Seção Livre

BABEL, Alagoinhas - BA, 2021, v. 11: e12851.

ANTUNES, Gabriel Machado; SPECHT, André Luís. O cinema no ensino de língua inglesa baseado em tarefas: o desenvolvimento de um ciclo de tarefas utilizando o gênero filme-carta. Babel: Revista Eletrônica de Línguas e Literaturas Estrangeiras, 2021, v. 11, e12851.

O cinema no ensino de língua inglesa baseado em tarefas: o desenvolvimento de um ciclo de tarefas utilizando o gênero filme-carta

The cinema in the task based English teaching: the development of a task cycle using the film-letter genre

Gabriel Machado Antunes
André Luís Specht

Resumo: Esta pesquisa teve como objetivo refletir sobre o desenvolvimento de um ciclo de tarefas (ELLIS, 2003, 2006), que busca trabalhar com o cinema em sala de aula de língua inglesa. Acredita-se que o Ensino de Línguas Baseado em Tarefas (ELBT) possa auxiliar a explorar o cinema em sala de aula de maneira a potencializar o desenvolvimento das habilidades comunicativas dos aprendizes de língua inglesa. Para tanto, foi escolhido o gênero cinematográfico filme-carta que compôs a tarefa principal do ciclo, servindo também como base para a sua criação. Após desenvolvido, o ciclo foi avaliado por futuros professores de Letras Inglês acerca da sua aplicabilidade. Os resultados desta pesquisa nos ajudaram a entender os potenciais do ELBT no ensino de língua inglesa e, ainda, analisar a eficácia do uso do cinema como uma ferramenta pedagógica a partir da abordagem de tarefas.

Palavras-chave: Cinema. Ciclo de tarefas. Ensino de língua inglesa.

Abstract: This article analyzes the development of a task cycle (ELLIS, 2003, 2006), which intends to work with cinema in the English Language classroom. We believe that the Task-Based Language Teaching (TBLT) can assist in exploring the use of cinema in the classroom to enhance the development of communication skills. Therefore, we chose the cinematographic genre film-letter to be part of the main task of the cycle of tasks. After its design, the future English teachers could assess the task cycle. The results helped us understand the potentials of TBLA in English language teaching and, even more, analyze the effectiveness of using cinema as a pedagogical tool through tasks.

Keywords: Cinema. Cycle of tasks. English language teaching.

Introdução

O uso de materiais autênticos no ensino e aprendizagem de línguas estrangeiras surgiu com o advento da abordagem comunicativa no final da década de 70 (JOY, 2011). Percebeu-se ali a necessidade de trazer para a sala de aula textos (orais ou escritos) presentes no nosso dia a dia, que não tivessem sido criados para fins pedagógicos. Esses textos, diferentes daqueles que têm a sua linguagem alterada para sala de aula, trazendo exemplos de linguagem não manipulada pedagogicamente, ajudariam os alunos a melhor desenvolver sua competência comunicativa a partir de experiências de aprendizagem mais significativas, possibilitando-os, assim, a interagir na língua alvo fora de sala de aula.

Exemplos de materiais autênticos são filmes e séries, que fazem parte das aulas de língua; entretanto, muitas vezes são usados para explorar questões estruturais de língua, deixando outros potenciais de lado, como questões temáticas que podem ser exploradas de forma crítica. É possível encontrar em livros e em sites da internet, por exemplo, muitas atividades com filmes e séries que usam cenas para explorar questões de pronúncia e de gramática. O uso de tais atividades tem o seu lugar na sala de aula, porém, muitas vezes, a mensagem da cena, que pode trazer questões culturais, estéticas e críticas, não é explorada, deixando de lado o uso significativo da língua. Araujo e Voss (2009) explicam como as produções cinematográficas podem ser trabalhadas, extrapolando a dimensão linguística estrutural.

Trabalhamos os filmes como acionadores cognitivos por mobilizarem os sentimentos do aluno, identificado com o enredo, as tramas e os personagens. O sucesso dessa estratégia depende do quanto os alunos apreendem os aspectos estruturais e semânticos da língua e de quanto o filme é capaz de realizar o processo de identificação/projeção do aluno com o personagem e seus valores. Se assim acontecer, o aluno revelará uma capacidade crítica quanto aos temas transversais implíticos no filme e, ao mesmo tempo, perceberá que enriqueceu seu vocabulário (ARAUJO; VOSS, 2009, p. 129).

Como tentativa de refletir e pensar o uso de filmes e séries, de maneira a não limitar o trabalho às estruturas linguísticas unicamente, acreditamos que a abordagem de ensino e aprendizagem baseada em tarefas (ELLIS, 2003) pode auxiliar no trabalho com o material cinematográfico. A tarefa como constituinte principal da abordagem é definida como um plano de trabalho que tem o seu enfoque principal no significado pragmático da língua. Isso faz com que o aluno possa atingir níveis cognitivos mais complexos, aumentando as chances que a aprendizagem da língua alvo aconteça. Levando em consideração as complexidades cognitivas e linguísticas que uma tarefa pode ter, Skehan (1996, 1998) propôs um esquema de criação e implantação de um ciclo de tarefas, que além da tarefa, conta com pré- e pós-tarefas. A primeira precede a tarefa e prepara o aluno em questões linguísticas e cognitivas e a segunda reforça conteúdo e formas que foram trabalhadas na tarefa principal.

Considerando o exposto acima, este artigo tem o intuito de apresentar uma pesquisa de iniciação científica que teve como objetivo principal desenvolver um ciclo de tarefas para trabalhar com o cinema em sala de aula de língua inglesa, baseado no esquema teórico-metodológico proposto por Ellis (2003, 2006) e Skehan (1996, 1998). Mais especificamente, a pesquisa busca também refletir acerca da aplicabilidade do ciclo de tarefas, desenvolvido a partir da percepção de seis (futuros) docentes de língua inglesa. Nas próximas seções, apresentamos a revisão de literatura, seguida pela metodologia, resultados e discussões e considerações finais.

