ecoturismo, también estuvo presente en los artículos seleccionados. El contenido que mostraba las ecologías de la región Semiárida hizo asociaciones con subtemas como el extractivismo sostenible y la convivencia con estos territorios. Se trata de producciones que no sólo consideran el clima como algo natural, sino que también dan visibilidad a tecnologías para vivir el Semiárido de manera eco-sostenible, considerando que cada región debe desarrollarse a partir de la valorización de sus capacidades locales y territoriales. y especificidades. Dicho contenido elaborado por TV Caatinga sigue la propuesta de Periodismo Contextualizado con el Semiárido brasileño, que adopta una mirada educativa más amplia y más cercana a la realidad, sin estereotipos ni distorsiones, considerando todas las especificidades de estos territorios. Para evaluar y comparar los contenidos emitidos en la emisora nacional con la versión original enviada, se utilizaron como métodos el análisis de materialidad audiovisual y la etnoinvestigación contrastiva. El objetivo fue investigar si el material mostrado preservaba o no la propuesta contextualizada con los territorios semiáridos de la versión televisiva universitaria. Como principal resultado, se observó que de los 18 artículos transmitidos en la televisión nacional que discutían el medio ambiente, dos fueron parcialmente distorsionados por TV Brasil y 16 (88,88%) reprodujeron el enfoque original propuesto, promoviendo una representación más cercana a la realidad de estos territorios, con respecto también a sus ecologías.
Palabras clave: Periodismo contextualizado con el Semiárido brasileño; Periodismo televisivo; Periodismo Televisivo Educativo; Educación; Ecología humana.
INTRODUÇÃO
Por serem parte do nosso cotidiano, assuntos relacionados à natureza e a nossa relação com o meio ambiente merecem também ser debatidos de forma ampla e educativa pela imprensa.
Limitar-se à pauta da denúncia, com uma abordagem sensacionalista e alarmista, sem buscar soluções e orientações para a sociedade, não contribui para a resolução das questões ecológicas que afetam todos nós.
Ao contrário das coberturas mais focadas no espetáculo e em busca da audiência a qualquer custo, a abordagem educativa se preocupa em comunicar soluções individuais e coletivas, institucionais e comunitárias, que colaborem para encontrar a saída para os problemas ambientais.
Esse fazer jornalístico de forma educativa já é experimentado também nas pautas sobre o meio ambiente pela TV Caatinga, TV via [1]web da Universidade Federal do Vale do São Francisco - Univasf, sediada em Petrolina, no Semiárido pernambucano e com outros campi em municípios de Pernambuco, Bahia e Piauí.
Essas produções são enviadas para emissoras parceiras de televisão que publicam as matérias da TV da Univasf em rede nacional.
O estudo apresentado neste trabalho objetivou analisar como a emissora pública TV Brasil, uma dessas emissoras parceiras, exibiu as reportagens da editoria Meio Ambiente produzidas pela TV Caatinga, de 2014 a 2020.
Os conteúdos elaborados pela TV universitária seguem a proposta de um olhar educativo mais abrangente e mais próximo da realidade do Semiárido brasileiro (SAB), sem estereótipos e distorções, considerando todas as especificidades desses territórios presentes em dez estados e duas regiões do Brasil: proposta do Jornalismo Contextualizado com o Semiárido brasileiro - JCSAB (Santos, 2018).
Numa área científica de tradição plural, como a Ecologia Humana (Pires, 2011, p.11), a abordagem pluridisciplinar favorece o conhecimento do funcionamento dos sistemas socioecológicos que, por sua vez, contribui para o desenvolvimento sustentável.
O entendimento sobre os impactos causados pelas ações humanas é o primeiro passo para intervenções de políticas ambientais, uma vez que “as questões associadas à participação dos cidadãos e à dinâmica sociotécnica dos processos de decisão merecem igualmente, por parte da ecologia humana, um estatuto privilegiado de estudo” (Pires, 2011, p.11).
Com reportagens que priorizam as singularidades dos territórios semiáridos, a TV Caatinga pretende contribuir para essa compreensão de maneira clara e educativa. Dessa forma, ao observar os conteúdos da TV universitária exibidos na programação jornalística da TV Brasil, TV pública nacional sediada em Brasília - Distrito Federal e gerida pela Empresa Brasil de Comunicação – EBC, este trabalho verificou como essas produções foram utilizadas em nível nacional.
