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REPRESENTAÇÕES DA PESCA ARTESANAL NA BAÍA DE TODOS OS SANTOS: ditos e não-ditos em um panorama comunicacional  

 

Patrícia Carla Smith Galvão; Emerson dos Santos Purificação; Mariana Pinto Miranda

 

1Pós Doutora em Ciências da Comunicação (UBI/Portugal), Doutora em Cultura e Sociedade (IHAC/UFBA).

2Graduado em Licenciatura em Ciências Biológicas (UNEB). Técnico em meio ambiente pelo Centro Territorial de Educação Profissional do Recôncavo (CETEP).

3Doutoranda em Comunicação pelo Departamento de Pós-Graduação em Comunicação e Cultura da Universidade Federal da Bahia (UFBA). Mestra em Comunicação e Estudo da Mídia pela Universidade Nova de Lisboa (UNL).

*Autor correspondente E-mail: pgalvao@uneb.br

ORCID: https://orcid.org/0000-0001-9312-5125

 

RESUMO: O escrito aborda reflexões acerca da pesca artesanal na Baía de Todos os Santos na perspectiva do aporte do campo da Comunicação Social ao projeto interdisciplinar intitulado Embarcados. Estas reflexões partem da observação participante no campo de pesquisa e buscam complementos à compreensão e crítica da realidade social a partir da Análise do Discurso do corpus textual selecionado, em recorte, de um conjunto muito maior de textos sobre o tema da pesquisa, veiculado na internet. Os subtemas emergentes em cada campo representacional, a saber: científico, governamental e socioeconômico, analisados em suas formações discursivas, e evidenciados por tipos de narração e valores que enunciam sentidos e representações da pesca na Baía de Todos os Santos, possibilitaram acessar aspectos histórico-ideológicos indicadores das dinâmicas, sobretudo econômicas, que atravessam as configurações sociais estudadas.  

 

Palavras-chave: Análise do Discurso; pesca na Baía de Todos os Santos; pesquisa qualitativa multimétodo; crítica à realidade social.

 

 

 

REPRESENTACIONES DE LA PESCA ARTESANAL EN LA BAHÍA DEL TODOS LOS SANTOS: dichos y no-dichos en un panorama comunicacional  

 

Resumen: El escrito aborda reflexiones sobre la pesca artesanal en la Bahía de Todos los Santos desde la perspectiva del aporte del campo de la Comunicación Social al proyecto interdisciplinario Embarcados. Estas reflexiones se originan en la observación participante en el campo de investigación y buscan complementos a la comprensión y crítica de la realidad social a partir del Análisis del Discurso del corpus textual seleccionado dentro de un conjunto mucho mayor de textos sobre el tema de investigación, publicados en internet. Los subtemas emergentes en cada campo representacional, a saber: científico, gubernamental y socioeconómico, analizados en sus formaciones discursivas, y evidenciados por tipos de narración y valores que enuncian significados y representaciones de la pesca en la Bahía de Todos los Santos, posibilitaron acceder a aspectos histórico-ideológicos indicadores de las dinámicas, especialmente económicas, que pasan por las configuraciones sociales estudiadas.

 

Palabras clave: Análisis del Discurso; pesca en la Bahía de Todos los Santos; investigación cualitativa multimétodo; crítica de la realidad social.

 

 

INTRODUÇÃO

 

A visita de campo ocorreu num dia de sábado, pouco antes das 10h, quando ainda havia grande público nas redondezas e no Mercado Popular do Peixe[1]. Estacionamos. Perguntei ao “guardador”[2] qual o dia de maior movimento no mercado, se seria mesmo o sábado o dia preferido pelo público para frequentar o estabelecimento. Ele informou que o maior movimento ocorre às terças-feiras e que considerava estar bastante movimentado naquele sábado pela proximidade da Semana Santa, quando muitos soteropolitanos buscam peixe para suas refeições celebrativas. Além de muitos carros estacionados nos locais reservados para este fim, havia muitos pedestres nas calçadas, compradores e vendedores ambulantes, além do pessoal da fiscalização pública (Limpurb).

Especialmente na zona central da capital da Bahia, já que “Em Salvador podemos, em dez minutos, estar em dois, três, quatro séculos diferentes e todos parecerem genuínos”, conforme afirma Stefan Zweig em citação descrita por Milton Santos (2012, p. 102), a área é de composição arquitetônica muito diversa: conformada pelo Largo de Água de Meninos, pela via principal, Av. Jequitaia, e outra via lateral - de confluência com a ladeira da Água Brusca -, aquela que passa à frente do Mercado, bordeando as edificações que se localizam já na encosta (escarpa) de Salvador, paralela ao viaduto e túnel que dão acesso à Via Expressa, ligando a região portuária ao principal acesso de saída rodoviária da capital baiana. No local, notamos uma dinâmica centralizada na comercialização de peixes e de mariscos que envolve o equipamento do Mercado, mas também outras edificações à sua direita, numa bifurcação, subindo a ladeira da Água Brusca, ou na continuidade da rua de acesso ao Mercado, com três ou quatro grandes lojas - aparentemente especializadas na venda de camarão - localizadas em antigos casarões, na saída da avenida Jequitaia, na altura da Igreja da Trindade. Sobretudo estas lojas parecem vinculadas a empreendimentos de feição empresarial de alto custo: da parte visível dos imóveis, notamos grandes câmaras frigoríficas e vãos para o acesso de caminhões frigoríficos transportadores de volume significativo de mercadorias, garagem com veículos de alto valor estacionados; os casarões constituem-se, provavelmente, patrimônio histórico material, que frequentemente requer obras de restauro e manutenção, nesse caso, também de adaptação de uso.

Além de uma dinâmica que envolve atores “satélites”[3] à frente dessas lojas, no interior do Mercado, a disposição dos boxes obedece a seis corredores, sendo os quatro centrais com boxes distribuídos em ambos os lados, dispostos perpendicularmente às três portas principais da edificação. A placa de sinalização interna do Mercado refere-se a boxes de “atacadistas”. As duas filas mais centrais possuem boxes de melhor infraestrutura onde se encontrava o maior número de clientes, enquanto as filas nas extremidades da direita e da esquerda mantinham-se esvaziadas, ao ponto de a última fila da direita possuir apenas os dois primeiros boxes em funcionamento, embora destinados à oferta de refeições prontas (marmitas), e nenhum boxe para a venda de peixe ou mariscos.

Também à entrada, à direita, havia um pequeno restaurante, com cardápio variado, de moqueca de peixe à feijoada, e algumas mesas de bares que estavam todas ocupadas por clientes; à esquerda, logo após o portão de entrada, havia uma barraca de feira que vendia temperos, camarão seco, limão, dendê, leite de coco e outros itens associados às receitas da culinária baiana que têm no peixe e nos mariscos seus ingredientes principais; e na última fila à esquerda, dois ou três boxes com poucos produtos, mas justamente aqueles passíveis de serem retirados das águas da Baía de Todos os Santos.

Olhando aquelas últimas filas nas extremidades direita e esquerda do mercado, nas quais havia boxes vazios, notamos que estes foram entregues apenas com a pia; aqueles em plena utilização se diferem pela qualidade (se mais novo, estado da pintura, higiene, etc.) do balcão refrigerado onde os produtos são apresentados, dos isopores, das caixas de acondicionamento dos pescados e dos instrumentos de corte e tratamento do peixe, além das vestimentas dos vendedores ocupantes do boxe (camisas padronizadas) e dos materiais informativos disponibilizados aos clientes. Também, e principalmente, da qualidade e do aspecto visual – inclusive da apresentação - dos pescados.