Revisão de literatura

O ELBT é uma abordagem de ensino de línguas que emergiu da Abordagem Comunicativa (LIN, 2020). Ambas prezam pela aprendizagem da língua por meio da comunicação, de materiais autênticos, de enfoque na língua e no processo de aprendizagem, entre outros. Entretanto, o ELBT conta com o construto da tarefa e do ciclo de tarefa, que são a base da abordagem. A tarefa é a estrutura teórico-metodológica utilizada para se ensinar a língua, ou seja, um plano de trabalho criado para chegar ao objetivo esperado do ensino-aprendizado de língua (ELLIS, 2003). Mas antes de explicar quais são os processos que um ciclo possui, é necessário pensar e esclarecer qual é a definição de tarefa utilizada como foco nesta pesquisa, considerando que existem várias definições disponíveis.

De acordo com Nunan (2004), existem diversas definições de tarefa, desde atividades cotidianas, que não são pedagógicas, como por exemplo: pintar uma cerca, comprar pão, cortar a grama, escrever uma carta etc., até as específicas para a sala de aula (pedagogical tasks). Entretanto, mesmo entre as definições de tarefa que abrangem a parte pedagógica existe complexidade e há especificidades em cada uma. Breen (1987), por exemplo, define tarefa como:

[...] qualquer empenho de aprendizagem de língua estruturado que tenha um objetivo particular, conteúdo apropriado, um procedimento de trabalho especificado e uma gama de resultados para aqueles que realizam a tarefa. 'Tarefa' é, portanto, assumido para se referir a uma gama de planos de trabalho que têm o propósito geral de facilitar a aprendizagem de línguas - desde um exercício simples e breve, até atividades mais complexas e demoradas, como resolução de problemas em grupo ou simulações e tomada de decisão (BREEN, 1986, p. 23 citado por NUNAN, 2004, p. 3) (tradução dos autores).

Dois pontos interessantes que podemos destacar da definição de tarefa trazida por Breen são que ele identifica: (i) as tarefas como planos de trabalhos com objetivos, conteúdos apropriados, procedimentos especificados e (ii) a diversidade de tipos de tarefas como simples e mais complexas, sendo as últimas relacionadas à processos cognitivos mais complexos. Entretanto, sua definição é bastante abrangente, o que pode ser problemático para professores que queiram trabalhar com tarefas em suas salas de aula e para pesquisadores que queiram pesquisar sobre tarefas.

A definição de Nunan (2004, p. 4, tradução nossa) nos permite entender questões mais específicas da tarefa. Para ele, a tarefa leva os alunos a “[...] compreender, manipular, produzir ou interagir na língua-alvo enquanto sua atenção está focada em mobilizar seu conhecimento gramatical para expressar significado, e em que a intenção é transmitir significado ao invés de manipular a forma [...]”. O foco no significado foi enfatizado, mas ainda assim não nos permite ter uma base para a criação de um ciclo de tarefa em termos de pesquisa. Um dos motivos para existirem várias definições de tarefa se deve às perspectivas teóricas dos pesquisadores, alguns deles focam na sala de aula, enquanto outros em processos cognitivos de aprendizagem, por exemplo. Uma definição, entretanto, que consegue abarcar diversas características que uma tarefa deve ter e que acreditamos facilitar o desenvolvimento de tarefas é a definição de Ellis (2003). De acordo com o autor:

Uma tarefa é um plano de trabalho que requer que os alunos processem a linguagem de forma pragmática para alcançar um resultado que pode ser avaliado em termos de se o conteúdo proposto foi transmitido corretamente ou apropriadamente. Com isso, exige que eles deem atenção primária ao significado e façam uso de seus próprios recursos linguísticos, embora o design da tarefa possa predispô-los a escolher formas particulares. Uma tarefa tem como objetivo resultar em um uso da linguagem que tenha uma semelhança, direta ou indireta, com a forma em que a linguagem é usada no mundo real. Como outras atividades de linguagem, uma tarefa pode envolver habilidades produtivas ou receptivas, orais ou escritas e também vários processos cognitivos (ELLIS, 2003, p. 16) (tradução e grifo dos autores).

Nesse sentido, uma tarefa, para Ellis (2003), é um plano de trabalho pensado para que o aluno consiga utilizar os seus recursos linguísticos dentro de um contexto comunicativo, ou seja, o foco primário é no significado pragmático [1]. A linguagem utilizada na tarefa precisa ter uma semelhança com aquela usada no dia a dia, podendo ser trabalhadas as habilidades linguísticas: compreensão e produção oral, leitura e escrita. Processos tais como tomada de decisão, utilização de recursos atencionais, entre outros são exemplos de processos cognitivos que uma tarefa pode possuir.

Existem muitos exemplos de tarefas que se encaixam na definição trazida por Ellis (2003). Citamos aqui alguns: a narração de uma história em quadrinhos (SPECHT; D’ELY, 2020), a leitura do primeiro capítulo do livro Harry Potter e a Pedra Filosofal (AFONSO, 2014); a contação da história infantil The three little pigs (SPECHT; MENDES, 2021), entre outros.

Considerando que a tarefa é complexa por natureza e dependendo do seu nível de complexidade e do contexto em que será implementada, é necessário pensar pedagógica e metodologicamente o seu uso em sala de aula. Esse trabalho pode ser realizado a partir de uma estrutura metodológica de implementação de tarefas (SKEHAN, 1996; 1998), que conta com dois componentes extras: a pré-tarefa e a pós-tarefa.