No período analisado, de julho de 2014 a dezembro de 2020, as reportagens da editoria Meio Ambiente predominaram nas escolhas dos editores da TV Brasil para exibição nacional em seus telejornais e programas. Avaliou-se ainda se o material exibido preservou ou não a proposta contextualiza com os territórios semiáridos da versão da TV universitária.
Como principal resultado, observou-se que, embora distorções parciais tenham sido encontradas na apresentação de algumas reportagens, os jornalistas responsáveis pela seleção dos conteúdos para exibição tenderam em 88,88% dos casos, a reproduzir a proposta de abordagem do JCSAB.
O estudo apresentado neste trabalho objetivou analisar como a emissora pública TV Brasil, uma das emissoras parceiras da TV Caatinga, exibiu as reportagens da editoria Meio Ambiente produzidas pela TV da Universidade Federal do Vale do São Francisco, de 2014 a 2020.
O conteúdo foi avaliado por meio da análise da materialidade audiovisual (Coutinho, 2016). A etnopesquisa contrastiva (Macedo, 2018) foi utilizada de forma transversal em todo o estudo para a reflexão analítica dos dados encontrados.
Inicialmente analisou-se os relatórios de exibição dos conteúdos da TV Caatinga publicizados na TV Brasil e registrados pela TV universitária, desde a primeira veiculação em rede nacional em julho de 2014, até dezembro de 2020.
Os dados coletados no relatório foram documentados por conteúdo em uma ficha de análise com 10 itens, elaborada para este estudo. São eles: 1. Retranca/título; 2. Emissora; 3. Data; 4. Programa; 5. Disponível na internet ou arquivo do centro de documentação (parceira); 6. Cabeça [2] e/ou descrição no site; 7. Formato do conteúdo (matéria, stand-up[3], entrevista, giro, apenas imagens/sonoras); 8. Duração do conteúdo; 9. Alterações do conteúdo e 10. Editoria.
As informações registradas na ficha referentes ao texto de apresentação do produto e ao conteúdo exibido, foram comparadas com o material original produzido pela TV universitária da UNIVASF. A ficha de análise incluiu ainda se cada produção sofreu algum tipo de distorção e/ou alteração com relação a abordagem contextualizada com o Semiárido.
Nesse item, a intenção foi observar se o conteúdo original, desde a cabeça à matéria em si, teve modificações de tempo e/ou sentido que ocasionassem a distorção da proposta de abordagem contextualizada com o Semiárido brasileiro (Santos, 2018).
Aqui cabe ressaltar que os conteúdos da TV Caatinga se caracterizam pelo aprofundamento das temáticas de forma educativa, o que resulta em reportagens e entrevistas mais longas que o tempo praticado no telejornalismo.
Portanto, existia a expectativa de que grande parte dos conteúdos sofreria uma eventual redução de tempo para se adequar à duração dos programas da emissora parceira.
De maneira geral, para quantificar cada material como um todo, quando houve mudança no sentido contextualizado com o Semiárido brasileiro de até 50% do texto da cabeça e/ou do conteúdo exibido, a distorção do produto foi considerada parcial. Se as mudanças de sentido na cabeça e/ou conteúdo ultrapassaram a marca de 50%, o produto foi classificado como totalmente distorcido.
A avaliação dos conteúdos se baseou na análise da materialidade audiovisual, um método que permite a elaboração de estudos científicos sobre o jornalismo televisivo que utiliza a unidade texto+som+imagem+tempo+edição como objeto de avaliação, “sem perder de perspectiva suas especificidades como produto e experiência social” (Coutinho, 2016, p. 02).
A etnopesquisa contrastiva perpassou por todas essas etapas, confrontando "sentidos e significados como dispositivo de objetivação multiexperencial e transingular" (Macedo, 2018, p. 90). Uma pesquisa que buscou uma intercrítica generativa baseada, conforme orienta o autor, numa interpretação formada pelo "encontro entre opiniões, pontos de vista e definições de situações".
A TV Brasil é uma TV pública nacional, sediada em Brasília-Distrito Federal, gerida pela Empresa Brasil de Comunicação - EBC.
