RELATO DE EXPERIÊNCIA: DINÂMICA LÚDICA E BEM-ESTAR FÍSICO NO CAPS AD
Daiane dos Santos Ramos1*; Priscila Vogel Nunes Pinheiro1; Cláudia Regina de Oliveira Vaz Torres2
1Mestranda do Programa de Pós-graduação em Intervenção Educativa e Social (PPGIES) - DEDC - Universidade do Estado da Bahia - UNEB-Campus XI Serrinha - BA.
2Doutora em Educação. Professora no Programa de Pós-graduação em Intervenção Educativa e Social, UNEB, Campus XI.
*Autor para correspondência E-mail: psidaianeramos@gmail.com
Recebido:03/10/2024 Aceito: 08/11/2024
Palavras-chave: Sala de espera; Processos grupais; Dinâmica de Grupo
EXPERIENCE REPORT: PLAYFUL DYNAMICS AND PHYSICAL WELL-BEING IN THE CAPS AD
ABSTRACT: This experience report aims to describe the implementation of a playful activity in the CAPS AD III waiting room. The activity aimed to provide users and their companions with a moment of relaxation in the waiting room, promoting interaction and the physical well-being of participants and a more pleasant, welcoming environment with a fun and inclusive dynamic. Using a qualitative and participatory methodology, group dynamics were organized that included music and interaction with objects. Of the 18 present, 12 actively participated, while 6 chose not to participate due to various personal reasons. The activity was well received and provided moments of relaxation and joy, contributing to a more welcoming and positive environment in the waiting room. The report also incorporates a critical and reflective analysis based on renowned authors such as Alexandre (2002), Pichon-Rivière (2005), Stoffer (2023), Martín-Baró (2003-2017), Costa, Silva and Silveira (2018), among others. These authors offer a robust theoretical basis for understanding human interactions in collective contexts, contributing to the analysis of group processes, group practice, group dynamics and leadership in the context of the mental health waiting room. Furthermore, the article suggests proposals for future interventions, aiming to increase effectiveness and user engagement.
Keywords: waiting room; group processes; group dynamics.
INFORME DE EXPERIENCIA: DINÁMICA LÚDICA Y BIENESTAR FÍSICO EN EL CAPS AD
RESUMEN: Este relato de experiencia tiene como objetivo describir la implementación de una actividad lúdica en la sala de espera del CAPS AD III. La actividad tuvo como objetivo brindar a los usuarios y sus acompañantes un momento de relajación en la sala de espera, promoviendo la interacción y el bienestar físico de los participantes y un ambiente más agradable, acogedor y con una dinámica divertida e inclusiva. Utilizando una metodología cualitativa y participativa, se organizaron dinámicas grupales que incluyeron música e interacción con objetos. De los 18 presentes, 12 participaron activamente, mientras que 6 optaron por no participar por diversos motivos personales. La actividad fue bien recibida y brindó momentos de relajación y alegría, contribuyendo a un ambiente más acogedor y positivo en la sala de espera. El informe incorpora también un análisis crítico y reflexivo basado en reconocidos autores como Alexandre (2002), Pichon-Rivière (2005), Stoffer (2023), Martín-Baró (2003-2017), Costa, Silva y Silveira (2018), entre otros. Estos autores ofrecen una base teórica sólida para comprender las interacciones humanas en contextos colectivos, contribuyendo al análisis de los procesos grupales, la práctica grupal, la dinámica grupal y el liderazgo en el contexto de la sala de espera de salud mental. Además, el artículo sugiere propuestas para futuras intervenciones, con el objetivo de aumentar la eficacia y la participación de los usuarios.
Palabras clave: sala de espera; procesos grupales; dinámica de grupo.
INTRODUÇÃO
Este artigo deriva de uma ação grupal, intitulada de Dinâmica Lúdica e Bem-Estar Físico, que partiu de uma necessidade da população atendida no CAPS AD III [1]Regional da cidade de Serrinha-Bahia, localizado no Território do Sisal, no qual é perceptível a inquietação e agitação dos usuários e seus acompanhantes que buscam atendimento na unidade. O estudo integra o Programa Multidisciplinar de Extensão (INTER-AGIR) do Programa de Pós-Graduação em Intervenção Educativa e Social (PPGIES) e resultou do componente curricular Processos Grupais.