Portanto, temos como base que o ciclo contém 3 (três) fases, sendo elas: a pré-tarefa, a tarefa e a pós-tarefa. Seguindo esse conjunto, o ciclo de tarefas são os estágios que conduzem os alunos para que desenvolvam os objetivos específicos esperados pelo professor que a criou. Cada fase do ciclo tem a sua importância para o aprendizado do aluno ao final da tarefa, portanto, com isso, a pré-tarefa é a fase do caminho de preparação do aluno para a realização da tarefa. As pré-tarefas podem e devem auxiliar em vários sentidos, principalmente em questões linguísticas e cognitivas, podendo haver mais de uma, a depender das características que a tarefa principal tenha e o contexto em que será aplicada. Por isso, quanto mais complexa a tarefa for, mais longo é o processo de preparação linguística e cognitiva do aluno. Como exemplos de pré-tarefas, Ellis (2006) cita (a) a realização de uma tarefa similar, (b) a apresentação de um modelo, (c) a utilização de atividades 'não-tarefas' e (d) o planejamento estratégico.

Quais pré-tarefas deverão ser usadas também depende da análise que o professor/pesquisador fará da tarefa principal. Na narração de uma história em quadrinhos com alunos com nível pré-intermediário de língua, dar um tempo para o aluno planejar o que vai narrar (planejamento estratégico) é uma tarefa bastante utilizada. Tal pré-tarefa pode auxiliar o aluno a liberar mais recursos atencionais enquanto narra a história, podendo assim utilizar esse recurso extra para focar na produção oral (ELLIS, 2005; SKEHAN, 2014).

A fase da tarefa, isto é, o momento no qual o aluno vai utilizar de todos os recursos que lhe foram oferecidos na fase da pré-tarefa, pode ser manipulada pedagogicamente para deixar a tarefa menos ou mais complexa (ELLIS, 2006). Por exemplo, para a narração de uma história, o professor pode ou não permitir que o aluno tenha em mãos a história em quadrinhos e/ou o rascunho que ele usou para se preparar. O professor também pode estipular um limite menor ou maior de tempo para o aluno se preparar para a narração da história. Tais detalhes aumentam ou diminuem a carga cognitiva que a tarefa principal vai exigir do aluno. Vale relembrar que essas decisões devem ser tomadas a partir do grupo de alunos e do contexto de ensino.

Enfim, chegamos à pós-tarefa, a última etapa do ciclo. Nessa fase, a depender das dificuldades apresentadas pelos alunos ao desenvolver as (pré)-tarefas, o professor pode optar pelo desenvolvimento de algumas pós-tarefas. Por exemplo, essa fase pode ser usada como um momento de reflexão com relação à realização da tarefa. É comum também que seja um momento de refazer a tarefa, para que assim o aluno possa perceber como foi o seu desempenho, ou então, um momento de foco na forma, em que os alunos vão praticar questões estruturais que apareceram na tarefa (ELLIS, 2006). Como na fase da pré-tarefa, pode haver mais de uma pós-tarefa. Na próxima seção, apresentamos a metodologia deste estudo.

Metodologia

Esta pesquisa, de abordagem qualitativa com cunho interpretativista, teve como objetivo geral desenvolver um ciclo de tarefas para trabalhar com o cinema em sala de aula de língua inglesa, baseado no esquema teórico-metodológico proposto por Ellis (2003, 2006) e Skehan (1996, 1998). Durante o desenvolvimento do ciclo de tarefas, buscamos refletir acerca do seu desenvolvimento e após a sua conclusão, examinamos a sua aplicabilidade a partir da percepção de seis (futuros) professores de língua inglesa, mais especificamente alunos que estão ou fizeram as disciplinas de Estágio Supervisionado em Língua Inglesa. Como a pesquisa envolvia a participação de pessoas, ela foi apreciada e aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa. Na sequência, apresentamos as duas fases necessárias para o desenvolvimento da pesquisa.

Ciclo de Tarefas - Fase 1

O enfoque desta fase da pesquisa foi no desenvolvimento de um ciclo de tarefas baseado em cinema. Antes da criação do ciclo de tarefas, seguimos os seguintes passos: refletimos acerca de 1) quem seriam os possíveis alunos que teriam contato com esse ciclo de tarefas[2]; e, 2) se um ciclo de tarefas utilizando cinema seria possível. Refletimos acerca de uma turma idealizada para a criação do ciclo, uma vez que ele precisaria ser adequado ao nível de aprendizado de inglês dos alunos. Escolhemos como base um grupo de um curso de idiomas, com alunos de nível intermediário de inglês, visto que é geralmente o grupo alvo escolhido nas pesquisas em tarefa.

Após a idealização da turma, discutimos sobre a criação da tarefa principal, atendendo a definição proposta por Ellis (2003). Definimos não utilizar um filme inteiro ou um episódio completo de uma série, mas parte de um filme ou uma cena. Tal decisão foi tomada, pois tínhamos o intuito de desenvolver uma tarefa de produção; a parte ou a cena do filme serviriam como insumo da tarefa. Após a criação da tarefa, focamos nossa atenção nas pré-tarefas que precisariam ser feitas para suprir as dificuldades que os alunos poderiam ter com questões linguísticas e/ou cognitivas. Considerando as complexidades da tarefa e as possíveis dificuldades que alunos de nível intermediário de inglês poderiam ter com ela, desenvolvemos quatro pré-tarefas que auxiliariam na realização da tarefa principal. Finalmente, com as pré-tarefas e tarefa pronta, chegamos na parte final, que são as pós-tarefas, encerrando-se, assim, a produção do ciclo de tarefas.

Fase piloto - Fase 2

Essa fase foi realizada para refletir sobre a aplicabilidade do ciclo de tarefas desenvolvido. Para isso, buscamos discentes do curso de Letras, que já tinham experiência em ensino de língua inglesa, seja profissionalmente ou por meio de estágio. Enviamos o ciclo de tarefas para que pudessem, a partir de suas visões e conhecimentos como (futuros) docentes, refletir e apontar as questões positivas ou negativas acerca do nosso ciclo de tarefas. Portanto, foi selecionada e enviada uma pasta do Google Drive contendo três arquivos: 1) o ciclo de tarefas, 2) os critérios de avaliação, e por fim, 3) um termo de consentimento e esclarecido (TCLE).