A parceria da TV Brasil com a TV Caatinga começou em 18 de julho de 2014, com a exibição de reportagens em programas como Repórter Brasil (tarde e noite), Fique Ligado, Programa Visual (voltado para o público com algum tipo de deficiência física), Paratodos e Stadium, produção esportiva da emissora.
Foram exibidas 83 matérias da TV Caatinga na TV Brasil no período observado de 2014 a 2020, sendo 15 em 2014, 9 em 2015, 4 em 2016, 35 em 2017, 14 em 2018, e 6 em 2019. Em 2020 não houve registro de exibição.
Porém, nem todo o conteúdo registrado no relatório de exibição da TV Caatinga tinha o link da publicação e não foi possível recuperar os conteúdos em sua totalidade, pois nem a própria TV Brasil, após solicitação, conseguiu localizar todo o material em seus centros de documentação.
Ao analisar o conteúdo da TV universitária da UNIVASF localizado e exibido pela TV Brasil (um total de 59 matérias), o primeiro elemento que observamos foi a predominância da editoria de Meio Ambiente nas reportagens selecionadas. Foram 15 matérias ao longo do período estudado em que o tema foi pautado, com algumas associações a subtemas como extrativismo sustentável e convivência com o Semiárido.
A questão ambiental também apareceu em outras editorias como a de Turismo, com uma reportagem sobre o ecoturismo em Paulo Afonso, no sertão da Bahia, que abordou roteiros de contemplação nas paisagens da cidade (2014). Essa reportagem foi exibida duas vezes em dois programas diferentes da emissora.
Já na editoria de Agricultura, uma matéria pautou a produção de vinhos orgânicos no Vale do São Francisco, destacando os benefícios do produto para o meio ambiente, a saúde do trabalhador e dos consumidores.
Entre os temas abordados na editoria Meio Ambiente, questões variadas como reciclagem, reaproveitamento de água, esgotos clandestinos, espécies da fauna e flora da caatinga e degradação de cavernas mostraram os desafios atuais e a diversidade temática que esses territórios impõem à cobertura jornalística. Temas que quase sempre são ignorados pela retratação única do Semiárido consolidada na mídia, o que acaba colaborando com a falta de informação e a desinformação que perduram sobre esses territórios.
Entre as produções realizadas pela TV universitária da UNIVASF, algumas se destacam. Em uma das séries de reportagem da TV universitária exibida em rede nacional pela TV Brasil, o assunto foi o extrativismo sustentável do coquinho fruto do licuri, espécie nativa da caatinga (2014).
Numa sequência de três matérias, a TV universitária mostrou a coleta do coco do licuri, realizada por mulheres da comunidade, além dos diversos usos da espécie e o trabalho da cooperativa que promove a atividade tradicional em municípios da região de Capim Grosso, na Bahia. A série demonstrou que é possível gerar renda com a atividade extrativista, sem predação nem destruição da natureza.
A matéria que abordou a tecnologia de captação e armazenamento de água no Semiárido serviu como modelo para outras regiões do país que também passam pela estiagem:
E a experiência do povo sertanejo que vive no Semiárido nordestino pode ajudar grandes centros urbanos que enfrentam problemas provocados pela estiagem. Lá são aplicadas várias tecnologias de captação, armazenamento e utilização racional da água (TV Brasil, 2014).
O exemplo de uso de cisternas para o consumo humano, para produção de alimentos e para os animais, registrado na reportagem, demonstra as possibilidades de convivência-vivência com o clima e respeito ao ambiente natural.
Uma produção que não apenas pautou a questão climática como algo natural, sem recorrer à narrativa da seca e da inviabilidade, como também deu visibilidade às tecnologias de vivência nesses territórios de forma ecosustentável, considerando que cada região deve se desenvolver a partir da valorização das suas capacidades e especificidades locais e territoriais (Sachs, 2009).
Em algumas matérias selecionadas, observa-se uma redução do tempo da versão original para o conteúdo se adequar à duração do telejornal da TV Brasil. Na reportagem especial sobre o recolhimento sustentável de abelhas na zona urbana de Juazeiro (2017), por exemplo, a produção do programa Meu Ambiente da TV Caatinga com 6’27’’ (6 minutos e 27 segundos) de duração, foi reeditada para 4’08” (4 minutos e 8 segundos).