Durante o atendimento no CAPS AD III, frequentemente ouve-se relatos de insatisfação relacionados ao tempo de espera para serem atendidos. Muitos usuários expressaram frustração por passarem longos períodos sem atividades produtivas ou a sensação de estarem perdendo tempo, o que aumenta o desconforto tanto para os próprios usuários quanto para a equipe, devido ao número elevado de queixas. Portanto, tornou-se necessário implementar abordagens e técnicas adicionais, para lidar com os desafios relacionados à saúde mental, proporcionando conforto e otimizando o tempo de espera, além de evitar a sobrecarga dos profissionais atuantes nesse contexto.
Ao se considerar o relato de experiência como uma forma escrita de vivências que contribui para a produção de conhecimentos sobre diversas temáticas, reconhece-se a importância da discussão acerca do conhecimento, que está interligado tanto ao saber escolarizado quanto às aprendizagens adquiridas através das experiências socioculturais (Mussi et al., 2021). No contexto atual, em que o meio virtual facilita o acesso à informação, o relato de experiência se torna uma ferramenta importante para a disseminação de saberes, promovendo reflexões críticas e embasadas cientificamente (Mussi et al., 2021).
O relato de experiência, sendo um tipo de produção de conhecimento, descreve vivências acadêmicas ou profissionais em um dos pilares da formação universitária, como o ensino, a pesquisa e a extensão, e tem como característica principal a descrição da intervenção, pautada em embasamento científico e reflexão crítica (Mussi et al., 2021). Ao descrever intervenções, especialmente nos pilares da formação universitária, como ensino, pesquisa e extensão, esse tipo de texto valoriza tanto o conhecimento teórico quanto prático, sendo fundamental para a construção e transmissão do saber.
O objetivo principal desse relato de experiência é descrever a experiência de mestrandos do Programa de Pós-Graduação em Intervenção Educativa e Social (PPGIES) da Universidade do Estado da Bahia – Campus XI acerca da realização de dinâmica lúdica e bem-estar físico no CAPS AD. Essa intervenção justifica-se pela sua capacidade de transformar a sala de espera em um espaço dinâmico, leve e produtivo, utilizando dinâmicas de grupo lúdicas, como ouvir música e dançar ao ritmo da música, jogos de baralhos ou dominó que o grupo presente possa participar e interagir. A proposta é criar momentos de interação e relaxamento que ajudem a reduzir a inquietação e o desconforto dos usuários enquanto aguardam o atendimento.
Além disso, a atividade em grupo oferece uma oportunidade para que os participantes compartilhem experiências e estratégias de enfrentamento, fortalecendo suas redes de apoio social. Martín-Baró (2003) explica que um grupo se forma quando os indivíduos interagem uns com os outros e compartilham certas normas e objetivos comuns. Esse conceito de grupo se diferencia de outras situações nas quais várias pessoas estão envolvidas em uma mesma atividade, destacando aspectos importantes que caracterizam um grupo em relação a simples aglomerações de pessoas.
Acreditamos que essa abordagem pode melhorar significativamente a experiência dos usuários na sala de espera, proporcionando benefícios psicossociais e contribuindo para um ambiente mais positivo e colaborativo.
O público participante da intervenção foi composto por usuários do serviço e respectivos acompanhantes que estavam aguardando atendimento na sala de espera.
A sala de espera de uma unidade de saúde é um ambiente ideal para promover intervenções de saúde mental devido ao tempo de espera que muitas vezes pode ser utilizado de forma produtiva. Este espaço oferece uma oportunidade única para educar e engajar os pacientes e suas famílias em práticas que podem ter um impacto positivo em sua vida diária.
FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
No âmbito da disciplina Processos Grupais, do Programa de Pós-Graduação em Intervenção Educativa e Social (PPGIES) da Universidade do Estado da Bahia – Campus XI, o estudo sobre a ação grupal visa sensibilizar os participantes quanto à importância das dinâmicas lúdicas e ao impacto do bem-estar físico na interação e apoio mútuo dentro de grupos. A partir de uma dinâmica participativa, buscou-se embasamento teórico para a análise de questões como Processo Grupal, Dinâmica de Grupo e Liderança, aspectos essenciais para a compreensão das interações humanas em contextos coletivos. Além disso, foi abordado bem-Estar Físico e Saúde Mental.