No arquivo dos critérios de avaliação foram elaboradas questões para que os (futuros) docentes pudessem deixar suas percepções e apontamentos sobre o ciclo de tarefas. As questões elaboradas e enviadas para os participantes foram as seguintes: 1) Em termos gerais, o que você achou das atividades?; 2) Você acredita que elas sejam apropriadas para um grupo de alunos de nível intermediário de uma escola de idiomas?; 3) Quais são os pontos positivos dessas atividades?; 4) Quais são os pontos negativos dessas atividades?; 4) Você tem alguma sugestão de mudança? Elas foram pensadas para que os participantes pudessem refletir na análise do material e deixar algo que contribuísse, assim, para questões pertinentes relativas à possibilidade de usar as atividades propostas e à adequação para a turma descrita.

Com isso, a partir da resposta dos participantes, tabulamos os dados a fim de melhor visualizar as diferenças e semelhanças em suas respostas, de modo a tentar compreender as sugestões e apontamentos que poderiam eventualmente contribuir na elaboração do nosso ciclo de tarefas. Esse tipo de pilotagem, faz com que consigamos refletir por meio da avaliação de outros profissionais da área, se as tarefas possuem as características esperadas ou se há alterações a serem feitas.

Resultado e análise

Iniciaremos esta seção apresentando e analisando o desenvolvimento e a criação do ciclo de tarefas e, na sequência, apresentaremos e discutiremos os resultados dos questionários aplicados aos participantes.

Ciclo de tarefas

Como apresentado na parte metodológica da pesquisa, nesta pesquisa, desenvolvemos um ciclo com quatro pré-tarefas, uma tarefa e uma pós-tarefa. Na tabela 1, podemos visualizar o ciclo de tarefas, junto com os objetivos de cada etapa.

Pré-tarefa 1 Apresentar aos alunos a sinopse do filme a ser trabalhado.
Pré-tarefa 2 Despertar a reflexão sobre experiências de vida por meio do cinema.
Pré-tarefa 3 Compreender e refletir sobre a estrutura do gênero textual carta.
Pré-tarefa 4 Apresentar aos alunos o gênero cinematográfico filme-carta.
Tarefa Assistir a cena do filme “The Perks of Being a Wallflower” em que o personagem deixa uma carta narrada aos telespectadores, e produzir um filme-carta como resposta ao personagem.
Pós-tarefa Assistir os curta-metragens produzidos.

Tabela 1 – Ciclo de tarefas
Fonte: Tabela elaborada pelos autores

Primeiramente, pensamos no desenvolvimento da tarefa principal para podermos definir as pré-tarefas já tendo conhecimento de quais poderiam ser as demandas linguísticas e cognitivas exigidas. A tarefa pensada para esse ciclo é composta de dois momentos. Primeiramente, os alunos devem assistir à cena do filme The Perks of Being a Wallflower, dirigido por Stephen Chbosky, em que o personagem Charlie deixa uma carta para o leitor. Na sequência, os alunos devem responder a essa carta, produzindo um filme-carta.

Essa tarefa requer que os alunos se engajem em variados processos cognitivos, como a interpretação de texto e a tomada de decisão sobre o que vai ser falado. É um plano de trabalho pensado para processar a língua de um contexto de uso comunicativo, utilizando, assim, a língua em um contexto real. É uma tarefa que envolve uma situação do cotidiano de alguém que está enviando uma carta/mensagem para um colega e, embora um filme-carta exija mais do que uma simples mensagem para um colega, a tarefa pode ainda assim ser associada às situações do mundo real. Para completar a tarefa, os alunos podem/devem usar os próprios conhecimentos linguísticos com foco primário no significado, tendo que se engajar em habilidades receptivas e produtivas, pois, inicialmente, assistirão à cena do filme e depois gravarão o seu próprio filme-carta, tudo na língua alvo. Todas essas características vão ao encontro da definição de tarefa trazida por Ellis (2003).

Além de conhecerem o gênero, os alunos terão a oportunidade de se tornar protagonistas e produtores dos próprios filmes. O filme-carta não é um gênero muito conhecido, mas pode ser utilizado para explorar o lado subjetivo e reflexivo dos alunos, além da parte linguística. Em termos pedagógicos, o gênero apresenta mais facilidades para ser trabalhado em sala de aula, pois “o filme-carta estabelece uma relação singular com a tecnologia. Longe de ter que atender a um padrão, ele é facilmente adaptável à diferentes tecnologias” (MIGLIORIN, 2014, p. 9). Dessa maneira, não precisamos recorrer ao uso de equipamentos cinematográficos com maior qualidade, o que dificulta bastante a produção dos filmes, ainda mais em sala de aula. O aluno pode fazer uso do seu próprio aparelho celular ou de webcam. Como exemplifica Migliorin (2014, p. 9), “[...] uma carta pode ser escrita em um guardanapo, sem com isso perder qualquer valor”, e com o filme-carta não é diferente, é possível que o aluno consiga fazer o próprio filme, sem necessitar de equipamentos de alta definição.

Por não exigir muito dos alunos em termos de tecnologia, podemos ter um foco maior no uso da língua, e também na subjetividade e criatividade do aluno utilizando o cinema. A cena do filme abre espaço para que seja possível explorar reflexões sobre experiências de vida na sala de aula, fazendo com que os alunos sejam protagonistas, se expressando no seu próprio filme.

Diante da tarefa apresentada, podemos, então, entender que o cinema consegue dialogar com o ensino de língua, a partir do uso de tarefas. É possível pensar no desenvolvimento de um ciclo de tarefas baseado em cinema, pois é um gênero que agrega; pensando em ensino-aprendizagem de uma língua estrangeira, o cinema se baseia e reflete a vida real, ou seja, (re)constrói imagens e vivências presentes no cotidiano. Como ressaltam Araujo e Voss:

Em razão do processo de projeção/identificação, o aluno é capaz de reconhecer, na tela, na contextualização dos diálogos em cenas que imitam a realidade, a própria experiência pessoal, o que torna possível a compreensão num nível muito além dos aspectos estruturais da língua. Isto é, de forma pragmática, o aluno aprende como agir em contextos parecidos, e que cada escolha envolve valores (ARAUJO; VOSS, 2009, p. 122).