Esse corte de 35,92% no tempo da matéria, no entanto, não comprometeu as informações do projeto que, na ocasião, atendia 15 apicultores com capacitações e doações dos insetos capturados, além dos benefícios do resgate de enxames para a natureza e comunidade. A ideia central da iniciativa foi preservada, assim como os sentidos da abordagem jornalística contextualizada com o Semiárido.
Já na reportagem sobre os riachos urbanos da cidade de Juazeiro (2017), o corte de 69,41% na duração comprometeu o conteúdo de forma a distorcer parcialmente a abordagem contextualizada com o SAB. Em mais uma produção do programa Meu Ambiente, a matéria de 7’18 (7 minutos e 18 segundos), que foi reduzida para 2’14” (2 minutos e 14 segundos), mostrou o problema ambiental da transformação dos riachos urbanos em canais de esgoto que deságuam no rio São Francisco.
A versão original da reportagem especial enfatizou ainda o problema de saúde pública causado pela falta de saneamento, porém a proposta educativa que norteia o Jornalismo Contextualizado com o Semiárido foi retirada do conteúdo reeditado, uma vez que as prováveis soluções para o problema não foram destacadas na exibição da TV Brasil.
Em uma matéria sobre o rio São Francisco, podemos comparar a diferença de abordagem no destaque do texto que anuncia o conteúdo.
Embora o nível do lago de Sobradinho não seja o ideal, está satisfatório. A maior preocupação agora é com a possibilidade de os rejeitos da barragem em Brumadinho, em Minas Gerais, chegarem à Bacia do São Francisco (TV Caatinga, 2019).
O rio Paraopeba, profundamente atingido por essa tragédia de Brumadinho, é um dos principais afluentes do Rio São Francisco. O medo agora é que o Velho Chico seja contaminado por metais pesados. Um drama a mais para um rio que já sofre com a seca (TV Brasil, 2019, grifo nosso).
Na cabeça da versão original, há uma provocação sobre o risco de contaminação do rio. No texto modicado pela emissora parceira, que recorreu à adjetivação, a palavra drama e a frase feita “sofre com a seca”, reproduzem a história única da narrativa sobre o Semiárido. Uma distorção parcial da abordagem contextualizada sobre os territórios semiáridos.
Em termos numéricos, das 18 matérias exibidas e avaliadas das editorias Meio Ambiente, Turismo e Agricultura, 2 distorceram de alguma forma a proposta da versão original.
O comprometimento apareceu em uma cabeça, mas com os sentidos abordados na reportagem mantidos, ainda que o tempo tenha sido reduzido para se adequar ao telejornal onde o conteúdo foi publicado. A distorção parcial também foi identificada na redução de uma reportagem especial, com um corte na duração de 69,41% que comprometeu a abordagem educativa do JCSAB.
Porém, em 16 conteúdos analisados relacionados ao meio ambiente, a TV Brasil preservou a abordagem contextualizada com o Semiárido brasileiro das produções enviadas pela TV Caatinga, tanto na cabeça quanto na matéria. Sendo assim, a avaliação dos conteúdos publicados em rede nacional pela emissora pública demonstrou que houve uma adesão de 88,88% à representação mais próxima da realidade desses territórios, sem distorções.
Ao avaliar o conteúdo da editoria Meio Ambiente produzido pela TV Caatinga, selecionado e exibido em rede nacional pela TV Brasil, além de outras editorias que pautaram a discussão ambiental, observa-se uma variedade de subtemas relacionados às ecologias do Semiárido.
Durante o período observado, de 2014 a 2020, matérias sobre extrativismo sustentável, convivência-vivência com o Semiárido, sobre reciclagem, espécies da caatinga e reaproveitamento de água, só para citar algumas, mostraram para todo o país a diversidade ambiental e os problemas que a natureza desses territórios ainda enfrenta.
Degradação, desequilíbrio e falta de estrutura básica, que atingem diretamente as populações que aí vivem, foram pautados. Questões que ultrapassam a esfera do ambiental para também comprometer o social e a saúde humana.
E ainda, as editorias de Turismo e Agricultura abordaram a questão meio ambiente em conteúdos sobre ecoturismo e a produção orgânica.