Processo Grupal, Dinâmica de Grupo e Liderança
Os processos grupais envolvem a formação e consolidação da identidade dos grupos, um fenômeno que surge das interações entre seus membros, moldando a coesão e o senso de pertencimento. Segundo Pivetta e Isaia (2014), a vida em grupo impõe particularidades que envolvem a dimensão pessoal de cada participante, onde desejos, subjetividades e objetividades são gradualmente revelados. Nesse processo, sentimentos, aspirações, autoconhecimento e comunicação entram em jogo, influenciando as interações e revelando as diferentes personalidades presentes no grupo.
Os grupos oferecem um espaço em que as aspirações e os sentimentos são explorados, permitindo que os indivíduos se conheçam e sejam reconhecidos pelos outros. De acordo com Martín-Baró (2017), foi Kurt Lewin (1951) quem introduziu o termo “dinâmica de grupo” nas ciências sociais, conferindo identidade ao estudo dos grupos no campo da Psicologia Social. Para que um conjunto de pessoas seja considerado um grupo, é necessário que haja uma interação relacional que promova um senso de unidade e propósito coletivo, como destacado por (Martín-Baró, 2003). A dinâmica grupal é o que diferencia grupos estruturados de simples aglomerações de pessoas, envolvendo vínculos sociais que direcionam o comportamento dos membros.
Com base na Teoria da Atividade de Davidov, as dinâmicas de grupo são desenhadas com o propósito de promover o desenvolvimento intelectual e sociopsicológico dos participantes (Alberti et al., 2014). Ao facilitar a comunicação e a autoexploração, as dinâmicas grupais não apenas refletem a diversidade das personalidades envolvidas, mas também ajudam a superar limitações pessoais e a promover o crescimento coletivo. Segundo Pivetta e Isaia (2014), a vida em grupo é uma oportunidade de desenvolvimento pessoal, ao enfrentar as diferentes dimensões da experiência humana.
Além disso, as dinâmicas de grupo aplicadas no ensino-aprendizagem promovem a aprendizagem coletiva, incentivando a criatividade, o trabalho em equipe e melhorando as relações interpessoais (Alberti et al., 2014). Gonzaga e Brino (2021) apontam que os grupos funcionam como potencializadores de fatores de proteção e promovem redes de apoio, sendo essenciais para a prevenção e promoção da saúde no contexto coletivo.
O Processo grupal conhecido também como dinâmica psicossocial é essencial para o funcionamento eficaz de qualquer grupo. Ao compreender e gerenciar as relações de poder e as interações entre os membros, é possível promover um ambiente mais harmonioso e produtivo, beneficiando a todos os participantes (Pereira et al., 2016).
Outro elemento central nos grupos é a liderança. O papel da liderança, que se revela na condução do grupo e na influência sobre o comportamento e as decisões coletivas. As lideranças podem ser exercidas de diversas formas e estilos, impactando diretamente o engajamento dos membros e sua participação nas dinâmicas grupais. O líder desempenha um papel essencial ao direcionar e motivar os membros do grupo, influenciando-os a se alinhar com as metas e objetivos estabelecidos. Nesse contexto, liderança pode ser entendida como a capacidade de influenciar pessoas para alcançar resultados desejados, conforme observado por (Robbins et al., 2010).
No contexto digital, Maluly e Venancio (2020), com base na visão de Freud, descreve os líderes como figuras carismáticas que influenciam as massas por meio de identificação e imitação. Essa relação de liderança oferece uma recompensa psíquica tanto para o líder quanto para os seguidores, criando uma dinâmica complexa que fortalece a conexão do grupo.
Os processos grupais e as dinâmicas de grupo desempenham um papel crucial no desenvolvimento tanto individual quanto coletivo. A interação entre os membros, a liderança exercida e as dinâmicas estabelecidas são fatores determinantes para o sucesso e a coesão dos grupos. Lideranças eficazes conseguem influenciar positivamente os comportamentos, promovendo um ambiente harmonioso, produtivo e alinhado com os objetivos do grupo. No contexto digital, o papel da liderança se expande, exercendo uma influência profunda sobre as massas, reforçando a importância de uma liderança consciente e voltada para o bem-estar coletivo.