Portanto, essa ligação de contexto de vida real e o enfoque no significado pragmático de língua são as características que fazem a ponte de diálogo do cinema com a abordagem de tarefas, a nosso ver. Esse aspecto enriquece o ensino justamente por essa similaridade com as situações reais de uso de língua. Ambos mostram pontos positivos para o ensino-aprendizado de línguas, e com isso, juntá-los é algo que pode ter um resultado positivo.

Afonso (2014) obteve resultados positivos ao trabalhar com a literatura a partir do conceito de tarefa. Sua tarefa principal era a leitura do primeiro capítulo do primeiro livro do Harry Potter. Depois de aplicar o seu ciclo de tarefas para alunos do ensino fundamental, ela concluiu que houve momentos estratégicos para a aprendizagem da língua inglesa e para o engajamento dos alunos.

Após a criação da tarefa principal, analisamos as suas demandas linguísticas e cognitivas e como poderíamos resolvê-las a fim que os alunos conseguissem de fato realizar a tarefa. É necessário que o(a) professor(a) esteja atento esteja atento(a) ao nível de complexidade da tarefa, pois se ela ultrapassar os recursos cognitivos e linguísticos dos alunos, os mesmos podem acabar se frustrando ao realizar a tarefa (NUEVO, 2006, p. 22). Diante disso, observamos que os alunos pudessem precisar de ajuda nas seguintes questões: conhecer o gênero filme-carta, observar a estrutura de uma carta, refletir sobre produção, conhecer o filme utilizado e refletir sobre experiências de vida. Partindo dessa análise, desenvolvemos, então, quatro pré-tarefas para preparar os alunos para a tarefa principal.

A primeira pré-tarefa (tabela 1) foi pensada para ajudar os alunos a se familiarizar com o filme que será trabalhado na tarefa principal, uma vez que terão que responder ao personagem com um filme-carta. A pré-tarefa é composta por duas etapas, a primeira é refletir sobre como os filmes eram escolhidos e consumidos antigamente, dando exemplo das locadoras. A partir desse contexto, seria apresentado o gênero sinopse, que é o texto usado pelas pessoas para saber do que trata um filme antes de decidir assisti-lo de fato. Essa primeira etapa serve de contextualização para os alunos lerem a sinopse do filme alvo, que é a segunda etapa da pré-tarefa. Assim, os alunos conhecem a sinopse do filme, ao mesmo tempo que se engajam nas habilidades de leitura. Ao final da leitura, é proposto que os alunos respondam quatro perguntas refletindo acerca da compreensão da sinopse do filme.

A segunda pré-tarefa (tabela 1) contextualiza os alunos para lidarem com a temática que aparece na cena: a reflexão de experiência de vida, o que será de grande importância para a tarefa principal, uma vez que os alunos precisarão escrever sobre as suas próprias experiências. Essa pré-tarefa consiste em apresentar uma cena do filme Before Sunrise, dirigido por Richard Linklater, onde os personagens se apresentam andando e conversando sobre a vida e experiências que os fazem refletir. Antes de começar, pensamos em dar como sugestão ao professor a contextualização do filme até o momento da cena, assim despertando o interesse para os alunos assistirem o filme mais tarde. Também, é sugerido que o professor apresente algumas informações e curiosidades sobre o filme e a vida real do diretor, que produziu o filme baseado em uma experiência pessoal. Então, após assistirem a cena, são apresentadas duas perguntas que guiam a reflexão dos alunos, para eles discutirem com colegas, e, ao final, apresentarem seus pontos de vista com todos na sala.

Essa pré-tarefa, além de proporcionar a reflexão, também faz com os alunos utilizem habilidades receptivas e produtivas, uma vez que terão que apresentar o que surgiu a partir da reflexão. Os alunos se engajam e se familiarizam com questões mais pessoais e reflexivas, por meio de uma obra cinematográfica que, como já mencionado, produz engajamento e se assemelha com questões reais do cotidiano, projetando experiências do mundo real.

A terceira pré-tarefa (tabela 1) foi pensada para preparar os alunos a explorar o gênero cinematográfico filme-carta a partir do gênero textual carta, acreditando que o primeiro seria desconhecido para eles. Com isso, essa pré-tarefa traz aos alunos a reflexão de como é a estrutura de uma carta, deixando, então, a questão aberta para que respondam quais são as suas percepções. O objetivo dessa pré-tarefa é possibilitar aos estudantes explorar os seus próprios conhecimentos sobre o gênero carta. Em seguida, é apresentada uma carta escrita por Oscar Wilde, na qual os alunos precisam ler e escrever quatro características que fazem daquele texto uma carta, deixando-os livres de observar e pontuar de acordo com os seus próprios conhecimentos.

Chegamos na última pré-tarefa (tabela 1), a que apresenta o gênero filme-carta para os alunos. Primeiramente, é contextualizado como eram os meios de comunicação antigamente, enfatizando que a carta era o meio mais comum de enviar informações para as outras pessoas e que hoje temos formas mais rápidas, que, no entanto, se assemelham ao gênero carta, como as redes sociais, por exemplo. Portanto, comenta-se sobre o gênero filme-carta com os alunos, enfatizando que, mesmo relacionada à carta, a mensagem não está somente no que é dito, mas também nas imagens que são escolhidas e passadas para o interlocutor. Enfim, os alunos são apresentados a três filmes-carta, em que eles precisarão assistir em inglês, engajando habilidades de compreensão, para então responder a duas perguntas. Na primeira questão os estudantes precisam pontuar o que se pode dizer sobre as mensagens e a ligação com as imagens. Na segunda é indicado que os alunos pontuem quais passos seriam precisos caso precisassem gravar o próprio filme-carta. Assim, se encerrando as pré-tarefas, para que os alunos então consigam realizar a tarefa principal.