Em relação aos donos dos boxes, surgiram as seguintes questões: estariam lá, ou apenas os seus “funcionários”? Numa possível relação de terceirização com aqueles vendedores em atuação nos boxes, como se configura essa relação, e por quais instrumentos formais ou informais? Em relação aos vendedores ou possíveis intermediários do pescado (aqueles que vendem o peixe, mas não o pescam), seriam pessoa física ou pessoa jurídica? 

As inovações verificadas no mercado vão desde formas de apresentação dos produtos, incluindo os chamarizes diferenciais na demonstração destes, nos gestos performáticos de corte e tratamento de peixe, até a presença de jovens mulheres que abordam os clientes para perguntar sobre quais produtos desejam e indicá-los nas vitrines, ou o uso de novas tecnologias midiáticas de suporte à propaganda e venda (rótulos com QRCode, links para páginas de Instagram etc.), como também os velhos cartões de visita, mas que nem todos os boxes disponibilizam aos clientes. Mas qual a logística necessária à oferta do peixe e do marisco ali, no mercado? Qual a origem daqueles diversos produtos e quais relações de produção envolvem? Em quais territórios estas dinâmicas se realizam?

Nestes boxes centralizados, os peixes encontravam-se acomodados ou eram transportados em caixas plásticas com nomes impressos, de várias empresas ou localidades: AcquaChile[4], Rio Una, Valença, Deiró Pescados, entre outros. A despeito destas “pistas”, ao serem perguntados, raramente os vendedores sabiam informar a procedência dos peixes e mariscos que estavam vendendo. Nesse sentido, foi notado que o maior número de espécies, sobretudo aquelas de maior valor agregado, comercializadas pelos boxes centralizados e com maior fluxo de clientes, não são espécies encontradas na Baía de Todos os Santos - BTS.

Qual é a configuração existente na BTS, ou externa a esta, que pode ter levado à diversificação da origem dos recursos pesqueiros no principal Mercado de peixes da cidade? Uma mudança ocorrida no mercado consumidor (“elitização”) passa a suscitar novos produtos não produzidos ou produzidos em escala insuficiente pela BTS, surge como hipótese.

As diferenças entre peixes e mariscos encontrados na BTS e os vindos de fora se expressam pelo valor e status daqueles produtos. Os peixes e mariscos de menor valor são os da BTS, comercializados nos boxes periféricos, entretanto, por pessoas de maior proximidade com comunidades pesqueiras e associações de pescadores e marisqueiras. Os mariscos “locais”, lambreta, rala coco caranguejo “pequeno”, siri, marcam presença em boxes “descentralizados”, nas filas de menor fluxo, considerando a dinâmica de clientes no Mercado. Os peixes e mariscos de “maior status”, polvos, camarões pistolas, lagostas, buscados por uma “clientela diferenciada” (chefs, restaurantes), são vendidos nos boxes que se distinguem[5] também pela centralidade espacial.

São vários os “tipos sociais” encontrados no mercado, aqueles integrados a uma lógica terceirizada – funcionários, ainda que precarizados, de micro empresas atacadistas de pescados, a exemplo da Deiró (com sede no Ceará e atuação no Baixo Sul da Bahia) – ou aqueles que, a partir das suas comunidades locais, de origem, pescam ou adquirem pescados e mariscos para a revenda no Mercado. Em conversas informais com vários dos vendedores, estes, são os únicos que detém conhecimentos quanto à origem do pescado que vendem. Por outro lado, a administração ou instância organizadora pública do mercado apresenta-se visivelmente pelo pequeno cartaz que alerta para o período do defeso, ou por outro papel afixado em uma das paredes da entrada do mercado, recordando regras de utilização do espaço. Mas como haveria procedido quando da distribuição dos boxes de modo a permitir que os espaços estratégicos de circulação e atração de clientes resultassem àqueles “proprietários” de maior poder econômico?

Fora do Mercado, a empresa pública de limpeza urbana recolhe de maneira insuficiente resíduos dos peixes ou mariscos tratados nas ruas ou descartados pelos atacadistas – o local é caracterizado por forte odor e acúmulo de lixo. À frente do Mercado e dos casarões antigos onde estão alojadas aquelas grandes empresas e que vendem enormes quantidades de camarão de origem desconhecida – serão camarões provenientes da pesca no mar ou oriundos de fazendas de carcinicultura[6]? – há vendedores “deslocados”, sub-proletários, integrados pelo trabalho degradante de limpeza do pescado (cobrando R$ 2,00 por quilo de peixe tratado, vendido pelas lojas das redondezas que parecem querer evitar este serviço “poluente” no interior das suas instalações, quando no mercado o serviço está incluído no preço do peixe adquirido).

A ausência de marcadores comuns a estabelecimentos comerciais, sejam nos boxes ou, sobretudo, nas lojas que vendem camarão nas redondezas do Mercado, a exemplo de placas ou banners com o nome da empresa que esclareçam a razão social do empreendimento (Figuras de 1 e 2), e o grau de desconhecimento aparentado pelos vendedores vinculados aos atacadistas que possuem boxes no mercado, com os quais conversamos, levam a constatar uma insuficiência de informações aparentemente propositada, que tomamos como “sentidos negativos” (Greimas, 1975) daquela configuração social. Estes sentidos manifestam-se e estendem-se acerca da origem e da cadeia do pescado e do marisco, especialmente do camarão, que está sendo comercializado e consumido na borda da BTS, como também sobre quem detém o mercado de peixes e mariscos na capital baiana. Observações que se deparam com elementos obscuros, suscitam a busca pela coerência, ou seja, pelo sentido positivo que assume o lugar de aparente ausência. (Greimas, 1975).

 

 

 

 

Figura 1. Ladeira da Água Brusca, sentido Praça Água de Meninos. Lojas sem identificação. Fachada lateral do Mercado, última edificação à direita.

Fonte: Google Street View

 

 

 

 

Figura 2. Largo de Água de Meninos. Lojas instaladas em antigos casarões, sem identificação. Mercado Popular do Peixe ao fundo.

Fonte: Google Street View

 

Por ora, fiquemos com esta cena, mantendo nossas questões em aberto. Do espaço físico e social da pesquisa, chegaremos ao campo da Comunicação Social e dos discursos.

Um elemento importante, característico, do projeto Embarcados[7] é a interdisciplinaridade. Através do desenvolvimento e transferência de Tecnologia Social, a perspectiva do projeto seria a de ofertar, às comunidades localizadas ao redor do BTS, um conjunto de conhecimentos científicos que, somados aos saberes tradicionais, colaborem à previsão de impactos às vidas das pessoas dessas comunidades, em âmbitos socioeconômicos e ecológicos, gerados por eventos estressores[8].

Nesta iniciativa interdisciplinar, qual poderia ser uma contribuição possível da comunicação social? Este escrito, então, figura como um breve aporte deste campo de conhecimento pela busca da compreensão de algumas ideias, isto é, de representações[9], construídas discursivamente, e que circulam na rede de comunicação da internet, a respeito da pesca artesanal e da Baía de Todos os Santos, de modo que possamos integrar sentidos à leitura das dinâmicas sociais que envolvem o tema, a exemplo da configuração verificada na visita ao Mercado Popular do Peixe.

Partimos daquele breve relato, tomando-o como uma espécie de cena ou fotografia de um dos loci centrais de representação da pesca (comercialização e consumo de pescados) na Baía de Todos os Santos: o Mercado do Peixe, na região da cidade baixa de Salvador. A seguir, a partir de uma concepção qualitativa e multimétodo[10] de pesquisa, recorremos à análise do discurso de diversos textos selecionados na internet, com o recorte temático pretendido, construindo comparativamente um panorama comunicacional acerca do tema de estudo. A ilustração alcançada pelo relato ganha luzes a partir dos discursos analisados, e vice-versa.  