Aproveitar o tempo de espera de forma produtiva pode transformar uma experiência potencialmente frustrante em uma oportunidade de aprendizado e crescimento pessoal. Isso não só melhora a experiência do paciente na unidade de saúde, mas também pode reduzir a ansiedade associada ao tempo de espera.
Bem-Estar Físico e Saúde Mental
A saúde mental é um aspecto fundamental do bem-estar geral, influenciando diretamente a qualidade de vida e a capacidade de enfrentar desafios cotidianos. Segundo Barbosa (2020), a saúde mental não se caracteriza apenas pela ausência de transtornos psiquiátricos, mas também pelo desenvolvimento de habilidades de adaptação, resiliência e um funcionamento psicossocial satisfatório.
Em um mundo em que o estresse, a ansiedade e outras condições de saúde mental estão se tornando cada vez mais comuns, é essencial que todos tenham acesso a estratégias eficazes para lidar com essas questões. A atuação do psicólogo na saúde pública, destacada por Bien e Barroco (2020), vai além dos atendimentos individuais, promovendo grupos na Atenção Básica de Saúde (ABS) para fortalecer os vínculos afetivos e comunitários e oferecer apoio em situações de vulnerabilidade, conforme preconizado pelo Conselho Federal de Psicologia (CFP, 2019).
As intervenções grupais que utilizam o lúdico, segundo Stoffer (2023) criam um espaço propício para reflexão, permitindo a análise prévia das ações em interação com outras pessoas. Isso facilita a construção coletiva e o compartilhamento de diferentes perspectivas, contribuindo para o desenvolvimento social.
Com base nas análises de Stoffer, entende-se que o lúdico desempenha um papel crucial no desenvolvimento social ao oferecer um ambiente que promove a interação e a troca de ideias entre os indivíduos. Ao possibilitar uma reflexão antecipada sobre as ações, o lúdico não só facilita a construção coletiva de conhecimentos, mas também fortalece o entendimento e o respeito pelas diferentes perspectivas dentro do grupo. Esse processo, ao estimular o compartilhamento e a colaboração, contribui significativamente para o crescimento social e interpessoal dos participantes, mostrando que o lúdico vai além do entretenimento e se torna uma ferramenta importante no desenvolvimento humano (Stoffer, 2023).
A dinâmica lúdica do Bem-Estar físico incentiva a interação entre os participantes, promovendo um senso de comunidade e apoio mútuo. Reconhecer que outros enfrentam desafios similares e compartilhar estratégias pode fortalecer a sensação de não estar sozinho e de ter uma rede de apoio disponível.
Conforme Sousa, Farinha e Silva (2022), as intervenções terapêuticas grupais se destacam no campo da atenção psicossocial, especialmente no acompanhamento e na assistência a indivíduos que enfrentam problemas relacionados ao uso abusivo de álcool e outras drogas. Essas intervenções oferecem benefícios significativos ao promover fluidez nos processos de trabalho e estimular ações colaborativas entre diferentes profissionais.
Ao criar um ambiente propício para a exploração de dinâmicas, essas intervenções contribuem para o desenvolvimento de estratégias criativas de enfrentamento de problemas, proporcionando também um espaço para tranquilidade e relaxamento para os usuários dos serviços de saúde (Sousa et al., 2022). Dessa forma, as atividades interventivas tem como objetivo proporcionar conforto e otimização do tempo de espera dos pacientes, alterando positivamente sua experiência e evitando a sobrecarga do serviço. Busca promover a interação social, apoio mútuo e equipar os participantes com técnicas práticas para fortalecer a resiliência e melhorar a saúde mental.
Disponibilizar aos participantes técnicas de resiliência proporcionam o gerenciamento do tempo e aumentam sua capacidade de lidar com o tempo de espera. Isso não apenas melhora sua saúde mental, mas também pode ter efeitos positivos em outras áreas de suas vidas, incluindo relacionamentos, trabalho e bem-estar físico.
Ao oferecer esta intervenção em um ambiente acessível e familiar, como a sala de espera, mais pessoas têm a oportunidade de aprender e aplicar essas técnicas em suas vidas diárias. Isso é particularmente importante para indivíduos que podem não ter acesso fácil a outros recursos de saúde mental.