A preparação do aluno para trabalhar com um gênero mais complexo é uma preocupação vista em outros ciclos de tarefas. No seu ciclo de tarefas, Afonso (2014), por exemplo, utiliza uma pré-tarefa para apresentar o gênero narrativa, utilizado também com o objetivo de familiarizar os alunos com a tarefa principal que era ler um capítulo de um livro. Specht e Mendes (2021), cuja tarefa principal era a contação da história dos Três Porquinhos em língua inglesa para alunos do ensino fundamental, também utilizaram pré-tarefas que levaram em conta o gênero fábula, por exemplo.

Ao final, depois de os alunos completarem a tarefa principal, é realizada a última tarefa, que encerra o ciclo, ou seja, a pós-tarefa. Nesta etapa, os estudantes precisam assistir às próprias produções: é o momento em que se engajarão em habilidades de compreensão auditiva, podendo surgir dessa experiência, algumas dúvidas ou apontamentos sobre questões linguísticas a partir dos filmes-cartas. Assim se encerra o ciclo de tarefas por meio do cinema.

Fase piloto

Como descrito na metodologia, enviamos o ciclo de tarefas e algumas perguntas avaliativas para os seis participantes da pesquisa. Eles deixaram suas percepções guiadas por cinco questões sobre o ciclo de tarefas. Na sequência, tabulamos os dados para analisar as respostas dos participantes. Para fins organizacionais, vamos apresentar os resultados e a discussão de cada pergunta separadamente.

Na primeira questão, buscamos compreender de modo mais amplo, quais são as impressões dos participantes sobre o ciclo de tarefas como um todo. A maioria das respostas foi semelhante. Os participantes de 1 a 5 avaliaram as tarefas como interessantes para o público alvo, por conta do uso do cinema e da possibilidade de os alunos produzirem o próprio filme, além do engajamento que pode levar a conhecer mais sobre o tema. É ressaltado que o uso de cinema em sala de aula pode chamar a atenção dos alunos por ser algo possivelmente atrativo e também por que a arte é explorada de maneira pedagógica. A resposta do participante 6 destoou dos demais, pois a sua resposta apresentava um tom mais técnico. Ele descreveu as atividades como bem estruturadas e contextualizadas, como podemos ver:

As atividades foram muito bem estruturadas, dando ao aluno a oportunidade de construir seu conhecimento de forma gradativa e segura. Além disso, as atividades constroem um sentido para o tema, em outras palavras, o aluno poderá ver um significado para o trabalho que estará realizando. Isso é algo que faz muita diferença no processo de ensino-aprendizagem, pois o aluno precisa que as atividades façam sentido para ele. Por fim, a contextualização das atividades também é algo importante, já que desta forma, elas ficam mais próximas à realidade do aluno (Participante 6, 2021, grifo nosso).

O participante relata a capacidade de o ciclo de tarefas dar um significado para o uso do tema e da ferramenta cinema. Ele nota que o ciclo explora a utilização do cinema para contextualizar o mundo real e momentos do dia a dia do aluno, dando significado a essas tarefas e ao uso dessa ferramenta. Tal percepção vai ao encontro do conceito de material autêntico (JOY, 2011) e de tarefa (ELLIS, 2003; 2006), que mencionamos acima, e do uso do cinema em sala de aula (ARAUJO; VOSS, 2009). A escolha do cinema, então, utilizado a partir de uma perspectiva metodológica de tarefa faz com que o assunto/material não seja trabalhado de forma avulsa e sem sentido. Vale ressaltar que o participante em questão possui experiência com o ensino de língua inglesa em escolas de idiomas, o que pode tê-lo levado a uma resposta mais técnica.

Com a segunda pergunta, buscamos saber se, de acordo com a percepção dos participantes, as atividades são apropriadas para estudantes de nível intermediário de uma escola de idiomas, nosso público alvo para a criação da tarefa. Nesta questão não houve discordância, pois as atividades foram julgadas por todos como apropriadas, porém, alguns apontamentos foram feitos por dois participantes. O primeiro, participante 2, comenta:

Acredito que um aluno de nível intermediário possa ler os textos e resolver as questões, pois nesse nível o reading está mais desenvolvido. No entanto, acredito que eles poderão necessitar de um auxílio em relação a palavras desconhecidas, e também para a interpretação dos diálogos e textos presentes nos vídeos (Participante 2, 2021).

Prosseguindo para o participante 5, podemos observar que também há essa preocupação com a complexidade das tarefas, aqui, mais especificamente, com alguns enunciados ou questões, como podemos ver:

Acredito que sejam apropriadas sim. Os textos e os enunciados das atividades são um pouco mais complexos, no entanto as questões têm um nível mais intermediário. Algumas exigem um pouco mais de conhecimento da língua, por exemplo a primeira pergunta da atividade 2 em que os alunos devem responder de maneira mais ampla como eles veem a vida, mas tendo um nível intermediário da língua acredito que seja possível elaborar uma resposta até mesmo para esse estilo de perguntas em que o aluno não tem como buscar a resposta em outros materiais (Participante 5, 2021).

Com isso, observamos que há essa preocupação quanto à complexidade dos enunciados, ou da questão apontada (primeira da atividade 2), em que se busca uma visão mais ampla e pessoal, sem consulta de algum recurso. É interessante observar que realmente é preciso se atentar a complexidade (NUEVO, 2006) e as possíveis maneiras de ajudar o aluno, facilitando a aprendizagem. As pré-tarefas são pensadas para tal, tendo o objetivo de preparar o aluno para a tarefa principal. Portanto, se as tarefas estiverem muito complexas, talvez não façam o seu papel. Porém, nesse caso, somente uma questão foi apontada com uma possível carga a mais de complexidade, dado a reflexão que os alunos precisam fazer e comentar. Por outro lado, no nível intermediário, é possível que os alunos consigam refletir e discutir seus apontamentos em sala, e se caso não seja possível, adaptações seriam feitas para facilitar.