Propomos apresentar, ainda que de modo exploratório, algumas ideias que situam a pesca artesanal e o consumo de peixes e mariscos, na Baía de Todos os Santos, no conjunto de representações em três âmbitos: o científico, o governamental e o socioeconômico, através de uma abordagem da Análise do Discurso. Para isto, primeiramente, faremos breves apontamentos sobre a implicação da comunicação na realidade social. Posteriormente, mencionaremos uma proposta de análise do panorama comunicacional da pesca artesanal na Baía de todos os Santos a partir de um modelo semionarrativo de base semiótica (Greimas, 1975), o que poderia ser a descrição de um percurso teórico-metodológico, aplicado. Os breves resultados que ilustram uma configuração representacional desse panorama, e as inferências consequentes das análises que fizemos, ancoram à pesquisa conhecimento acerca da realidade social.

 

 

 

ANÁLISE DO DISCURSO SOBRE A PESCA ARTESANAL E A BAÍA DE TODOS OS SANTOS: UMA APROXIMAÇÃO TEÓRICA

 

A comunicação apresenta um discurso, "isto é, uma obra de sentido e coerência". (Bordenave, 1997, p. 47), que para serem alcançados devem ser relacionados a um conjunto de enunciados, pois “O discurso só adquire sentido no interior de um universo de outros discursos, lugar no qual ele deve traçar seu caminho. Para interpretar qualquer enunciado, é necessário relacioná-lo a muitos outros – [...]” (Maingueneau, 2004, p. 55). Construída através da linguagem, que é meio de produção e reprodução de ideologias, visão de mundo mas também promessa de agir no mundo, a comunicação, sempre em potência criadora, opera a (re)construção da realidade social, tornando possível transformá-la, seja provocando permanências, continuidades, deslocamentos ou mudanças (Orlandi, 2001).

No campo da comunicação, e da análise crítica da realidade, referenciais (autores e obras) pressupõem reconhecer e compreender as lógicas das mensagens que estão em circulação, e a quais forças ideológicas estas mensagens se vinculam quando, em decorrência, estruturam a realidade social. À abordagem de problemas reais a partir do viés comunicacional, ou seja, à investigação no campo da comunicação, “Através de 'estudo situacional' inicial, podem ser escolhidos 'núcleos geradores' que levem a uma melhor compreensão da realidade graças a diversas leituras da mesma” (Bordenave, 1997, p. 93), seja através da leitura denotativa [percepções de propriedades observáveis e objetivas, ex. formato, tamanho, tipografia, disposição de imagens[11], e etc], seja por leitura conotativa para a interpretação subjetiva e leitura estrutural.

O texto a ser lido é formado por uma estrutura que articula diferentes elementos e constitui um sentido coeso e coerente, a partir da correlação de fatos linguísticos e sistemas de juízos sociais (Greimas, 1975). O discurso, evidenciado enquanto um texto de uso social, diretamente relacionado com as temáticas do cotidiano, tem sido objeto de estudo da Análise do Discurso (AD), área que se interessa pela relação língua-história, e concebe a linguagem como mediadora entre o homem e o social, referindo-se à compreensão da língua em uso como processo humano de produzir significações – enquanto trabalho simbólico - que, a partir de uma construção histórica, implicitamente, aponta a intenção principal do discurso; “A entrada no simbólico é irremediável e permanente: estamos comprometidos com os sentidos e o político” (Orlandi, 2001, p. 9).

Assim, as marcas linguísticas ou enunciativas que estruturam os modos de enunciação, que são as formas que dão a conhecer algo (os sejam, os discursos) são, segundo Orlandi (1994), construções com efeitos de caráter ideológico, e os valores sugeridos pelas narrativas vinculam-se aos elementos históricos ou ideológicos que caracterizam tais discursos, sendo o objetivo da Análise do Discurso (AD) contemplar o processo de reconhecimento das marcas linguísticas e da produção de sentidos nestas condições histórico-ideológicas de produção.

O dispositivo analítico que suscita reconhecer estas marcas linguísticas, nunca evidentes, de determinado texto, demanda à análise do discurso passarmos por diferentes procedimentos até alcançar o “processo discursivo”, etapa na qual se instala o “jogo ideológico”:

 

Estamos nesta etapa no jogo complexo do conjunto das formações discursivas em sua relação com a ideologia. Aí já se desenha a definição ideológica dos discursos e trabalhamos no nível da constituição do discurso (interdiscurso). É a etapa que nos instalamos de forma plena no processo discursivo e, assim sendo, já podemos chegar à compreensão do discurso que é o objeto da análise, isto é, já estamos em medida de compreender como aquele material de linguagem produz sentidos (Orlandi, 1994, p. 303, grifo da autora).

 

Reunindo pressupostos de Eni Orlandi (1994; 2001), seguidora da escola francesa da AD, teríamos o seguinte modelo de análise:

 

 

 

 

 

De modo mais próximo às orientações das obras de Greimas (1975) (um dos principais teóricos franceses da Análise do Discurso), outros linguistas consideram, grosso modo, o seguinte percurso gerativo de sentido:

1) um nível fundamental, relativo aos valores enunciados no texto, a partir de uma relação (orientada) de oposição ou de diferença entre dois termos, dentro de um universo semântico. O nível dos valores refere-se à entidade abstrata e conceitual que apresenta os valores universais que apoiam o seu sentido global, no qual a narratividade vai se desenvolver em determinado sentido de transformação e sucessividade de valores. Por exemplo, se um texto fala da morte, o seu sentido estará também atrelado à vida.

2) no segundo nível do percurso gerativo de sentido, os valores referidos devem ser compreendidos a partir da narratividade, ou do tipo de narração, operada por um determinado sujeito que organiza as articulações da “manifestação”;

3) o terceiro e último nível, é o discursivo, o mais superficial e o mais próximo da manifestação textual, portanto, o mais perceptível: “As estruturas narrativas convertem-se em discurso quando assumidas pelo sujeito da enunciação: ele faz uma série de "escolhas", de pessoa, de espaço, de tempo e de figuras, contando a história a partir de um determinado "ponto de vista"” (Gregolin, 1995, p. 16), e permite ser interpretado a partir de marcas enunciativas (temporais, espaciais, de identificação) que orientam/esclarecem o leitor acerca do sentido argumentativo e das relações entre texto e contexto. “Entendemos, portanto, discurso como um dos patamares do percurso de geração de sentido de um texto, o lugar onde se manifesta o sujeito da enunciação e onde se pode recuperar as relações entre o texto e o contexto sócio-histórico que o produziu.” (Gregolin, 1995, p. 17). Para Semprini (2010), neste nível é onde há a concretização do projeto de enunciação de determinado sujeito ante os destinatários.

A análise semionarrativa nos sugere transitar entre os três níveis indicados: interrogar-nos acerca dos valores, alcançar a percepção em termos dos elementos narrativos e da forma de narração, obter acesso aos discursos. Deste ponto, tomando o que está à mostra, o que aparece nos textos, como é escrito, como é falado, iniciar o movimento complementar inverso: mais embaixo do discurso, verificar o tipo de narração que o estrutura, e ainda mais profundamente, analisar criticamente os valores que, numa perspectiva histórica-ideológica[12], ancoram esse discurso e, por consequência, a realidade social.