MATERIAIS E MÉTODOS
A metodologia utilizada na atividade interventiva, intitulada "INTER-AGIR", objetivou implementar dinâmicas de grupo com enfoque educativo e social, utilizando técnicas lúdicas para promover o bem-estar físico e social dos participantes. Essa abordagem qualitativa e participativa seguiu os princípios descritos por Pereira (2021) e Galeffi (2009), buscando garantir a eficácia da intervenção e o respeito aos direitos dos envolvidos. Na pesquisa-intervenção, a abordagem visa acessar os processos subjacentes, o que ocorre entre os estados ou formas estabelecidas, buscando explorar a energia potencial presente nesses contextos (Passos e Barros, 2015).
A combinação dessas abordagens, qualitativa e participativa, proporciona uma base sólida para a realização da Atividade Interventiva sobre dinâmicas de grupo na perspectiva Educativa e Social. Ao adotar métodos qualitativos foi possível explorar em profundidade as experiências e necessidades dos participantes, enquanto a abordagem participativa garante a participação ativa em todas as etapas do processo.
Após a aprovação da coordenação do CAPS AD III, a atividade foi planejada e aberta à participação de todos os usuários que se encontravam na sala de espera. O objetivo era transformar o período ocioso de espera em um momento de descontração e interação social.
Lócus da pesquisa
Este estudo foi desenvolvido no CAPS AD III Regional Serrinha - BA, localizado à Rua João Barbosa, 523 – Vaquejada. A estrutura física da unidade conta com três salas para atendimentos ambulatoriais, uma farmácia, uma enfermaria, uma recepção, duas salas de espera, uma cozinha, um refeitório para funcionários, um refeitório para os usuários, uma sala para oficinas e grupos, seis leitos para acolhimento 24 horas, uma sala de coordenação, quatro banheiros, dois confortos para profissionais plantonistas, além de uma área livre para atividades e uma horta.
Participantes
O público-alvo da ação foi composto por usuários do serviço e seus respectivos acompanhantes que estavam na sala de espera aguardando atendimento. A ação foi realizada no dia 09 de julho de 2024, às 14h, com um total de 18 pessoas presentes. Desse total, 12 usuários e acompanhantes decidiram participar da atividade, enquanto 6 optaram por não participar.
Dinâmicas Aplicadas
Inicialmente, foram planejadas duas dinâmicas lúdicas. A primeira consistiu em uma sessão de forró, aproveitando o contexto junino, com o objetivo de proporcionar um momento recreativo e musical. No entanto, a adesão a essa proposta foi baixa, sendo registrada apenas a participação de uma pessoa. Os demais participantes, especialmente os idosos e seus acompanhantes, demonstraram resistência em participar.
Diante da pouca adesão foi proposta uma segunda dinâmica, denominada "Mão no Bis". Antes do início da atividade, as facilitadoras explicaram o objetivo da dinâmica, apresentaram os comandos verbais que seriam utilizados e realizaram uma demonstração para assegurar o entendimento por parte dos participantes. A dinâmica consistia em seguir comandos aleatórios, como "mão na cabeça", "mão no ombro", "mão no nariz", entre outros, até o comando final "mão no Bis", que indicava que os participantes deveriam pegar o chocolate Bis colocado em uma cadeira entre eles. A atividade foi conduzida até que todos os participantes conseguissem pegar o chocolate.
Para os usuários que não participaram da atividade, por estarem aguardando transporte ou por motivos de saúde, o chocolate foi distribuído ao final da dinâmica. A ação foi avaliada positivamente pelos presentes, que sugeriram a realização de novas atividades em momentos futuros. A equipe de profissionais do CAPS AD III também demonstrou interesse e envolvimento durante a realização das dinâmicas.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
Os resultados e discussões apontam que a dinâmica de grupo desempenha um papel crucial no desenvolvimento social, emocional e intelectual dos participantes. A concepção de Kurt Lewin (1951) sobre "dinâmica de grupo", como citado por Martin-Baró (2017), introduziu uma base teórica sólida que, ao longo do tempo, foi amplamente expandida e aplicada em diversos contextos, como educação, saúde e intervenções psicossociais.