Cabe ressaltar o papel do professor no momento de orquestrar a implementação do ciclo de tarefas, sendo uma peça fundamental para solucionar questões e dificuldades que surjam. De acordo com Van de Branden (2016), o professor traz o EBTA à vida, a partir da interação com os alunos e da organização das atividades. As tarefas avaliadas pelos participantes são planos de trabalho, portanto, os apontamentos trazidos pelos participantes seriam de fácil resolução na interação professor/aluno em sala de aula.

Na terceira questão, os participantes precisavam pontuar os pontos positivos que encontraram nas atividades. Os participantes 1 e 2 ressaltam que as tarefas são positivas pelo engajamento que geram nos alunos e pelo tema atrativo, que, consequentemente, levam ao interesse ao ensino de língua. O participante 3 destaca que as tarefas são bem construídas e geram muita interação na sala de aula, assim como também, pontua o participante 6, que ressalta a contextualização e como as tarefas são criativas, fazendo com que os alunos se engajem e criem um significado às tarefas. O participante 4 comenta como positivo a possibilidade de o aluno entrar em contato com algo que gera interesse (o cinema), além de explorar as 4 habilidades linguísticas. Por fim, o participante 5 comenta como ponto positivo o fato de as atividades serem dinâmicas e com bastante material extra, com vídeos e textos que têm potencial para estimular a atenção dos alunos.

Aqui percebemos que é possível explorar o potencial da utilização de ferramentas artísticas para uso pedagógico, construindo, um material amarrado e contextualizado. Os alunos têm a possibilidade de aprender a língua inglesa a partir de atividades que exploram o uso da língua. Por isso, atividades que tragam a realidade desses alunos de maneira atrativa e convidativa faz com que se sintam à vontade e animados com a ideia. Os participantes descreveram o uso como interessante considerando a popularidade que o cinema tem. Portanto, usá-lo em sala de aula convida os alunos a aproveitar um tema que possivelmente gostam e se interessam, com contexto e pensado para o ensino-aprendizado. É isso que faz com que seja de valor para o uso no ciclo de tarefas, pois a linguagem cinematográfica tem esse poder de se utilizar da simulação da realidade, interpretando o cotidiano (ARAUJO; VOSS, 2009).

Na quarta questão, perguntamos sobre os pontos negativos presentes no ciclo de tarefas. Apesar de tentarmos criar um ambiente confortável para que pudessem criticar as tarefas, a maioria não apontou nenhum ponto negativo. Por outro lado, encontramos algumas críticas na questão 5. O participante 3 ressalta ser um ponto negativo o fato de o ciclo ser muito longo para um horário de aula, deixando, então, uma sugestão de usar como uma extensão, se utilizando de mais aulas para dar sequência às tarefas. Ao criar o ciclo de tarefa não idealizamos que ele fosse trabalhado em uma única aula, mas em várias aulas, portanto, acreditamos que tenha sido uma falha nossa ao não disponibilizar essa informação aos participantes. O professor ao criar e/ou implementar um ciclo de tarefas tem em mente a quantidade de aulas que podem ser usadas de acordo com o seu planejamento. Como o objetivo da nossa pesquisa não foi implementar o ciclo em uma sala de aula real, não tivemos essa preocupação.

Ainda como ponto negativo, o participante 5 pontua que os vídeos de apoio não possuem legendas em inglês, por isso, talvez seja difícil para os alunos com mais dificuldade na compreensão auditiva. Portanto, de acordo com ele, seria interessante acrescentar a legenda. Finalmente, o participante 6 também ressalta a heterogeneidade no nível de proficiência dos alunos em uma sala de aula. Segundo ele, nem todos os alunos apresentam o mesmo nível de língua, portanto, o ciclo talvez precise de alteração para suprir as necessidades individuais. Tal apontamento nos remete à necessidade de análise de necessidade (LONG, 2015) para ajudar o professor na criação do ciclo de tarefas. Entendemos, portanto, que, caso esse ciclo seja implementado futuramente, ele provavelmente precisará de alterações.

Por fim, na pergunta número 5, o participante 1 questiona se os alunos teriam alguma atividade de preparação de roteiro, para que assim eles tenham conhecimento no momento de produzir o próprio filme. Também comenta não entender muito bem a atividade 3 e questiona se o professor ajudará os alunos. Dúvidas sobre a atividade 3 também foi um ponto importante para a sugestão do participante 2, que alega precisar de mais exemplos de cartas e explicações mais explícitas para que os alunos consigam compreender melhor a estrutura da carta, antes de partir para a questão. Outra sugestão do participante 2 é criar um glossário para as palavras mais difíceis e que talvez os alunos não conheçam. Também é comentado que seria interessante que o professor realizasse as atividades com a seguinte dinâmica, primeiro passar o vídeo sem legenda e depois passar com a legenda em inglês.

O participante 3 sugere que seja diminuída a quantidade de filmagens. Em vez de cada aluno produzir um filme, seria feita uma votação escolhendo o melhor roteiro (carta) para ser filmado, assim, fazendo trabalho em grupo para a produção de um único filme-carta. Facilitaria, então, com essa dinâmica e haveria também bastante interação entre os alunos no momento de produção. O participante 5 também pontua a dúvida com a atividade 3 e sugere uma alteração para melhorar o enunciado, dando mais exemplos de cartas, para que os alunos compreendam melhor e também consigam ter acesso depois, caso queiram ler e observar novamente. Também comenta sobre a segunda questão da atividade 4, pede que tenha mais detalhes do que se espera dos alunos. Achou que ficou ampla demais para deixar tanto impressões pessoais quanto técnicas de como é produzir um filme.