 

 

PESCANDO NA REDE DOS ALGORITMOS: MATERIAIS E MÉTODOS

 

A análise semionarrativa aqui proposta parte da observação de um ponto privilegiado na pesquisa de campo e busca identificar representações sociais da pesca artesanal na Baía de Todos os Santos, a partir da AD de discursos que referenciam estes temas, conformando um panorama comunicacional explicativo dos sentidos e das lógicas espelhadas no lócus da pesquisa.

Ancorando-nos no referencial teórico mencionado, realizamos a análise do discurso de diferentes textos elencados a partir de uma determinada montagem discursiva (seleção de textos, e delimitação de campos temáticos representacionais: temas científicos, temas governamentais, e temas socioeconômicos). Oriundos destas práticas discursivas (textos escritos) foram levantados os elementos/subtemas predominantes nos textos analisados, os tipos de narração que assume cada discurso (ex. denúncia, valorização, conscientização, interação, constatação, crítica/desejo de melhorias, entre outros) e, em decorrência, os valores circulantes nestes campos representacionais, que poderiam compor um tipo possível de panorama/agenda comunicacional que envolve a Baía de Todos os Santos.

Observamos a materialidade linguística de cada um daqueles textos: o como se diz, a quem diz, em que circunstâncias – aquilo “que se mostra em sua sintaxe e enquanto processo de enunciação (em que o sujeito se marca no que diz), fornecendo-nos pistas para compreendermos o modo como o discurso que pesquisamos se textualiza” (Orlandi, 2001, p.65). Operação esta que se dá em termos de comparações, daí comparar o mesmo elemento/subtema destacado, a exemplo do “elemento pesca”, em formações discursivas nos vários campos temáticos para “construirmos, a partir do material bruto, um objetivo discursivo em que analisamos o que é dito nesse discurso e o que é dito em outros, em outras condições, afetados por diferentes memórias discursivas” (Orlandi, 2001, p. 65).

De modo mais pertinente àquilo que fizemos, refletimos os sentidos evidenciados no panorama comunicacional da BTS ao nos perguntarmos: a quais outros temas encontra-se associada a pesca na Baía de Todos os Santos? Quais valores e sentidos enunciam estas formações discursivas (ou seja, pelo que falam ou deixam de falar)? Ao analisarmos os discursos produzidos nestes determinados campos representacionais, é possível verificar, a nível interno, o que diz? como diz?, e a nível externo, por que diz o que diz?

A pesquisa foi iniciada ao definirmos para cada um dos campos representacionais, respectivas palavras-chave:

A – Campo representacional científico ambiental: “Baía de Todos os Santos” + pesquisa + dados + monitoramento + pesca.

B – Campo representacional governamental: “Baía de Todos os Santos” + governo + gestão pública.

C – Campo representacional socioeconômico: “Baía de Todos os Santos” + pesca + pescado + comprar.

As palavras-chave, definidas para cada um dos três campos, foram inseridas no buscador google, na modalidade anônima, pois quando se “[...] usa o modo anônimo para fazer a pesquisa, evita[-se] que ela seja personalizada” (Letieri, 2019, s/p), no intuito de encontrar as 10 primeiras ocorrências (página 1) (notícias/textos) relacionadas à sequência das palavras-chave predefinidas. Dos resultados apresentados pelo buscador, foram descartados vídeos e anúncios publicitários, além de notícias/textos em razão de questões técnicas (dificuldade de conversão de arquivo pdf conformado por imagens não conversíveis), grande volume de texto/tamanho do arquivo, a exemplo de livros completos, ou da repetição e similaridade de conteúdo em links diferentes.

Mesmo com os descartes, tentamos garantir a extração e análise do conteúdo de ao menos oito registros por campo representacional midiático, ou seja, por cada um dos processos de busca, os resultados foram sistematizados em planilhas; assim, quando necessário, foram incluídas ocorrências da página subsequente de resultados de buscas do google para as mesmas palavras-chave. À seleção dos textos não foi implementado um recorte temporal, abrangendo, portanto, os resultados, pela sugestão livre das ocorrências, uma série entre os anos de 2009 a 2022.

Cada um dos conjuntos de textos extraídos da internet e organizados por campo representacional foi submetido ao software ATLAS.ti com o objetivo de gerar nuvens de representação por palavras (com o recorte do mínimo de 10 ocorrências) daquele campo específico, evidenciando os temas emergentes.

 

 

DESTAQUES DO QUADRO SEMIONARRATIVO EM CAMPOS REPRESENTACIONAIS DA PESCA NA BAÍA DE TODOS OS SANTOS: RESULTADOS E ANÁLISES

 

A seguir, apresentamos as três nuvens representativas, destacando entre os elementos/subtemas emergentes, aqueles que nos chamam mais a atenção em termos histórico-ideológicos:

No campo representacional científico ambiental - o mais denso entre os três campos produzidos, com alguma diversidade de temas desdobrados num amplo leque de subtemas -, considerando o mínimo de 10 ocorrências por palavra, evidenciam-se como temas centrais: pesca, baía (ecossistema), comunidades tradicionais, pescadores, porto de Aratu, contaminação, mas também, um variado número de termos que se referem à poluição das águas da baía. Grupos semânticos mais descentralizados complementam a análise com registros relativos a um determinado marco histórico, a década de 1970, associado às atividades industriais petrolíferas, e ainda um grupo semântico que refere a conflitos/disputas, opondo os termos vida a contaminantes (ver círculos demarcados em vermelho). Termos relativos a atividades de pesquisa, como monitoramento, pesquisadores, coleta, estudo, entrevistados, encontram-se dispersos em toda a nuvem.

 

 

 

 

 

Figura 1: Nuvem científico-ambiental

Fonte: Dados da pesquisa & Software Atlas.ti

 

O segundo campo representacional, o governamental, embora apresente uma maior variedade de temas, encontra-se mais limitado em termos da frequência destes temas e da pouca diversidade de subtemas, em relação à nuvem anterior. Se fôssemos exemplificar a partir da metáfora de um vocabular, diríamos que o glossário governamental é relativamente menor do que o glossário científico-ambiental. Com o mínimo de 10 ocorrências por palavra, evidenciam-se os seguintes temas: Baía (ecossistema), resíduos, conflitos/problemas/solução, desenvolvimento, planejamento e gestão turística e ambiental e pesquisa em CT&I (Ciência, Tecnologia e Inovação).  

 

 

C:\Users\PATRICIA\Desktop\material análise discurso painel\nuvem discruso governamental minimo de 10 ocorrencias.jpg

 

 

Figura 2: Nuvem governamental

Fonte: Dados da pesquisa & Software Atlas.ti

 

O terceiro campo representacional, o socioeconômico, com o mínimo de 10 ocorrências por palavra, o mais difuso ou “pulverizado”, apresenta-se da seguinte forma:

 

 

C:\Users\PATRICIA\Desktop\material análise discurso painel\nuvem discurso socioeconomico minimo 10 ocorrencias.jpg

 

 

Figura 3: Nuvem socioeconômica

Fonte: Dados da pesquisa & Software Atlas.ti

 

As palavras "pesca", "comunidades", "pescadores" e "mar" são centrais na nuvem de palavras, enquanto outros variados termos, conectados àqueles centrais, se referem às demandas da atividade de pesca, às preocupações e problemas emergentes neste campo representacional, além do “turismo” enquanto possível solução apontada por uma demanda social.

 

 

Tipos de narração e valores associados à Pesca na Baía de Todos os Santos: um panorama comunicacional possível

O modelo de AD que utilizamos neste trabalho é um modelo de análise semionarrativa que nos sugere vincular discursos a tipos de narração e a valores, estes, refletidos em aspectos histórico-ideológicos. Considerando a premissa de que para a realidade social mostra-se o discurso, partimos destes textos para alcançarmos os tipos de narração que os estruturam, e ainda mais profundamente, os valores nos quais estão ancorados e que, por fim, enunciam.