A experiência destacou a importância de uma abordagem flexível e adaptável, que considere as características individuais dos participantes. Os achados de Alberti et al. (2014) sublinham que as atividades de grupo precisam ser planejadas, monitoradas e avaliadas estrategicamente, a fim de promover criatividade, produtividade e coesão social.
O trabalho em equipe, embasado pela Teoria da Atividade de Davidov, mostrou-se eficaz com a interação e troca de ideias entre os participantes são facilitadas, promovendo superação de limitações pessoais e no fortalecimento das relações interpessoais, como corroborado por (Pivetta e Isaia, 2014). A continuidade e aprimoramento dessas dinâmicas lúdicas no CAPS ADIII é essencial, e o envolvimento dos participantes no processo de sugestão de futuras atividades pode aumentar significativamente o engajamento e a eficácia das intervenções.
O grupo, portanto, é um espaço de construção coletiva, no qual os sentimentos, desejos e aspirações dos participantes emergem e se integram ao processo de desenvolvimento pessoal e social, sentimentos, autoconhecimento, influenciando as interações grupais, como posto por (Pivetta e Isaia, 2014).
No campo da saúde mental, Gonzaga e Brino (2021) destacam o potencial das atividades grupais para criar redes de apoio, funcionando como ferramentas essenciais de promoção de saúde e prevenção de doenças. As dinâmicas grupais não apenas incentivam a troca de ideias e o apoio mútuo, mas também oferecem aos participantes um ambiente propício para o fortalecimento emocional e o desenvolvimento de resiliência, aspectos centrais para o bem-estar coletivo.
Ainda nesse sentido, Pereira, Gouveia e Corsino (2016) reiteram que a realização de atividades grupais propicia um ambiente mais harmonioso, em que também é possível a compreensão acerca da interação entre os membros e hierarquização das relações, assim, todos os participantes do grupo seriam beneficiados.
As intervenções lúdicas, conforme descrito por Stoffer (2023), mostraram ser eficazes no fomento à interação social e à reflexão coletiva. O uso do lúdico cria um espaço de troca de perspectivas que enriquece as experiências grupais e contribui para o crescimento social dos participantes. No contexto do CAPS AD, a introdução de atividades lúdicas teve um impacto positivo, promovendo um ambiente mais relaxante e colaborativo, conforme observado por (Costa et al., 2018).
No que diz respeito à atenção psicossocial, Souza et al. (2022) enfatizam a eficácia das intervenções terapêuticas grupais, especialmente no acompanhamento de indivíduos com histórico de abuso de substâncias. Essas intervenções não apenas auxiliam na recuperação, mas também oferecem um espaço seguro para o desenvolvimento de estratégias de enfrentamento criativas. A adaptação das atividades às necessidades dos participantes, como demonstrado na experiência descrita, contribui para a inclusão e o sucesso das intervenções, garantindo que todos se sintam acolhidos e respeitados.
Segundo Pichon-Rivière (2005), a participação ativa e o engajamento dos membros do grupo são cruciais para o desenvolvimento de uma dinâmica saudável e produtiva. Essa perspectiva foi confirmada durante a atividade, onde a interação direta e a adaptação contínua às necessidades dos participantes foram determinantes para o sucesso da intervenção. Além disso, Alexandre (2002) sugere que o facilitador deve estar atento às reações e feedbacks dos participantes, ajustando as atividades conforme necessário para manter um ambiente inclusivo e acolhedor.
Pichon-Rivière (2005) e Alexandre (2002) apontam a importância de uma abordagem crítica e reflexiva sobre as dinâmicas grupais. A capacidade de adaptação às dinâmicas emergentes, mencionada por esses autores, foi confirmada durante as intervenções realizadas no CAPS AD, em que o feedback instantâneo dos participantes permitiu ajustes em tempo real, garantindo a inclusão de todos e mantendo o ambiente acolhedor e produtivo.
A aplicação dessas intervenções em contextos como salas de espera, conforme sugerido por diversas pesquisas, otimiza o tempo ocioso dos pacientes, proporcionando uma experiência positiva e reduzindo a ansiedade associada à espera por atendimento.