É importante ressaltar aqui que a escolha da utilização do gênero filme-carta nesta pesquisa vai além da capacidade de explorar a língua a partir do seu significado pragmático, mas também pela possibilidade de não precisar se aprofundar de maneira técnica nos quesitos cinematográficos para o seu uso, podendo, então, com esta escolha, dar espaço para focar somente no significado, no que o uso do filme-carta pode contribuir enquanto gênero utilizado no ensino de língua por meio da abordagem de tarefas. Então, por essa maneira que não há enfoque concreto em técnicas do cinema para uma produção de um curta-metragem, mas sim, uma apresentação do gênero, para que assim os alunos conheçam e tenham noção do como produzir um, utilizando reflexões e preparações prévias feitas pelas pré-tarefas. Também, pensando no que o participante 2 destacou em relação a atividade 3, é interessante pensar que essa pré-tarefa tem o intuito de fazer com que os alunos consigam trazer os próprios conhecimentos sobre o tema, tendo o papel de protagonistas, contribuindo com os próprios conhecimentos linguístico e do gênero apresentado. Lembrando que, pensando em uma turma idealizada, essa pré-tarefa seria possível, mas caso aplicado em uma turma real, seria preciso observar quais as demandas e até que ponto podem ser explorados os próprios conhecimentos dos alunos. Se necessário, seria possível apresentar (ou relembrar) de maneira mais direta o gênero textual carta.

Considerações Finais

Nesta pesquisa buscamos construir e observar se seria possível utilizar o cinema de forma pedagógica no ensino de língua por meio da abordagem de tarefas. Criamos um ciclo e buscamos pilotar de forma a receber respostas sobre a sua aplicabilidade. Na criação, o ciclo foi moldado pensando nas características exigidas pela abordagem de tarefas (ELLIS, 2003). Percebemos que o cinema é uma ferramenta capaz de suprir as exigências que a abordagem de tarefas requer, pela sua capacidade de projetar situações, contextos reais de vida e, consequentemente, do uso da língua alvo. Por esse motivo, conseguimos conectar essa ferramenta com o ensino de línguas por meio da abordagem de tarefas, podendo, então, elaborar um ciclo.

Dentro do cinema, encontramos um gênero cinematográfico que foi escolhido para ser utilizado no nosso ciclo, que é o filme-carta. Esse gênero nos permite trazer a realização de gravações dentro da sala de aula, sem necessitar de grandes equipamentos, portanto, é possível produzir um filme-carta com poucos recursos (MIGLIORIN, 2014, p. 9). Dessa maneira, conseguimos conciliar o uso do cinema em sala com a abordagem de tarefas, explorando um gênero cinematográfico que não atrapalha os alunos nem o professor pela falta de equipamentos tecnológicos. Assim, é possível focar na utilização da língua, utilizando, então, esse gênero do cinema que abre as portas para o aluno refletir e compartilhar suas experiências de vida por meio de uma carta, ou melhor, um filme-carta.

Após o desenvolvimento do ciclo, passamos para a fase de pilotagem por meio das percepções e impressões de alunos de Letras Inglês com experiência em ensino de língua inglesa, para observar e analisar se o ciclo seria adequado. Houve comentários e sugestões de adaptações, seja pensando em casos de turmas que necessitem de mais auxílio ou apenas uma sugestão didática para facilitar o desempenho dos alunos em aula. No geral, o ciclo foi descrito como apropriado para uma turma de nível intermediário de ensino de línguas. Portanto, ao que se propõe, e a partir das definições de Ellis (2003) e Skehan (1996; 1998), o ciclo é adequado para o ensino de língua por meio da abordagem de tarefas.

Nesta pesquisa não conseguimos refletir sobre a aplicação do ciclo de tarefas em uma turma real, devido à restrição de tempo e à pandemia. Porém, para pesquisas futuras seria interessante explorar a recepção de aprendizes de língua inglesa com a aplicação de um ciclo de tarefas utilizando cinema de forma pedagógica. Além do mais, o desenvolvimento de ciclos de tarefas que possam ser trabalhados em sala de aula, abre horizontes para refletir a respeito das ferramentas usadas para ensinar língua estrangeira, contribuindo para a área do ensino/aprendizagem (AFONSO, 2016, p. 06).

Gabriel Machado Antunes - Graduando do curso de Licenciatura em Letras-Inglês da Universidade Estadual do Centro-Oeste, UNICENTRO, campus de Irati, Paraná. E-mail: gabrielradke4@gmail.com

André Luís Specht - Professor do Departamento de Letras da Universidade Estadual do Centro-Oeste, UNICENTRO, campus de Irati, Paraná. Doutor em Estudos da Linguagem pelo Programa de Pós-Graduação em Inglês da Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC. E-mail: andreluisspecht@gmail.com.

Notas

  1. O termo significado é usado neste trabalho em oposição ao termo forma. Significado, portanto, é o uso comunicativo da língua.
  2. Vale ressaltar que o desenvolvimento de um ciclo de tarefas se dá a partir das necessidades de um contexto e de um grupo de alunos, geralmente antecipado por um questionário de necessidades (LONG, 2015). No nosso caso, buscamos investigar a criação de um ciclo de tarefas utilizando o cinema. Para isso, pensamos em um grupo de alunos ideal e refletimos sobre as características gerais que esse grupo poderia apresentar.
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Referências

  1. AFONSO, Joseline. What role do tasks play in an EFL environment? Unfolding 9th grade learners’ perception on the implementation of a cycle of tasks in the first chapter of ‘Harry Potter and The Sorcerer’s Stone’. Dissertação (Mestrado) - Programa de Pós Graduação em Inglês, UFSC. Florianópolis, 2016. Disponível em: https://repositorio.ufsc.br/xmlui/handle/123456789/169076. Acesso em 22 dez. 2021.
  2. ARAUJO, Alda Regina de; VOSS, Rita de Cássia Ribeiro. Cinema em sala de aula: identificação e projeção no ensino/aprendizagem da Língua Inglesa. Conexão – Comunicação e Cultura, UCS, Caxias do Sul, v. 8, n. 15, 2009. Disponível em: http://www.ucs.br/etc/revistas/index.php/conexao/article/view/117. Acesso em 21 dez. 2021.
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Recebido em: 21-set-2021
Aceito em: 21-dez-2021

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