No campo científico, os três conjuntos destacados conformam a ideia de que a partir do ano de 1970, o crescimento industrial na Baía de todos os Santos levou à contaminação das águas e a processos de disputas territoriais em razão da ameaça aos recursos ambientais da BTS e às comunidades tradicionais. A oposição entre o elemento “Ecossistema Baía” e o subtema da “Década de setenta” configura o cerne destes conflitos, com início do processo de globalização e de expansão do capitalismo, cabendo aos países “periféricos” “ou subdesenvolvidos” a ênfase no processo industrial de alto impacto ambiental em razão dos resíduos poluentes, como é o caso do Polo Industrial de Camaçari, em proximidade com a BTS e o Centro Industrial de Aratu e o Porto de Aratu, ambos na borda da BTS.

Associados ao primeiro elemento, Baía, o tipo de narração é o de valorização de recursos ambientais e históricos, e os valores veiculados são aqueles que referem à sua riqueza natural, ecológica, histórica e cultural; em relação ao subtema que indica a mudança histórica dos aspectos produtivos e organizativos da sociedade (capitalismo), é de constatação e de crítica o seu tipo narrativo, remetendo a valores da produção e do crescimento econômico a serem suplantados pelos valores de proteção e preservação ambiental, e da não mercantilização da natureza.

Complementarmente, para o subtema “Poluição / contaminação”, tem-se dois tipos de narração, com respectivos valores: o primeiro é o de Constatação/preocupação, que indica a presença de contaminantes na BTS em níveis de concentração acima do considerado background ou natural, e faz o alerta no que se refere ao efeito de contaminantes na saúde, principalmente das comunidades ribeirinhas, e de risco à biota. O valor encontrado é o da relevância de mensuração/quantificação sistemática (pesquisa quantitativa), contínua e mais ampla, de contaminantes químicos das águas e atmosfera da BTS, e de seus impactos para a saúde e a qualidade de vida. O segundo é o de constatação e denúncia sobre a omissão do Estado em relação à implantação de empreendimentos de impacto contaminante à baía e às comunidades pesqueiras, associando valores relativos à Saúde, à segurança alimentar e à qualidade de vida.

O subtema “Comunidades tradicionais / pesqueiras e quilombolas”, e o próprio tema da pesca artesanal, emergentes no campo representacional científico, são enunciados a partir de um tipo de narração de valorização, remetendo a concepções de riqueza e diversidade sociocultural, de relevância da transmissão de saberes e práticas tradicionais, dos modos de vida e de reprodução social de menor impacto ambiental, além do apelo à coletividade e à resistência.

O subtema “Conflitos e Disputas territoriais” é narrado a partir da constatação, seja das especificidades relativas aos modos de vida e de sobrevivência das comunidades tradicionais pesqueiras e quilombolas da BTS, que requerem acesso a territórios e recursos naturais, que de demanda ao Estado, por proteção e fiscalização destes territórios; a narração, configura-se também, como um alerta de riscos de conflitos sociais e de injustiça ambiental. Os valores são de afirmação de pertencimento, e de reconhecimento de direitos à manutenção e melhoria das condições de existência.

Ainda no campo representacional científico, consta o subtema da “Pesca Predatória”, que emerge a partir da interpenetração do campo governamental (referência às ações de fiscalização e monitoramento do Inema - Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos), através de outro subtema “Monitoramento”, que pensávamos ser mais pertinente ao campo científico, mas que se apresenta como um subtema “em disputa” representacional. Desta forma, “a pesca predatória” é evidenciada a partir de duas perspectivas: na primeira, com um tipo narrativo de informação, referindo a certos processos históricos, quando comunidades tradicionais passaram a ter acesso a este recurso tecnológico que otimiza (em termos de menor tempo de pescaria e de maior volume), a despeito do seu efeito destruidor, a extração de pescados, enunciando valores ligados à tradição, e à compreensão das circunstâncias que levam a escolhas irrefletidas por determinadas práticas socioculturais.

Na segunda, este subtema é narrado como um tipo de denúncia que impele à conscientização e ao combate deste tipo de pesca; qualificada como crime ambiental, ancorando-se em valores de monitoramento, fiscalização e controle, os sentidos enunciados tornam-se ambíguos: tanto apresentam uma perspectiva educativa, de substituição das práticas, propondo “combater a pesca predatória pelo incentivo ao uso de técnicas adequadas à atividade pesqueira” (Bahia, 1999)[13], quanto acabam por estigmatizar comunidades que realizam a pesca artesanal.

No panorama comunicacional que vai sendo concebido, há dois subtemas em disputa representacional: entre eles, o primeiro, “monitoramento”, seria uma espécie de subtema polivalente. No mesmo campo científico, emerge com viés próprio deste campo com um tipo de narração que releva os estudos sistemáticos e protocolos de análise sobre padrões de contaminação na BTS, e enuncia valores de transparência, conhecimento, divulgação, e de acompanhamento; mas também, por interpenetração discursiva, configura sentidos ao campo governamental, como vimos acima, e a um possível campo econômico empresarial.  Neste último caso, o subtema assume o tipo de narração de publicidade sobre benefícios de projeto ambiental promovido pela Braskem, uma das principais empresas poluidoras da BTS, veiculando valores de “Gestão sustentável da pesca artesanal na região, assim como a educação ambiental da comunidade com foco no ecossistema marinho” (Braskem, site institucional, 20...).

Afora estas discrepâncias que ganham efeito a partir do uso de termos que denotam insuspeição às ações empresariais, buscando apaziguar dívidas socioambientais ou encobrir interesses econômicos, a presença de termos "monitoramento", "resultados" e "amostras" reforça que estes discursos que configuram o campo representacional científico baseiam-se em dados científicos, indicando que há esforços de coleta de dados e análises regulares para entender os impactos ambientais e trazer respostas a partir de algo concreto, credibilizando o campo referido.

Antes de mencionarmos o segundo termo em disputa, o subtema Turismo, avancemos um pouco mais nas nossas análises, apresentando o quadro semionarrativo do segundo campo estudado. No campo representacional governamental, o subtema “Ecossistema Baía” é narrado por um tipo de discurso que denuncia a negligência da gestão pública em relação a este ecossistema, e o valor associado é o da riqueza ambiental na perspectiva econômica, portanto, o da maximização de recursos naturais, diferindo do viés histórico-ideológico enunciado, pelo mesmo termo, no campo científico. 

Por sua vez, o subtema dos “Resíduos sólidos/contaminação” é enunciado através de três tipos de narração: 1) a de constatação / denúncia de riscos ambientais, associado à disponibilização de resultados/ divulgação do papel do Ministério Público, veiculando o valor de relevância dos recursos naturais da Baía e da necessidade de continuação de ações de controle; 2) de defesa da preservação ambiental e de programas governamentais de saneamento, com valores de sustentabilidade; cooperação (esforço conjunto de vários setores da sociedade); e eficiência dos padrões de monitoramento pelo órgão público; e por último, 3) de denúncia de riscos, inclusive de perdas econômicas, às comunidades, ancorando-se nos valores de qualidade de vida e ampliação de renda.