Além disso, todas as reportagens da TV Caatinga seguem a proposta educativa do Jornalismo Contextualizado com o Semiárido brasileiro, numa abordagem sem distorções, estereótipos ou desinformação sobre esses territórios.
Dessa forma, das 18 matérias da TV Caatinga exibidas em rede nacional que discutiram o meio ambiente, duas foram distorcidas parcialmente pela TV Brasil. O comprometimento na abordagem contextualizada com o SAB se deu tanto na cabeça, com a utilização de um enunciado que reforça a narrativa recorrente do sofrimento causado pelo “drama da seca”, quanto no conteúdo, com o corte excessivo de informações que limitou a proposta educativa da matéria.
Embora a redução na duração das reportagens da TV Caatinga tenha sido recorrente na TV Brasil, nem sempre a reedição dos conteúdos comprometeu os sentidos da versão original. De maneira predominante, os cortes foram realizados para a matéria se adequar ao tempo disponível nos telejornais, uma vez que as reportagens da TV universitária da Univasf se caracterizam pela longa duração e o aprofundamento dos assuntos.
Por fim, em 88,88% dos conteúdos produzidos pela TV Caatinga e exibidos pela TV Brasil (16 matérias), a proposta do Jornalismo Contextualizado com o Semiárido foi mantida, promovendo uma representação mais próxima da realidade desses territórios, no que se refere também às suas ecologias. Um exemplo da possibilidade e potencial de uma emissora de natureza pública de veicular conteúdos educativos.
A preferência por esse tipo de programação na televisão de caráter público é naturalmente esperada pela audiência, uma vez que na experiência e imaginário brasileiro, a TV pública tem compromisso com a educação, considerando que as primeiras emissoras públicas foram as TVs educativas. Sendo assim, é importante consolidar o investimento em conteúdos que promovam uma reflexão não comercial das mais variadas temáticas, que possibilitem visões emancipatórias a partir da educação e que promovam uma vivência ecosustentável no planeta.
Coutinho, I. (2016). O telejornalismo narrado nas pesquisas e a busca por cientificidade: A análise da materialidade audiovisual como método possível. In: Anais XXXIX Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação, 2016, São Paulo, SP. Anais eletrônicos... São Paulo, Brasil: USP. Disponível em: <http://portalintercom.org.br/anais/nacional2016/resumos/R11-3118-1.pdf> Acesso: 01 jan 2021.
Macedo. R. S. Pesquisa contrastiva e estudos multicasos: da crítica à razão comparativa ao método contrastivo em ciências sociais e educação. Salvador: EDUFBA, 2018.
Pires, I. M.; Craveiro, J. L. Ética e prática da ecologia humana: questões introdutórias sobre a ecologia humana e a emergência dos riscos ambientais. Lisboa: Apenas Livros, 2011.
Sachs. I.; Vieira. P. F. (Org). Rumo à ecossocioeconomia: teoria e prática do desenvolvimento. São Paulo. Cortez. 2009.
Santos, F. M. R. O sertão que a TV não vê: o Jornalismo Contextualizado com o Semiárido Brasileiro. Teresina: EDUFPI, 2018.
TV Brasil. Brumadinho: Velho Chico também pode ser contaminado por metais pesados, Repórter Brasil, Petrolina-PE, abril, disponível em <https://tvbrasil.ebc.com.br/reporter-brasil/2019/02/brumadinho-velho-chico-tambem-pode-ser-contaminado-por-metais-pesados>. Acesso: dez. 2020.
TV Brasil. Tecnologia de captação de água no semiárido nordestino pode ajudar locais que passam por estiagem, Repórter Brasil, Juazeiro-BA, out, disponível em < https://tvbrasil.ebc.com.br/reporterbrasil/bloco/tecnologia-de-captacao-de-agua-no-semiarido-nordestino-pode-ajudar-locais-que >. Acesso: dez. 2020.
Revista Ouricuri, Juazeiro, Bahia, v.14, n. Edição Especial - 02. 2024, p.03 - 18. Jul./dez., http://www.revistas.uneb.br/index.php/ouricuri | ISSN 2317-0131
[1] http://rtvcaatinga.univasf.edu.br/
[2] Texto narrado pelo apresentador do telejornal ou programa televisivo para anunciar o conteúdo que será exibido a seguir.
[3] Participação pré-gravada do repórter, no formato de um breve boletim.