De acordo com Costa, Silva e Silveira (2018), as intervenções em grupo durante o estágio de processos grupais requerem a habilidade do psicólogo para adaptar-se às dinâmicas emergentes, garantindo a eficácia e a relevância das atividades propostas.
Assim, os resultados demonstram que as dinâmicas de grupo, especialmente quando integradas a intervenções lúdicas e terapêuticas, são poderosas ferramentas de promoção de saúde mental e bem-estar físico. Elas fortalecem os vínculos comunitários, oferecem suporte emocional e capacitam os participantes a lidar de forma mais eficaz com os desafios do cotidiano, criando um impacto positivo e duradouro em suas vidas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A prática no CAPS AD evidenciou que o uso de atividades lúdicas em grupos é altamente benéfico para a saúde mental e o bem-estar físico dos participantes. As intervenções lúdicas criam um ambiente colaborativo e de troca de ideias, permitindo uma reflexão crítica que contribui para o desenvolvimento social e emocional dos envolvidos. A possibilidade de adaptação e personalização dessas atividades, baseada nos feedbacks dos participantes, também se mostrou crucial para garantir a inclusão e o sucesso das intervenções.
Além disso, as intervenções terapêuticas grupais revelaram-se eficazes no contexto da atenção psicossocial, particularmente no acompanhamento de indivíduos com histórico de uso abusivo de substâncias. Essas dinâmicas não apenas proporcionam tranquilidade e relaxamento, mas também auxiliam na criação de estratégias de enfrentamento para problemas cotidianos.
A aplicação contínua dessa metodologia no CAPS AD sugere que, ao considerar as características e necessidades dos participantes, é possível promover um ambiente mais acolhedor e eficaz. As dinâmicas de grupo, quando bem conduzidas, fortalecem as redes de apoio emocional e comunitário, promovendo resiliência e um impacto positivo duradouro nas vidas dos participantes.
Durante a execução da atividade, ficou evidente a necessidade de adaptar a abordagem para atender às diversas expectativas e limitações dos participantes. Por exemplo, um idoso mencionou dores na coluna e não se mostrou disponível para poder participar ativamente, enquanto um casal recusou a participação por estar de saída e não ouvir o ritmo proposto na atividade, relatando depois de ser indagado só ouvir apenas músicas evangélicas. Esses feedbacks instantâneos permitiram ajustar a dinâmica em tempo real, mantendo a inclusão e o respeito às preferências dos presentes. A interação com os participantes foi fundamental para o sucesso da atividade, pois possibilitou compreender melhor suas necessidades e expectativas, resultando em uma experiência mais positiva para todos.
A proposta de segmentar o relato em descrições informativa, referenciada, dialogada e crítica contribuiu significativamente para a compreensão do relato de experiência como uma modalidade de escrita acadêmica importante para a produção do conhecimento. Essa estrutura permitiu uma análise detalhada e reflexiva da atividade, destacando seus pontos fortes e áreas de melhoria. Em futuras ações, a aplicação desse modelo de relato poderá melhorar ainda mais as intervenções científicas e profissionais, proporcionando uma base sólida para o desenvolvimento de práticas mais eficazes e inclusivas no contexto de saúde mental.
Propostas para Futuras Atividades com base nas sugestões dos participantes, futuras atividades lúdicas poderão incluir: sessões de música e dança de diferentes estilos para atender a diversas preferências, atividades físicas leves que sejam acessíveis a todos, inclusive idosos com limitações físicas, momentos de reflexão e diálogo para fortalecer o apoio mútuo e a compreensão entre os participantes, quiz de perguntas e respostas (sugestão de um dos usuários do CAPS).
A aplicação contínua dessa metodologia garantirá que as intervenções no CAPS AD sejam cada vez mais inclusivas, eficazes e alinhadas às necessidades e expectativas dos usuários, promovendo um ambiente de espera mais agradável e acolhedor.
Para o futuro, recomenda-se que as intervenções grupais continuem sendo adaptadas e aprimoradas com base nos interesses e nas necessidades dos participantes, garantindo que as atividades sejam cada vez mais inclusivas e eficazes. Assim, as dinâmicas de grupo podem continuar a desempenhar um papel crucial na promoção da saúde mental e do bem-estar coletivo.
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[1] CAPS AD III consiste num equipamento da Rede SUS.