O campo governamental traz ainda os subtemas “Conflitos Ambientais” e “Desenvolvimento”, relativo às atividades econômicas adequadas à conservação dos recursos naturais, com um tipo de narração legislativa, o Decreto nº 7.595 de 05 de junho de 1999 que cria a Área de Proteção Ambiental - APA da Baía de Todos os Santos e dá outras providências (Bahia, 1999), que tipifica conflitos ambientais, a exemplo da Pesca com explosivos, do Lançamento de efluentes domésticos e industriais, da Ocupação desordenada do solo, do Desmatamento, da Disposição inadequada de resíduos sólidos, do Extrativismo descontrolado de crustáceos e moluscos, e da Ocupação de áreas de preservação permanente, amparando-se nos seguintes valores: ordenamento, convivência, proteção e preservação; participação social, econômico, e relevância da conservação de recursos naturais.

Neste campo, destaca-se ainda o subtema do “Planejamento e Gestão Turística e Ambiental”, com um tipo de narração informativo; divulgação de ações do programa de fomento ao turismo náutico e cultural (Prodetur), de valorização do turismo, da gestão ambiental; sustentabilidade; preservação; participação; aperfeiçoamento da capacidade da administração pública, e do desenvolvimento. E, por último, o subtema da “Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I)”, com um tipo de narração que destaca a relevância do financiamento de pesquisas; constatação do crescimento do fomento em CT&I; defesa da articulação entre pesquisa e gestão pública no desenvolvimento de Estudos Multidisciplinares, sob valores de fortalecimento da ciência, tecnologia e inovação (CT&I); globalização, desenvolvimento; articulação em rede de pesquisa, em razão da complexidade dos fenômenos socioambientais da BTS, e das demandas da sociedade por soluções que contribuam para uma vida melhor.

Em relação ao campo representacional socioeconômico, os destaques ficam para os seguintes subtemas: em termos enunciativos, os tipo de narração que referem a “Pesca” apresentam-se por três vieses: o da crítica ao “discurso [que] aborda a decadência da pesca artesanal e tem como objetivo principal valorizar a aquicultura” (Silva, 2013, p. 17), sistema produtivo (semi)industrial que melhor corresponderia ao aumento crescente no consumo por carnes brancas frente ao escasseamento de peixes em decorrência da poluição e da pesca predatória; o de campanha nacional pela regularização dos territórios das comunidades tradicionais pesqueiras; e o da constatação de pontos fortes e restrições ao desenvolvimento da atividade de pesca e a análise das políticas públicas orientadas para o setor, consolidando a crítica voltada às políticas públicas de fomento à cadeia produtiva do pescado.

Todos os três tipos de narração, mencionados acima, partilham da ideia de valorização da pesca; da relevância da organização produtiva e da produção de alimentos; reconhecem os saberes e práticas tradicionais; a viabilidade da pesca sustentável; a necessidade da resolução de conflitos e de políticas não-assistencialistas, mas efetivas para superação de dificuldades quanto à produção e comercialização dos produtos pesqueiros / sustentação de elos da cadeia produtiva e superação de seus principais desafios.

O subtema “Comunidades tradicionais/pesqueiras e quilombolas” é narrado por um tipo de enunciado que constata a valorização, a riqueza da diversidade sociocultural e a relevância da transmissão de saberes e práticas tradicionais. Vinculado a este subtema, há outro, o “Demandas / Preocupações”, cujos tipos de narração informam as principais demandas das comunidades pesqueiras relativas a: petrechos (ausência, segurança contra furtos, inadequação, perdas por prenderem-se ou romperem-se em estruturas submersas, ausência de espaço para armazenamento); embarcações (ausência, inapropriadas, ausência de equipamentos de salvatagem e segurança, falta de registro, baixa modernização); áreas de pesca (sobrepesca, conflitos territoriais, obstáculos, poluição e degradação, distância); pescado (escassez, contaminação, pesca predatória); portos (estruturas inadequadas); pesca e mariscagem (dores musculares, escoriações, riscos por acidentes com espécies venenosas); processos de beneficiamento rudimentar; ineficiência na comercialização, presença de intermediário, e sobretudo, o escasseamento de peixes. Os valores veiculados nestes textos apelam à sensibilidade, diligência e compromisso da esfera pública para o atendimento destas demandas e a solução de problemas.

Por último, voltamos ao “Turismo”, que reemerge de modo controverso no campo socioeconômico, configurando-se em disputa ao campo governamental, quando foi destacado positivamente através do Programa Prodetur, de fomento ao turismo no Estado da Bahia. No campo socioeconômico, o tema é descrito por um tipo de narração ambígua de constatação do impacto do turismo para a pesca artesanal e para as comunidades tradicionais, localizadas em territórios de interesse turístico: a pressão sobre os recursos pesqueiros e sobre as comunidades e territórios tradicionais também se intensificou pela presença de visitantes e pelo aumento da demanda consumidora de pescado. Valores como “oportunidade” e “subordinação passiva” - considerando que a transformação das comunidades tradicionais em polos de serviços (oferta de alimentação, hospedagem ou lazer), sob o signo da hospitalidade, e pela ideologia do “negócio”, passa a exigir ampla disponibilidade - são ao mesmo tempo contrapostos e complementares.

Nesta configuração, as comunidades são apresentadas pelo traço do interesse e viabilidade turística, cabendo também às famílias a oferta da boa hospitalidade ao público externo, em contrapartida da possibilidade de ampliação da renda familiar. Esta primeira leitura aproxima possíveis enunciados discursivos desta nuvem àqueles encontrados na nuvem do campo governamental.

 

 

A ANÁLISE DO DISCURSO APLICADA AO CORPUS DA PESQUISA: DISCUSSÃO

 

Reunindo por cada campo representacional o conjunto dos termos destacados em seus variados de tipo narrativos e, sobretudo, os valores aos quais referem, temos enunciados específicos: as representações do campo científico evidenciam o forte impacto das substâncias químicas e da contaminação ambiental, especialmente relacionado à poluição de origem industrial e os contaminantes encontrados em águas e sedimentos; sugere a preocupação com a presença de substâncias poluentes nas áreas de pesca e suas consequências para o ecossistema local, além da saúde das comunidades que dependem dessas áreas. Tece crítica ao sistema produtivo baseado no modelo industrial que exerce pressão sobre os recursos naturais, e ao Estado, por sua omissão enquanto instância que deveria proteger a vida e garantir os direitos das minorias.

Ao analisar as representações circulantes no campo governamental é possível identificar o foco em tentativas de operacionalidade por parte do governo. Termos como "gestão", "planejamento", "projeto" e "programa" são centrais nesse discurso, evidenciando essa característica governamental, apontando problemas já evidenciados pelo campo científico, a exemplo do tema da contaminação das águas da BTS, embora manifestando sua preocupação em relação à qualidade de vida das comunidades do entorno, especialmente, quanto à viabilidade das atividades turísticas e econômicas locais. De modo complementar, as representações contidas no campo governamental refletem uma abordagem que propõe combinar ciência, educação e tecnologia (temas não insurgidos no campo científico) para lidar com questões ambientais e socioeconômicas relativas à pesca e a BTS.

Também se destaca o termo Fapesb, que é o órgão de financiamento de pesquisa do Estado da Bahia, associado a termos como soluções e resultados. Há uma clara ênfase na intersetorialidade, buscando abranger diversos segmentos da sociedade. A aparente neutralidade dos termos emergentes leva a pensar em projetos de enunciação voltados a destinatários em âmbitos diversos, e mesmo em posições diferenciadas ou contraditórias socialmente (Bourdieu, 1996), contendo marcas linguísticas que buscam agradar a todos os agentes dentro da sociedade, e apresentar-se como instância mediadora, solucionadora dos problemas e empreendedora de soluções.

O conjunto representacional configurado no campo socioeconômico destaca a relevância da atividade pesqueira como eixo organizador da vida dessas comunidades. Isso sugere que o discurso sobre a pesca não se limita a uma atividade econômica, mas, se conecta com aspectos socioculturais, como o papel da pesca na identidade das pessoas que dependem dessa atividade para subsistência. De modo mais específico, associada ao trabalho, e a termos que referem à materialidade do cotidiano da pesca (redes, embarcações, maré), além de palavras como “produção”, “renda”, “economia” e “subsistência”, reforça-se a representação de que essas comunidades dependem da pesca tanto para se alimentar quanto para gerar receita, dando um foco no papel econômico da pesca artesanal.

O trabalho de composição do panorama comunicacional, a partir de diferentes campos representacionais, demonstra a complexidade da realidade social. A análise revela que apesar da frequência de termos comuns nos diversos campos, estes assumem valores e, portanto, formas enunciativas diferenciadas, admitindo sentidos próprios a cada campo. Nesta direção, a presença de subtemas em disputa, a exemplo de “monitoramento” e “turismo”, são máximos reveladores dessas diferenciações.

Por outro lado, encontramos formas de interpenetrações de perspectivas histórico-ideológicas, além de “dispositivos linguísticos estratégicos”, a exemplo de “gestão sustentável” e termos assemelhados, ou “educação ambiental”, que associados aos subtemas em disputa possibilitam o reposicionamento dos agentes no campo representacional, a exemplo da empresa poluidora que se apresenta como promotora de ações de preservação ambiental. No panorama comunicacional configurado, além de uma perceptível submissão da Política[14] (Arendt, 2002) - elemento central na esfera pública (Habermas, 1997) -, aos dispositivos de gestão e ao poder econômico, parece haver uma lacuna em relação a uma possível convergência para a construção de Políticas Públicas, de caráter transdisciplinar, entre as representações científicas, governamentais e socioeconômicas.

Em cada campo, os enunciados passam por um processo de nucleação, tanto ao constituir os sentidos (representações) quanto a reforçá-los. Há a tendência de cada campo reafirmar a sua natureza, suas finalidades, e são recorrentes os sentidos que reforçam a valorização do próprio campo num movimento de diferenciação aos demais. A partir de uma concepção relacional de mundo, estas tendências poderiam ser compreendidas à luz da Teoria Geral dos Campos, de Pierre Bourdieu (1996), referindo às relações de poder e de disputas dos recursos, que são sempre limitados, no interior dos espaços que conformam o mundo social.

A análise dos campos representacionais estudados, por aquilo que enunciam no conjunto das representações, depara também com “sentidos negativos” (Greimas, 1975), na forma de ausências de termos ou enunciados. O discurso socioeconômico, por exemplo, parece exclusivamente vinculado ao pescador e às comunidades tradicionais; não há referência alguma, nem mesmo na forma de disputas, a subtemas relativos ao âmbito empresarial ou mercadológico, sequer à pesca comercial.

À contrapelo do argumento filosófico utilizado seja por Agamben (2009), ao discutir o que é visível no contemporâneo, seja por Byung-Chul Han (2023), em seu recente livro intitulado A crise da narração, ou por Pierre Nora (1993), com seu texto clássico “Entre memória e história: a problemática dos lugares”, ao afirmarem, cada qual a seu modo, o fim da narrativa e o fim da história, respectivamente, em razão da proliferação, no contemporâneo, da produção e veiculação destes dispositivos, poderíamos compreender que aquilo que não se dá a ver é, justamente, o que se faz presente.

No caso da realidade social na qual se situa a pesca e o consumo de pescado e de mariscos na Baía de Todos os Santos, o que os estrutura e governa é o elemento econômico, financeiro, que se mantém oculto nos campos representacionais estudados, como nas fachadas dos casarões à borda do Mercado. Seria preciso criar mecanismos de contraste para que pudéssemos vê-los, superar a aparente ausência de elementos da ordem macroeconômica, outro lado complementar das economias de pequena escala, conforme a teoria do desenvolvimento econômico em sua dimensão espacial: a teoria dos dois circuitos elaborada por Milton Santos (2004 [1979]), cujas atividades complementares diferem sobretudo pela tecnologia e pela organização:

 

Esse termo exprime duas coisas diferentes segundo se considere a produção ou consumo. A produção tende a se concentrar em certos pontos do território com tanto mais força quanto se trate de atividades modernas. O consumo responde a forças de dispersão, mas a seletividade social age como freio, pois a capacidade de consumir não é a mesma qualitativa e quantitativamente. No entanto, como os gostos novos se difundem na escala do país, enquanto os gostos tradicionais subsistem, o aparelho econômico deve adaptar-se ao mesmo tempo aos imperativos de uma modernização poderosa e às realidades sociais, novas ou herdadas. Isso é válido tanto para o aparelho de produção como para o de distribuição. Criam-se dois circuitos econômicos, responsáveis não só pelo processo econômico mas também pelo processo de organização do espaço. [...]. Nós chamamos esses dois subsistemas de ‘circuito superior’ ou ‘moderno’, e ‘circuito inferior’[15]. (Santos, 2004 [1979], p. 21; 22).

 

A teoria dos dois circuitos nos faz compreender que, em larga escala, não há uma ligação entre os peixes e os mariscos vendidos, por consequência, consumidos, na capital baiana com as águas da Baía de Todos os Santos. A dinâmica verificada nos boxes centrais do Mercado Popular e nas lojas adjacentes correspondem ao do circuito superior, ou moderno, descrito por Santos (2004 [1979]). O que ocultam, quando não veiculam suas marcas e nomes empresariais em seus produtos é a sua desterritorialidade (Haesbaert, 2023). Salvador, terra de sol e mar, não se alimenta do peixe que sai de suas águas! No caso particular dos camarões, aquelas dinâmicas ocultam, provavelmente, também o fato de serem originados de fazendas de carcinicultura, equipamentos comumente ligados à crimes ambientais, como supressão de áreas de restingas e de manguezais, mas, mesmo quando licenciados, sempre poluentes, em razão do grande volume de resíduos que jogam no ambiente. Por fim, ocultam que seus produtos, pelo modo de produção escolhido, não oferecem a qualidade (imagem) esperada pelos consumidores. 

 

 

CONCLUSÃO

 

Frente ao apresentado, evidenciou-se representações de diferentes campos discursivos que compõem um panorama comunicacional possível e que retratam aspectos distintos e complementares sobre a pesca e a BTS. Estes aspectos tornaram-se legíveis no interior do campo da Análise do Discurso, pela aplicação deste método, no viés dos estudos multimétodos, e da interdisciplinaridade. Sob a perspectiva das Ciências da Comunicação, as análises desenvolvidas aportaram conhecimento à realidade social pesquisada. A evidência enunciativa dos subtemas analisados a partir da AD dão conta de bem representar os perfis dos três campos representacionais; as ausências no campo representacional socioeconômico tem compatibilidade com as observações em campo, e, por contrastes, indicando que o conjunto das representações refere-se a uma baía que se torna, cada vez mais, relegada a uma condição de fragilidade econômica e social.

De modo complementar, infere-se que o cerne das discussões, a pesca, e em especial, a pesca artesanal, que deveria ser o elemento cultural e socioeconômico central da baía, ligando-se a uma identidade individual e coletiva local, vem perdendo espaço na BTS, sendo “descentralizada” nos grandes mercados, limitando-se à subsistência das comunidades tradicionais, indicando que a pesca artesanal carece de amplo reconhecimento, sobretudo governamental.

Além disso, os discursos nos diferentes campos mostraram representações passíveis de interpenetrações enunciativas, que às vezes se complementam, mas, muitas vezes entram em conflito, demonstrando pontos de desconexão entre elas. A ciência traz dados importantes e aponta críticas relevantes, mas a esfera governamental prioriza a gestão e o poder econômico, em detrimento da política (Arendt, 2002), enquanto o mercado ligado à pesca segue uma tendência de “descentralização” da pesca artesanal e de desterritorialização produtiva da BTS, conforme os circuitos diferenciados da economia (Santos, 2004 [1979]). Mas quais as implicações disto?

É consequência desta pesquisa a hipótese de que as forças produtivas e econômicas que poderiam ter interesse em uma BTS viável à produção de alimento (peixes e mariscos) não se encontra em campo, restando as inflexões promovidas por empreendimentos econômicos que, ao contrário, não identificam relevância na qualidade das águas da baía. Do outro lado, temos as comunidades tradicionais que vivem de suas águas e de seus recursos, mas, que se encontram à própria sorte, desamparadas por um Estado capturado pelo poder econômico e pela lógica capitalista que determina a divisão social do trabalho. Se a pesca (artesanal) na BTS é residual e o mercado do pescado tem suas lógicas econômicas e de produção centradas em territórios muito distantes das águas da BTS, sequer benefícios residuais de investimentos econômicos nesta cadeia seriam destinados à BTS. Se houvesse pesca comercial na BTS, talvez houvesse força para evitar as contaminações.

Pela mesma lógica econômica, sequer poderíamos lançar mão de uma “Marca de peixe BTS”, para fazer frente às lógicas de mercado. O grau de contaminação das águas, a intensidade do tráfego marinho, por atividades portuárias, de transporte ou de lazer na BTS, além do escasseamento de peixes implicado por estas dinâmicas, torna a pesca na baía extremamente residual, e unicamente associada às comunidades tradicionais. Certamente, ao ser representada como pesca artesanal e modo de subsistência de inúmeras famílias, já se atribuiria valor a esta atividade, como vimos em dois dos campos representacionais estudados, o científico e o socioeconômico, levando a ratificar a crítica feita pela omissão da esfera governamental. É neste campo onde precisam ocorrer o reconhecimento dos valores e a garantia dos direitos das comunidades tradicionais, dos seus modos de vida e demandas, inclusive territoriais, para as maiores transformações na nossa sociedade: avanços não apenas previstos nas legislações, como normas programáticas, mas efetivos, em termos de justiça econômica e social.

Um caminho para a solução desses problemas seria ampliar o diálogo entre estes diferentes campos e representações, criando políticas públicas ou ações que cuidem do meio ambiente, respeitem as comunidades e adotem estratégias de valorização do comércio de pescado da região de forma mais justa, valorizando a Baía de Todos os Santos como um ambiente provedor e essencial para a Velha (nova) Bahia e para as comunidades que vivem nela.

 

 

REFERÊNCIAS

 

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1

Revista Ouricuri, Juazeiro, Bahia, v.14, n. Edição Especial - 01. 2024, p.03 - 30. Jul./dez., http://www.revistas.uneb.br/index.php/ouricuri | ISSN 2317-0131


[1] O teor deste relato tem origem em notas de campo, datadas de 02/04/2022, relativas ao Projeto Embarcados, com observação participante no Mercado (Popular) do Peixe, rua e adjacências, à borda da Baía de Todos os Santos, no bairro de Água de Meninos, Cidade Baixa de Salvador.

[2] Embora nem sempre observado, o Decreto no 79.797, de 8 de junho de 1977 regulamenta que guardador autônomo de veículos automotores é uma profissão, somente permitida aos profissionais registrados na Delegacia Regional do Trabalho do Ministério do Trabalho, e que compete a estes profissionais atuar em áreas externas públicas, destinadas a estacionamentos, no sentido de orientar ou efetuar o encostamento e desencostamento de veículos nas vagas existentes, predeterminadas ou marcadas.

[3] Expressão que refere a sujeitos que participam de determinada configuração social, em análise.

[4] Segundo o site da Seafood Brasil, a “AquaChile é a segunda maior produtora de salmão do mundo e a maior do Chile, especializada na produção de salmão do Atlântico (Salar) e salmão do Pacífico (Coho).” https://www.seafoodbrasil.com.br/fornecedores/aquachile

[5] Ver o conceito de distinção em Bourdieu (2007).

[6] Entre as técnicas de aquicultura (ramo específico da Zootecnia que estuda a produção racional de organismos aquáticos), a carcinicultura é voltada para a criação de camarões em viveiros.

[7] O objetivo deste projeto foi construir um dispositivo com uma ligação de interface de código aberto à tecnologia Arduino, possibilitando gerar dados físico-químicos utilizados no monitoramento ambiental, na forma de indicadores capazes de estimar a magnitude das mudanças na qualidade da água e integridade ambiental de pontos na Baía de Todos os Santos (BTS), a segunda maior no sistema de baías do Brasil. O projeto também previa a transferência de tecnologia para a comunidade e a construção de ferramentas educacionais, favorecendo a compreensão dos dados socioambientais.

[8] Eventos estressores são caracterizados por mudança significativa a um indivíduo ou ecossistema, alterando sua estrutura, funcionamento momentâneo ou capacidade de adaptação. Na Baía de Todos os Santos, um exemplo desse evento inclui a supressão dos manguezais, comprometendo as funções desse ecossistema como a proteção costeira. Os eventos estressores comumente são derivados de ações humanas de impacto no ambiente.

[9] Dispositivo ordenador de sentidos ao redor de um tema, as representações sociais, que "se apresentam como uma 'rede' de ideias, metáforas e imagens, mais ou menos interligadas livremente" (Moscovici, 2003, p. 209; 210), são lugares de inscrições dos sujeitos, de posicionamento e de disputas no campo social e que, implicando “classificação” e “hierarquização” da/na estrutura social, instituem um âmbito de socialização e construção de subjetividades.

[10] Refere-se ao entrecruzamento de métodos numa “perspectiva complementar” (Chizzotti, 2003).

[11] Embora a semiótica pudesse ser uma perspectiva válida para este estudo, no âmbito deste artigo não foi feita análise das imagens que ilustram os textos que compõem o corpus da pesquisa.

[12] “Entre as inúmeras possibilidades de formulação, os sujeitos dizem x e não y, significando, produzindo-se em processos de identificação que aparecem como se estivessem referidos a sentidos que ali estão, enquanto produtos da relação evidente de palavras e coisas. Mas, como dissemos, as palavras refletem sentidos de discursos já realizados, imaginados ou possíveis. É desse modo que a história se faz presente na língua” (Orlandi, 2001, p. 67).

[13] Art. 1o, inciso V, do DECRETO Nº 7.595 DE 05 DE JUNHO DE 1999, que cria a Área de Proteção Ambiental - APA da Baía de Todos os Santos e dá outras providências.

[14] Dispositivo que se baseia no fato da “pluralidade dos homens” e tem por finalidade “organizar e regular o convívio de diferentes, não de iguais”, tal como nos sugere Hannah Arendt (2002).

[15] “O circuito superior [constituído pelos bancos, comércio, indústria de exportação, indústria urbana moderna, serviços modernos, atacadistas e transportadores] originou-se diretamente da modernização tecnológica e seus elementos mais representativos hoje são os monopólios. O essencial de suas relações ocorre fora da cidade e da região que usa os abrigam e tem por cenário país ou exterior. O circuito inferior, formado de atividades de pequena dimensão e interessando principalmente às populações pobres, é, ao contrário bem enraizado e mantém relações privilegiadas com sua região” (Santos, 2004 [1979], p. 22).